Amanda Seguezzi
“E mais uma vez, mais um maldito final de semana, eu comprovo a teoria de que você não consegue viver sem mim. Talvez o álcool no seu sangue tente nunca me matar dentro de você. E isso é bom. Talvez, só talvez, eu nunca tenha morrido aí por dentro, quem sabe eu estava adormecida este tempo todo apenas esperando um momento vacilante de guarda baixa. Ou, eu seja tão sua, de uma forma tão especial que você só lembre de mim em momentos especiais. Contudo, querido, preste atenção, a coisa mais especial que aconteceu na tua vida, você jogou de um penhasco e parece não se importar com os hematomas. Eu explodi por dentro, amor, eu explodi todos os dias aos quais eu sabia que estavas respirando sem a minha ajuda e conseguindo se reconstruir sem mim. Ai vem a minha sorte por ser o primeiro número da tua agenda, porém não tua primeira prioridade, vem o meu pensamento de sempre atender aos seus chamados para que, ao menos, eu possa te salvar do que você se transformou. Ou talvez que tente me salvar do que eu me tornei.”
Você me chamou e eu te devolvi um “hoje não dá, desculpa”.
o coração explodiu, mas a alma ficou em paz
AMANDA SEGUEZZI
“A solidão ficou sem par por minha causa a partir do momento que decidi desistir de você. Eu tinha pena dela. Porque, mesmo me abandonando, ela assombraria as paredes do teu coração pra sempre, meu bem. E não há nada pior do que gritar até os pulmões queimarem e perceber que o amor tapou os ouvidos para você."
"Neste último mês eu pensei em tantas formas que te encontrar casualmente e perguntar como vai a sua vida de um modo aleatório e desinteressado. Pensei na possibilidade de você estar feliz e isso me matou. Pensei em como eu sou descartável pra você e tentei me refazer. Pensei na expectativa de você sentir um pouquinho de saudade das sardinhas do meu rosto e fiquei feliz. Eu gostava de me iludir com essas coisas. Tinha a esperança de que, se tocasse nossa música no rádio, você pegasse o telefone pensando em me ligar.
Possui teu cheiro o cheiro da ilusão.
Você é como uma daquelas valsas tristes, poesia que não rima no final. É um vazio tão inexplicável este teu, dá vontade de saltar nele só para te curar. Talvez você não queira a cura, por que não? Eu te imaginava numa daquelas danças a dois que alguém cisma em dançar sozinho, com um cigarro na boca e um copo entre as mãos. E no meio da euforia de ser um par tão ímpar, senti o teu vermelho de dentro petrificando. Senti o teu vazio gritando por mais vazio. Senti que a nossa poesia jamais rimaria. Eu estava apaixonada por um homem morto ao qual a solidão tratou ela própria de querer enterrar.
Penso na vantagem ser o primeiro nome da tua lista telefônica. Penso na possibilidade de você estar à toa, abri-la e se deparar com o meu nome. Talvez você pense num "Será?”ou "Mas porque não?“. Talvez você tenha o meu número por educação, por casos emergenciais. Talvez, talvez, talvez. Talvez eu tenha te apagado da minha lista simplesmente porque, mesmo não tendo a vantagem de estar no topo dos meus contatos, ainda permanece na escala de prioridades da minha vida, e se eu não fosse tão estúpida e nem um pouco burra, não tentaria excluir o que eu já decorei. Isso vale tanto para você quanto para o seu número. Acho que te ligaria só para saber como foi o seu dia.
