Nos gestos da mão
baila a brasa do cigarro:
pisca o pirilampo.
Sobe a piracema -
ano que vem outros peixes
nadarão de novo.
Tempo de uiaúa:
o rio onde os peixes nascem
é o mesmo que os mata.
Céu de primavera.
Nas açucenas floridas
dura mais o orvalho.
Partitura alegre:
cai a chuva sobre o charco
no ritmo dos sapos.
Na caixa postal
a mão sente a queimadura:
taturana presa.
Ah, a sensualidade...
palmeiras se abraçando
cúmplices do vento.
Teus olhos formam
das ázimas lágrimas
rios que retornam ao mar
Abre o camponês
sulcos de arado na terra:
no seu rosto rugas.
Hora do recreio:
periquitos tagarelas
brigam pelas mangas.
Ao sol do verão
o sorvete se derrete.
Namoro desfeito.
Abro o armário e vejo
nos sapatos meus caminhos.
Qual virá no séquito?
Açougue nas águas:
piranhas esquartejam o boi
no meio do rio.
Folhas do ciclame
ao vento pra lá e pra cá -
um coração pulsa.
Gaiola se abrindo
e o haijin livre de amarras:
sabiá cantando.
Com jeito voyeur
da soleira da janela
um pombo me espia.
Morcego em surdina
morde e sopra o velho gato.
Não contava o pulo...
Na casca amarela
se esconde em vão a goiaba:
tantos bem-te-vis...
No ocaso do outono
só o carrapicho gruda
na velha calça...
Maria-fecha-a-porta
ao toque do meu dedo:
ah plantinha tímida...
Entre o capim seco
uma surpresa rajada:
ovos de codorna.
A chuva já vem?
Não vem. É o marcador
cantando a quadrilha.
Jogando a tarrafa
caboclo desfaz a lua.
Pesca estrelas de escama.
Girassol na tarde
se curva em reverência:
o sol se vai.
Cercada de verde
ilha na hera do muro:
uma orquídea branca.