Quando pretender ajuizar alguém
Coloque-se em frente dum espelho
E verá que o vidro é frágil
Os arquétipos são manequins
Que não são capazes
De se vestir a si próprios
Dispersando a voz nos versos
Construímos bocados de vento
E algumas sementes aladas
Conjugar os verbos em todos os tempos
E como fazer tonalidades
Com lápis de cor
As máquinas do futuro
Substituirão os homens
Mas não os poetas
A vida é como um puzzle
Feita de fragmentos
Nem sempre ajustáveis
As flores perfumadas
Nunca devolvem à terra
O cheiro que esta lhes deu
As catedrais dos poetas
Não têm sacerdotes
-Apenas empregados de café
A memória ficará
Como um livro manuscrito
Que não tem espaço no chão
Antes que as mãos fiquem trémulas
Grava as memórias
Na pedra dura da tua terra
A lua esconde-se de mim
Por detrás do arvoredo
Os amores furtivos são assim
Para ser profeta
É necessário iludir os deuses
E namorar as musas
A eternidade é uma ave
Migrando no horizonte
Até se perder de vista
Na ausência de versos
O amor é apenas um jogo
De gestos sem asas
A bitola para todas a s coisas
São dois olhos estereoscópicos
E um coração tridimensional
Mais que o som das palavras
O brilho dos olhos
Revelará o código do pensamento
Trapos de roupa velha
Serão vida nova
Do espantalho na seara do campo
Como paradoxo da vida
A existência começa nos jogos
De caminhar gatinhando
Os olhos são como um jogo
De roleta viciada
Comandada pelo coração
Mirando o espelho estanhado
Sinto que é apenas vidro
Tentando guardar a minha sombra
Até que os gritos
Se transformem em ecos
A voz é errante e volátil
Ainda que bravio
Segue sempre o rio
Ele te levará à quietude do delta
Apenas as boas sementes
Recordarão as raízes
E o dia em que o vento as levou
Montando cavalos em pêlo
Aprendi a fraqueza da carne
E a dureza do chão
Alterno o lenho e o sangue
Depois construo uma jangada
E perco-me nos arcos do mar