Eu te queria pra mim feito uma conquista, um troféu exposto numa estante empoeirada. Queria-te para obter novos inimigos, novas pessoas me invejando. Tanto esforço por um pouco de reconhecimento, eu também queria. Porque eu devo ter batido o recorde mundial de alguém que te quer nesse mundo. Eu queria mostrar a todos que vale a pena esperar por você. Queria te guardar pra sempre num porta-retrato, te levar no bolso e fazer disso algo suficiente. Queria esfregar na cara de quem não te aprecia o quanto te conhecer me mudou. Eu queria mostrar ao mundo que você é bem mais do que aparenta. Eu muito queria mostrar as tuas belas qualidades ao universo, tirando aquelas que fui inventando ao longo dos anos. Eu queria te provar que você é sem graça sem o meu brilho, mas isso todo mundo já sabe. Menos você.
Então, tigre, faça aquela tatuagem que você sempre quis e eu sempre odiei, vá morar na praia, já que eu nunca gostei de verão. Faça tudo que me impeça de gostar de você, e talvez eu te esqueça. Talvez eu volte para os teus braços te desejando em dobro.
Vai entender."
“”Hoje eu contei as estrelas até cair no sono, e antes disso fiquei procurando uma aresta da escuridão ao qual nós despencamos. Sim, nós despencamos! Você caiu primeiro e ficou tão horrorizado com os tons de tristeza quanto eu. Você me conheceu no hiato das minhas pieguices e resolveu desfazer as malas, marcar o sofá sentando sempre no mesmo lugar. Eu entendia os teus dramas obscenos e deixava de lado os meus próprios dramas. Você tentou minimizar minha poesia e, por você, eu canalizei os meus excessos escrevendo-os apenas nas paredes sólidas do meu corpo. Implodia-me todos os dias para viver a tua realidade – tão triste. Perdia-me entre os teus atritos e achava que os meus beijos te despertariam para o meu mundo de fantasia. Tive então que dosar o meu amor justamente para não me afogar nele. Fui obrigada a conviver com um fantasma, ensiná-lo a ser menos solidão e mais nós. Já não tinham mais cores os olhos que tanto dançaram com os meus e, no lugar do brilho intenso, a imagem do caos ficou marcada em sua pupila como a última coisa que vira. Dói ter que transformar a primavera em inverno por tua causa. Doeu transformar-me num jornal velho que ninguém lê. Tive que refazer alguns versos, lidar com a presente ausência, juntamente com as tempestades, precisei fechar os meus olhos para me encontrar por dentro feito uma fugitiva. Precisei brincar de adulta enquanto virava um dos teus fantoches, ah meu amor, eu abri mão de tudo que tinha por um sentimento movediço que cisma em escapar pelos meus dedos. Eu era a louca das sílabas sem sentido que acreditava em horóscopo e você o menino dissolvido em ego e aceitação. Faças as tuas malas, meu amor, esgotou o estoque de piedade e covardia, porque você foi covarde, foi sim! Você não se adaptou ao meu conjunto de abismos e abreviações. Descobri então que assim como as estrelas mais brilhantes do céu, você já havia morrido há algum tempo também. É que eu preciso de um incêndio, sabe? Desordenar as frases, confundir os caminhos. Eu preciso mudar a cor do cabelo, tentar chegar à Lua apenas pisando em certezas inventadas. Porque, talvez, a realidade seja a minha parte insana que te quer por perto enquanto me mata de solidão e sede de ti. E no meu mundo de literatura barata você nunca morre. É por isso que me salva da própria loucura, amor. Insanidade. Foi o que sobrou de você em mim.”
Estranho eu ainda não ter me desfeito do nosso antigo apartamento, acho que são pelas paredes cor lilás. Estávamos juntos há quase dois anos, pode-se chamar isto de um encontro de almas. Às vezes as pessoas estão juntas há um mês e você sabe que é muito importante. E às vezes estão juntas há dois anos e você acha que vai acabar a qualquer momento. Nós éramos assim, sempre por um triz, apesar de que ao mesmo tempo nossa essência era quase igual.
