Gilderson Santos
Música, como bela arte, flutua.
Flutua como a lente de uma singela luneta,
que aspira o horizonte.
Música, traço entre hostis rabiscos,
cuidadosos ou ásperos,
faz a paisagem seca e amarga ganhar cor.
Flutuar é preciso:
sentir a brisa que move.
Assim como a luneta, que ao horizonte nos põe,
é preciso um guia,
que ajuste o foco e a direção,
sem deixar que se embaralhe
o muito que guardamos.
A música é poderosa,
basta senti-la e, com a alma, segurá-la.
Pois, assim, o mundo pode ser melhor.
Defina-a:
Como seria a música para você?
Pensamento, como canário, salta no céu azulado,
canta entre penas caídas que conectam
e penetram a memória de caminhos, ora turvos, ora triviais,
e, ainda assim, se põe a resguardar.
Oh, doce caminho que se transforma
diante de inesperados obstáculos,
paisagem rústica, elementar, tortuosa e inexplicável.
Assim flui o grande vento do destino,
e o canário, sem recuar, encontra na força
o impulso para avançar.
Como o pensamento, é preciso encarar.
Não é vergonhoso mudar,
exceto parar.
Assim é o pensamento humano:
sempre em transformação,
mas nunca trancafiado,
pois sufocá-lo seria punir sua essência,
privando-o das aventuras e do singular céu azulado.
Livros que transformam, livros que se abrem,
Livros que anseiam, livros que se fecham.
Outrora, a vida que se fazia simples e costumeira,
Sem margem à dúvida, moldava-se heróis;
Vilões eram apenas vilões. Mas o arco da história tornou-se trivial,
E novos papéis surgiram da velha história contada,
Passamos a entender que o simples, às vezes, era equivocado,
E que o vilão, na verdade, era vítima de um sistema opressor,
Trancafiado na cela do tempo, uma parte omitida,
Sequer mencionada, pois exibi-la traria ao conto um tom cruel.
O bom, ao tornar-se errado, perde o traço do amável.
Como antes se dizia: livros se fecham para que novos e complexos livros se abram,
Mas continuam a história, rasgando em tiras a omissão dos detalhes belos e dourados.
E para isso, é preciso começar pelo rosto amável que a história massacrou,
Forjando, assim, o vilão intrínseco e indescritível,
Que, desde o início, ninguém resguardou,
Outrossim, apenas condenou.