André Anacoreta
Os problemas são como ondas - vão e vêm, vêm e vão. Há aqueles que surfam sobre eles; outros que os enfrentam até que chegue o mar aberto. E há aqueles que preferem ficar com a água pelos joelhos sentindo a terra por baixo dos pés.
Pensamento é esse intermediador, que põe na baila o consciente e o inconsciente, fazendo-os convergir numa mesma direção.
O que se faz por prazer se faz também por amor. O dever nunca habitará o império da amizade. Sua moeda de troca é a gentileza.
A infância nos abandona para que corramos atrás dela pedindo pelo amor de Deus que ela volte. Mas ela não volta, é amante que só dá uma chance e de repente parte na calada da noite. Quando acordamos já é tarde demais.
Se o homem fosse um animal pensante, como creem os defensores dos animais, não seria tão primitivo a ponto de ignorar que é um animal pensante.
A vida, a todo instante, joga pedras no caminho para que tropecemos. Se por ventura construirmos uma montanha com estas pedras, então seremos resistentes como as pedras e grandes como as montanhas.
A felicidade é uma ilha na qual queremos atracar. Então construímos nossos barcos no afã de poder pisar as areias mais desejadas. Mas quando estamos por chegar mais perto, a ilha desaparece e o barco naufraga. É quando pensamos que teria sido melhor ficar em terra contemplando o horizonte intocável, na alegria angustiante de imaginar o inconcebível.
Toda mudança política que não seja uma reforma total do sistema político, contribui para que a política continue sendo impotente para operar mudanças reais na sociedade.
O amor é cego diante dos defeitos, porque está ocupado demais olhando as qualidades. E, por ser cego, faz com que os amantes se especializem na arte do tato. É no apagar das luzes, no fechar das pálpebras que os amantes se veem realmente; os corpos convertidos num núcleo de prazer, onde todos os sentidos participam de um banquete às escuras. Se abrem os olhos, à procura um do outro, abrem também a porta para um instante de eternidade
Vivemos num tempo em que borboletas voam em bibliotecas; os livros ficam às moscas nos casulos das instituições. Quando o livro perde seu caráter mágico e passa a ser apenas um aglomerado de folhas e palavras, o mundo perde a dimensão do possível e se afoga na impossibilidade do real.
As coisas belas suspendem quaisquer porquês. Solicitam tão somente a alma, para que contemple, simplesmente contemple. Já o espirito se ilumina diante de uma ideia simples, embora genial; porque o espanto do gênio que se debruça sobre o parapeito do desconhecido, nasce da simplicidade em enxergar o mundo como se se acabasse de ganhar os olhos. O gênio então — no mais alto de sua simplicidade — clama: abram os olhos!
Todos os dias nas igrejas, nos programas evangélicos de TV os crentes rogam para que Deus cure os enfermos, alimente os esfomeados... Parece-me que Deus gosta mesmo de contrariar as expectativas. Os pastores fingem acreditar, e Deus finge existir.
É a normalidade que cria os atores do cotidiano: o marido atencioso, o filho obediente, o bom funcionário, a mulher ideal, o cidadão exemplar. Por isso a normalidade censura o louco, porque o louco desconhece o artifício de interpretar papéis; o louco é o próprio teatro.
Leia a Bíblia em voz alta ao lado de um papagaio, dando-lhe petiscos ao final de cada capítulo, e terminada a leitura descobrirá que criou um pastor evangélico.