Sempre fui uma menina que nunca gostou de andar de ônibus. Na verdade, tinha medo de não alcançar a campainha ou de embarcar para o rumo errado. Também nunca gostei de finais de livros ou finais de estações. Eu sempre esperei por um grande final das coisas, aliás, eu sempre esperei muito de tudo. Isso sempre acabava me decepcionando. Deve ser por isso que nunca aceitei o nosso fim. Não gostava de recomeço e novas histórias. Não gostava de pensar num futuro sem que você fizesse parte dele.
Eu vivia confinada nas paredes da minha própria liberdade.
Reposicionava os móveis, trocava as cores das cortinas tentando esquecer a tua paz apenas para ficar em paz. Contudo, mesmo te exorcizando aos pouquinhos, te sepultando a cada vez que cochilava no sofá ao invés de ir para a cama, ainda tinha a proeza de posicionar dois lugares à mesa e duas xícaras de café na cômoda. Tinha a esperança de que, se colocasse o copo sujo em cima da pia, você apareceria com aquela expressão doce-furiosa, assim como fazia antes. Que engano.
Eu não queria ser uma daquelas pessoas desesperadas que procura o amor a cada esquina da cidade. Você me transformou num ser analfabeto tanto de metáforas quanto de sentimentos. Você amaldiçoou meus verbos enquanto eu me sentia perdida em meio as tuas veias. Não importa quanto tempo passe, eu sempre vou te admirar com os olhos transbordados de passado e amargura sustentados pelas lacunas que você deixou ao sair da minha vida. E agora, quando um dia a mais se torna um dia a menos, eu penso na vontade de te doar os meus segundos, já que os pensamentos estão me lembrando que você também está morrendo a todo o momento. Mas onde estás agora?
Afinal, quanta maldade existe no mal? Quanto amor cabe no sofrer? Desmentir o amor é uma maldade, mas alimentá-lo em vão desafia o castigo que é sentir sem estar vivo na alma de outra pessoa.
Desculpa, mas eu acho que nunca vou superar você.
É lilás a cor do teu riso.
“Me dá só mais um motivozinho pra desistir. Anda! Me xinga, me expulsa do teu quarto, da tua vida, dos teus problemas. Bate com a porta no meu rosto, queima as nossas lembranças, o meu telefone. Esquece o meu endereço que eu prometo esquecer o teu gosto. Muda de perfume e faz outra garota decorar a essência dele e levá-la aos sonhos também. Vamos! Troca de cidade, de nome, de arcada dentária. Some! Aprende outra língua, aprende a dizer “Eu te amo” em francês e ilude mais algumas outras. Por favor! Eu que nunca chorava por nada agora te transbordo de dentro de mim todas as noites. Estou cansada! Desta obsessão pela tua respiração e por esse sorriso que tirou a graça de todos os outros. Nasce de novo, se joga da janela do oitavo andar e sinta a dor de não ter notícias tuas. Anda, me promete! Diz que nunca mais vai ligar, que vai arranjar amigos novos, que vai pintar a íris com giz de cera preto. Pega os meus ombros, balance com todas as tuas forças. Diga-me que tudo foi um sonho, que no mundo real nós nem nos conhecemos. Me manda uma carta pedindo desculpa pelos mais de cem textos iguais ou pelas horas de insônia e até pelos rostos tão borrados nas ruas. Porque eu te procuro em todos os corpos desde o dia que te vi pela última vez. Vamos! Diga que nunca foi ao meu apartamento e que sequer sabe o nome da minha rua. Fala pra mim que você nunca deu “bom dia” pro porteiro ou pegou os jornais na porta. Murmura que não tem a menor noção de onde eu escondo a chave reserva, que não sabe os tons das cortinas e dos meu olhos. Morre um pouquinho, só um pouquinho. Experimenta a agonia do impossível que é te olhar sem te tocar. Sinta a falta de ar que é a dor comprimindo os teus pulmões e ossos. Diz que eu estava meio grogue quando disse que queria tatuagens iguais e entrar de branco na igreja. Risca o nome dos nossos futuros pequenos que eu risco as quatro paredes para que elas nunca contem os nossos segredos. Você vai ter que morrer para me entender. Vai ter que amar a sua metade até se dar conta de que, se ela se for, uma parte de você também irá partir. Se não quiser me assombrar, pelo menos me passa a fórmula mágica para esquecer as tuas risadas e vocabulário sacana. Me ajuda a ser mais eu e menos você. Eu só te peço paz, trégua, carta branca. Ainda não percebeu? Você precisa estar morto para que eu possa viver.”
