Guilherme Mossini Mendel

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IGUARIAS

O passado tem gosto de docinho de coco.
O presente tem gosto de noz.
O futuro tem gosto de bem-casados.

A vida tem cor de morango
E cheira a perfume de baunilha –
Café e chocolate amargos,
Atiçando a doçura dos prazeres.

(Guilherme Mossini Mendel)

⁠O JORNALEIRO E O JORNALISTA

Há uma diferença sutil
Entre o jornaleiro e o jornalista:
Os dois distribuem informações,
Mas só o segundo tem voz
Para dizer alguma coisa.

(Guilherme Mossini Mendel)

⁠POEMINHA LÓGICO

Quem fala com a consciência
Conversa com Deus.
Logo, quem tem consciência
Tem Deus consigo.
E quem não a tem
Perde-se nos confins
Do Inferno existencial.

(Guilherme Mossini Mendel)

⁠AINDA SOU UMA CRIANÇA

Ainda sou uma criança com medo,
Escondida em um corpo de adulto.
O tempo passou por mim
E eu não percebi.
Não me tornei um jovem,
Nem me tornei adulto.
Permaneci o mesmo –
Invariável presença do ser.

Ainda sou uma criança com medo,
Essencialmente eu.

(Guilherme Mossini Mendel)

⁠PERSONAGEM COMPLEXO

O Eu
É um personagem complexo,
Definitivamente mascarado,
Que entra em cena
Quando se está dormindo.
Quando se está acordado,
Surge um desconhecido.

(Guilherme Mossini Mendel)

⁠LEVADO

O que leva uma pessoa
A achar que sabe?

O que leva uma pessoa
A achar que pode?

O que leva uma pessoa?
Eu não sei...

Mas todos são levados a...

(Guilherme Mossini Mendel)

⁠PAIXÃO

Semente da obsessão
Geradora de devaneios
Encantadora de imagens
Velha irmã da loucura

Manipuladora do caráter
Destruidora da razão
Indutora de vontades
Mescladora de sentidos

Por favor, apareça!
Mas que seja,
Que somente seja,
Quando for correspondida!

(Guilherme Mossini Mendel)

⁠POESIA DE GAVETA

Aprisionados aos papéis
Os poemas são fiéis
À sua fria condição
De esperar publicação

(Guilherme Mossini Mendel)

NINA

Meu cachorro não entende
As diferenças sociais
Meu cachorro não entende
As diferenças raciais

Meu cachorro não entende
Que eu estudo e que eu trabalho
Meu cachorro me atende
E nunca diz que eu só atrapalho

Meu cachorro me perdoa
Meu cachorro não caçoa
Meu cachorro nunca insulta
Meu cachorro nunca julga

Que ser humano é o meu cachorro!
Que ser profano é o meu povo!
Meu cachorro quer ser do bem
E o meu povo quer se dar bem

Meu cachorro não entende
Que o ser humano é negligente

Meu cachorro é quem me cura
Quando a vida aqui é dura

(Guilherme Mossini Mendel)

O QUE HÁ LÁ NO ALTO?

As nuvens brincam
De adivinhação
Quando as crianças
Olham para elas.

Assim, viram ovelhas,
Viram vacas,
Viram tudo aquilo
Que você imaginar.

Mas elas choram
Quando essas crianças
Não brincam com elas.
É o medo da solidão.

É o que acontece quando chove.

(Guilherme Mossini Mendel)

⁠CALÇADOS

O calçado mais apertado é a fome;
o mais desconfortável é a doença.
O calçado mais ordinário é a corrupção;
o mais desgastado é a demência.

O calçado mais cobiçado é a alegria;
o mais desejado é a harmonia.
O calçado mais criativo é a fantasia;
o mais inventivo é a sabedoria.

São calçados com os quais trilhamos
os caminhos que a vida nos dá.

(Guilherme Mossini Mendel)

⁠A ÚLTIMA GOTA

A última gota
faz o copo transbordar.
Mas não é a última gota
que faz o copo transbordar.
São todas as anteriores,
que fizeram a sua parte
para a saturação do copo.

Tudo o que é preciso
para gerar o caos
é uma minúscula gota,
aquela última gota
que faz transbordar o copo,
que faz esvaziar a vida,
que faz apagar a chama.

(Guilherme Mossini Mendel)

⁠PAPELÃO

Já era amanhã.
Logo pela manhã,
no asfalto molhado,
um papelão embolado
rolava com o vento.

Tão pouco desperto,
chegando mais perto,
vi que o tal papelão
não passava de um cão –
que triste lamento!

A criatura inocente,
um bom ser vivente,
pra sociedade doente,
é só um indigente
como lixo descartado –
mas que papelão!

(Guilherme Mossini Mendel)