Emilly Raquel P. Fernandea
ORTOTANÁSIA
Se eu disser pra você que hoje eu acordei triste, que foi dificil sair da cama, mesmo sabendo que o sol estava se exibindo lá fora e o céu convidava para a farra de viver, mesmo sabendo que havia muitas providências a tomar, acordei triste e tive preguiça de cumprir os rituais que faço sem nem prestar atenção no que estou sentindo, como tomar banho, colocar uma roupa, ir pro computador, sair pra compras e reuniões, trabalhar... se eu disser que hoje não foi um dia como os outros, que não encontrei energia nem pra sentir culpa pela minha letargia, que levantei hoje devagar e tarde e que não tive vontade de nada, você vai reagir como?
Você vai dizer "te anima" e me recomendar um antidepressivo ou só vai dizer que tem gente vivendo coisas muito mais graves do que eu (mesmo desconhecendo a razão da minha tristeza), vai dizer pra eu colocar uma roupa leve, ouvir uma musica revigorante e voltar a ser aquela que sempre fui, velha de guerra.
Você vai fazer isso porque gosta de mim, mas também porque é mais um que não tolera tristeza: nem a minha, nem a sua, nem a de ninguém. Tristeza é considerada uma anomalia do humor, uma doença contagiosa, que é melhor eliminar desde o primeiro sintoma. Não sorriu hoje? Medicamento. Sentiu uma vontade de chorar à toa? Gravíssimo, telefone já para seu psiquiatra.
A verdade é que eu não acordei triste, nem mesmo com uma suave melancolia, pois sou eu e isso é normal. Por que ficar triste é comum, ter crises de ansiedade pode acontecer com alguém como eu, isso é um sentimento tão legítimo quanto a alegria, é um registro de nossa sensibilidade, emoções, que ora gargalha em grupo, ora busca o silencio e a solidão. Nem sempre estar triste é estar deprimido, outras vezes estar triste é viver numa profunda depressão. A depressão não é um estado passivo, letárgico. É um estado ativo de dor lancinante da ponta do cabelo aos dedos dos pés.