Ou quem sabe renascer.
"Não havia mais concordância, afinal.
Nos teus olhos, estes versos tão rimados, tão completos e dissimulados, eu via no teu mundo o meu “onde”, resposta de todas as perguntas que ainda não fiz. Estava mesmo ficando louca. Rindo com os sussurros do vento nos teus cabelos, tentando te colocar dentro de mim junto das tuas melhores metáforas e bebidas fortes. Assim eu te reescrevo, rascunho a lápis os teus traços de provocação e cabelos escuros como a noite.
Brilhando como um amontoado de constelações era a estrela mais bonita. Rara, cadente. Desejo proibido que rasga o horizonte do meu mundo. Ainda não sabia se o furacão da tua presença era melhor do que a consternação da tua ausência e isso me matava aos pouquinhos. E no meu peito o gosto suave do teu amor, levando-me a pensar que mesmo com rotas totalmente opostas, os nossos caminhos tinham que colidir. É uma sorte na minha vida ter achado você, até mesmo quando procuravas a beleza dos céus, mal sabendo que estava o tempo todo em seu olhar. Constatei, sem muito esforço, que suas pernas são os demônios dos meus olhos. Precisava te desvendar para me compreender melhor. Eu precisava entender o porquê de você brilhar tanto.
Descobri que és feito de versos por si só, que não precisa de ninguém para se escrever.
Fui embora.
Fui perdendo os meus passos a cada ramificação de saudade que me acusava o corpo. Corpo. Teu corpo. Corpo feito de estrelas como se tivesse o meu próprio sistema solar dentro dos meus olhos.
Tragando o cigarro como quem prova o teu hálito e gosta, - te tenho entre os meus dedos. A fumaça vai deixando ecos e marcas de caos, nenhum estrago que não tenhas feito aqui por dentro. Nesses momentos de últimos suspiros, contemplava o infinito de segundos incessantes e a solidão dispersa, desejando que o tempo acelerasse nessas tediosas tardes vazias. Meus olhos flamejavam ressaca, impacientes. Eu queria adiantar os meus “quase” apenas para amar as tuas rugas. Este é o problema das minhas crises de insanidade – pensei; não perceber que a alma é imortal, mas o corpo também cansa.
Eu quero as linhas do teu corpo junto do incalculável de linhas que é o teu universo. Eu quero olhar o deserto que é a tua alma, através dos teus olhos, para dizer que ainda te amo."
Você, moço, é belo como um poema que eu ainda não li.
Vamos dançar aquela valsa que nunca terminamos. Daquela vez que rodopiávamos na sala, eu com a sua camisa e você com o meu coração. Vamos! E quando terminar, me diga que vai apertar o repeat, vai mudar de música e estaremos ainda sim dançando no mesmo ritmo. Seja o meu par esta noite, seja meu par para a viva toda e guie os meus passos. Mata a minha sede. Desafoga a tristeza do meu peito e abre um caminho entre as costelas até o meu coração. Fica por lá. Constrói uma cabana, junto de uma história nova, e vamos contar as estrelas do céu do meu peito. Não me larga e me gira mais algumas vezes. Deixa eu desmaiar nos teus braços e aceita a condição de que eu more entre eles também. Esquece tua camisa no chão do quarto de propósito, deixa eu dormir com ela e te imaginar em mim. Vem, vem pro meu mundo de nuvens cor de rosa! Causa um alvoroço nos meus nervos, me deixa dormente, me traga, me corrompe. Me faz de refém, me sequestra, me prende. Sacia essa crise, essa guerra que levo na mente. Me alimenta de esperança e vamos ferver. Venha! Faça o verão comigo, querido! Deixe os teus rastros na cozinha, na sacada, deixe esse teu cheiro sinuoso de problemas sobre os meus lençóis. A chuva começou a cair, não vá! Tem um mundo tão cruel lá fora. Fica! Assopra hálito doce no meu pescoço, descobre os meus pés, descobre as arestas do meu corpo e me usa pro teu bem. Ou pro nosso. Espetáculo majestoso, atraente. As gotículas de chuva tocando as janelas lembraram-me os teus traços. Ecoavam uma sinfonia desajustada, como se induzissem a mais uma valsa. A chuva tinha o seu próprio brilho, seu próprio show. Você dormia, tão inofensivo. Ouvia as tuas pulsações, o teu corpo falando por ti. Juntei as orquestras. As lágrimas silenciosas da chuva em harmonia com a tua respiração ritmada. Aquilo com certeza era mais uma música. A última música. A última valsa. Não se sabe. Não tinha a menor noção do tempo que demoraria para a chuva cessar e você partir. Eu tinha que aproveitar ao máximo esse barulho tão silencioso. A chuva permitiu ser amada. E por um momento eu também te amei.”
“Você pode chamar de magia ou encanto, hora errada no lugar certo, superstição boba, carência inusitada. Eu chamo de amor. Chamo de amor a explicação que a tua alma me dá, junto da verdade que habita em ti - que nem tu próprio conhece. E nas músicas tão lentas quanto o teu bocejo, no meio desse temporal breve que é a vida, eu fico procurando no céu a estrela mais bonita para te presentear. Na medida que minha postura é prejudicada, contrastando a falência dos órgãos, me pergunto qual deles vai ser o último a resistir para conseguir te amar por mais um meio segundo. Quando a minha memória enfraquecer, peço que não se perca nela, meu amor. Mesmo na morte certeira, nos nós tão cegos quanto nosso futuro, um brinde as rugas, aos calos das mãos, a visão turva, pois até assim eu consigo amar o teu temperamento ranzinza e os horários dos medicamentos. Eu prometo amar essa tua mania de não achar respostas para todos os mistérios que habitam o universo, compartilhando um silêncio agradável e sem questionamentos. Amar é encontrar sua metade na metade de outra pessoa. Talvez isso seja a mágica. Saber que o infinito não passa de momentos ligeiros - porém intensos. Saber que você aceitou o compromisso de cuidar do outro até o último suspiro, não se arrependendo da escolha final. Eu prometo amar toda a extensão da tua pele, desde as constelações de sinais até as tuas cicatrizes. Prometo que posso esquecer o teu nome, mas jamais a cor dos teus olhos e os rabiscos do teu coração. Te prometo a cada dia até o último que te olharei com os mesmos olhos e que você ainda vai me fazer corar quando tentar desvendar a minha alma cansada através da íris. Amor é nunca temer. É o apoio, estepe quântico. É encontrar segurança no meio do caos. Eu te prometo, meu amor, que serás o meu zelo, minha oração e libido. Prometo o arrepio do toque, o sorriso de orelha a orelha. Prometo amar nossos futuros pequenos, nossos netos, e porque não bisnetos. Prometo ser o teu alicerce, teu desejo, tua força. Prometo deixar este corpo e continuar te amando na eternidade tão desconhecida. Acho que isso é mesmo mágica, afinal.”
“E mais uma vez a euforia do teu sorriso me desfez em pranto. Me ensina a ser assim, me ensina a achar graça da vida de novo. Te invejo. Te amo.”
“Você me amou como um daqueles seus carrinhos que colecionava quando criança. Desculpe a comparação meio besta e sem sentido, mas é que nunca passou disto, certo? Bem, não responda! Nunca tive nenhum atributo que me diferenciasse das outras gurias que você conhece, além do coração fraco e irregular. Desculpa também a falta de introdução nesta história que mal teve começo e já tratou logo de desenrolar o final. Você foi como um daqueles momentos importantes que a gente espera a vida toda. Mais uma vez te peço desculpa por dizer que sou um pouco dos teus restos também. Olhos opacos, eu te preciso tanto! Sempre tive medo que você melhorasse a minha vida, medo de que me jurasse amor eterno até a manhã do outro dia. A verdade é que me acostumei com as tuas repentinas ausências e até tentei amá-las. Eu te amei através das quedas, do caos e do cosmos, e nestes instantes, até achava que seríamos infinitos se fossemos apenas letras de músicas. Você despertou um lado bom meu que nem sabia que poderia ter, fazendo-me tatuar ao vento que eu namoraria qualquer verso que viesse de você. E assim como o grito involuntário do corpo, você se tornou uma característica minha. Desculpe-me pela saudade também, olhos opacos. Teus olhos, estes, mãos que deslizavam sobre minha pele.
Nas vezes que pensei em desistir do seu sorriso, lembrava das tantas outras vezes em que sussurravas o meu nome no escuro como se conseguisse a proeza de fazer carinho nele. Infelizmente, a gente sente quando termina, e junto daquele quase-outro-mês, quase-outro-ano, você virou o meu quase. Você se perdeu no meio dos meus caminhos e seguiu em frente. Eu procurava saídas pela tangente e becos escuros, me convenci de que não somos almas gêmeas por não possuirmos o mesmo ascendente. Talvez eu tenha perdido muito tempo sentindo inveja de quem você conheceu antes de mim, sentindo ciúmes do seu passado, das outras bocas, dos outros abraços. Eu tentava te fazer esquecer das cicatrizes enquanto o próprio mundo já estava se encarregando de te mudar.
Sabe, os meus joelhos, antes o encosto da sua cabeça para aqueles dias que o universo parecia conspirar contra você, eles se sentem abandonados também. Era como se entre a pele e a carne ainda existisse algum resquício dos teus espasmos. Eu perdi para um espaço vazio na tua vida, quem sabe até você tenha se assustado com o peso dos meus ombros e isso tenha te feito ir pra longe. Não sei.
Só sei que preciso te odiar todos os dias para lembrar que você existe. Porque, bem no fundo, somos todos substituíveis - eu sou a prova, somos também restos daquilo que nunca compreendemos, infelizes restos de amor.
Na última vez que te vi, fiquei surpresa por não tremer ao te encontrar. Observei teu reflexo através das poças d’água e não vi nada além de um perfeito estranho. Reparei no seu cheiro de hortelã e percebi o quanto sentia falta disto. Naquele dia eu te enterrei e bebi para comemorar, senti falta de ar por enterrar junto de ti pequenos fragmentos de mim. Eu nunca serei tão eu sem a parte de mim que foi embora.
Você me fez criar preguiça do mundo, preguiça das pessoas, preguiça de recomeços. Você vai seguir sozinho, acariciando o vácuo, fazendo carinhos apenas em objetos, como se implorasse dá-los uma vida. Vai conhecer alguém de mente tão vazia quanto o teu coração. Você vai ser aleatório, inofensivo e melancólico. Talvez eu te mande um cartão-postal de uma paisagem bonita. Talvez eu te esqueça. Talvez eu te leve na bagagem dos meus olhos em segredo apenas para não me sentir sozinha. Nada é definitivo.
Até qualquer dia.”
“Peguei-me, de olhos semicerrados, encarando uma das tuas fotos. Tinha vergonha de encará-la por mais de meio segundo, não sei. Ficava com medo de que ela se mexesse, de que ela também soubesse ir embora, assim como você fez. Eu evitava admirá-la por não saber exatamente lidar com a vontade de levá-la comigo para qualquer canto feito um amuleto. Não queria perder nenhum detalhe dos teus olhos pequenos e fundos. A imagem não envelheceria, não escaparia. Ela apenas eternizava a melhor coisa que eu nunca tive.
Eu era muito metódica. Desde muito cedo aprendi a conviver com um pai que foi embora e me acostumei a não criar laços. Você chegou de mansinho, sem pedir licença. E numa dessas noites patéticas eu cometi a burrada de emprestar um pedacinho do meu peito para você morar. Logo você, que ria de tudo o que eu dizia, brincou de adulto enquanto minha boca tremia falando que te gostava. Você deveria ter me calado com um beijo na metade da frase, poderia ter uma crise de pigarros ou simplesmente fingir que foi só mais uma piada minha e rir daquilo também. Mas não. Você me surpreendeu olhando nos meus olhos, repetindo a mesma frase e apertando a minha mão. Naquele momento, não sei porque, me pareceu que este verso estava atravessado em sua garganta há muito tempo. Parecia ser algo que sua alma sempre esperou ouvir apenas para flamejar o seu ego. Abaixei a cabeça aceitando o erro mais bonito que já havia cometido na vida. Isso só me mostrava o quão frágeis somos nesses assuntos sentimentais.
Você não reparou, mas eu pintei as unhas com a cor de um café fresco. Queria te saciar, queria que até as pontas dos meus dedos matassem a tua sede. Eu vivia pra isso, não? Sanar os teus demônios e dançar com eles. Uma vez você me disse para ser menos “sei lá”. Fiquei por horas procurando uma definição disto, mas logo percebi que eu era intensa demais para a sua superficialidade, e que você mal sabia se definir, quanto mais outra pessoa.
“sei lá”
Porque talvez eu tenha te dado o que ninguém nunca deu: Paciência, colo e oração. Sim, eu aprendi a rezar por você, pedia por um coração mais leve, dias não tão cinzas. Eu te pedia sorte na vida e nos engarrafamentos das quintas-feiras!
Você deveria ter vindo com um daqueles alertas que estampam as caixas de cigarros. Enquanto o seu adeus estiver camuflado em um até-qualquer-dia, eu vou continuar me enforcado nos meus próprios finais. Talvez seja por isso que eu não consiga me adaptar a mais ninguém agora. Sempre vai ter um espaço vazio no meu peito. O teu espaço. Ninguém nunca vai ter a capacidade de preenchê-lo justamente porque nenhum novo amor vai ser o suficiente para acabar com o abismo que você me tornou.”
— Faz de mim teu abismo.
“Como se fosse tão fácil, feito as ondas do mar; levar o amor embora. E ele continuar velejando calmo através do tempo; sem precipitações. Quem dera o amor ser um pássaro e voar pra longe nos momentos de nostalgia; sem rancor. Quem dera o amor uma doença benigna que se cura; e some. Quem dera. Como se fosse belo, abrir o próprio coração e arrancar a dor de si. Como se fosse alívio te tirar de mim. Como se eu não quisesse navegar nas ondas do teu corpo; e quero. Quem dera o amor soltar-se do passado; soltar-se de mim. Quem dera o amor um abismo; e por lá sumir. Quem dera o amor um grão de areia que move-se junto ao vento; indo pra longe. Como se fosse certo te apagar dos cadernos rabiscados de ti. Como se fosse fácil te apagar de mim. Quem dera o amor fosse apenas o nosso amor.”
“Sabe, está sendo tão, mas tão difícil. Tão, mas tão vago e sem graça. Não tem mais cor, mais nada. Você levou tudo. Tudinho. Você levou a parte que mim que eu mais gostava, a minha risada mais engraçada e o meu abraço mais confortável. Talvez eu ainda os use, inconscientemente. Talvez tenha apelidado um dos beijos com o teu nome, não sei. Eu tive que me tornar tão má e ir além de fazer das pessoas que eu conheço apenas uma imagem em preto e branco ao redor de mim. Nada mais importa, entende? Não faz diferença quem cruza o meu caminho agora, até porque, algum beco daqui de dentro tem um outdoor com os teus olhos estampados e, com certeza, alguma rua também traz o teu nome completo.
Eu te quero tão bem ao ponto de me fazer mal. Quero o meu nome gravado em um dos teus sentimentos confusos, - porque não em uma das tuas melhores lembranças. Você me deixou uma marca tão profunda, mais que profunda; você tatuou em mim as tuas birras e hesitações. Ensinou-me a ser medrosa e aparentemente convincente, cigana dissimulada feito Capitu, me ensinou a ser do mundo, das crises, dos elementos água, terra, ar e ah, o fogo. Aprendi a ser fria, dormente por dentro, desconfiada, ranzinza, chata, metódica. Aprendi a ser tua.
Fecho os olhos por você ainda, ontem e amanhã. Na verdade, bem verdade, eu nunca vou amar alguém como amei você. Como eu amo você. E como eu amo o modo como o meu batom fica borrado na tua boca. Eu respiro você, eu zelo pela tua vida, pela tua morte, pelas tuas faltas. Eu sinto a dor de um parente querido que foi embora. Mas, sem eufemismo, o seu “você” meu, morreu. Morreu pra sempre. Morreu tão fatalmente que eu simplesmente mal consegui acompanhar. É o que dizem, morreu tragicamente em um acidente. Acidentes acontecem. E foi um acidente desde o primeiro “oi”.”
— E quem disse que quem não é visto não é lembrado, certamente não te conheceu.
“Então, Helena, quando tua recordação for apenas cinzas, você irá sentir falta dos dias coloridos e das pessoas arco-íris que te sorriam todos os dias.
Minha doce Helena, quando o vazio estancar o teu sofrimento, sentirás saudade da própria dor.
Helena, enquanto tuas células morrem, eu sinto a perda delas, pois assim como eu amo as sardas do teu rosto, também amo o que se regenera em ti.
Sabe, Helena, quando eu me for, sentirei falta das tuas pálpebras cansadas silenciando lentamente o teu olhar.
Mas te cuidarei lá de cima para que não lhe falte raios de sol para iluminar os teus dias.
Pequena Helena, quando a solidão se alojar no teu peito, a cumprimente como uma velha amiga. Abrace-a e recite uma de minhas tantas poesias sobre o brilho dos teus olhos.
Quando eu me for, Helena, ainda te amarei por mais alguns segundos antes de passar pela porta dos céus.
Então, Helena, caso sinta vontade do meu gosto, beba aquele chá no fim de tarde de domingo assim como fazíamos, conte as tuas queixas ao silêncio que lá estarei te escutando.
Minha doce Helena, quando os anos passarem e o último grito da tua garganta ser o meu nome, lembre-se que estarei te esperando do outro lado.
Um lado tão belo quanto as nebulosas da tua íris.
Um lugar tão tranquilo quanto o encosto da tua clavícula.
Quando eu me for, Helena, conte as estrelas por mim e pelo futuro que nunca tivemos – porém que já amo.
Helena, quando o céu não for tão azul, o mar não tão calmo, a tormenta não tão assustadora, você perceberá que cresceu e tomará um rumo diferente.
Minha Helena, lembre-se sempre: Nada é tão assustador quanto crescer.”
— eu te espero do outro lado
Hoje eu entrei em outro coração.
O assoalho não rangeu e a luz não se apagou.
Eram batimentos ritmados e esperançosos.
Estranhos.
Aceitou-me que uma forma tão sutil, serena.
Eu vi paz nas ramificações, nas veias azuis, vermelhas e multicores.
Porém percebi que ali não era a minha casa, e que, apesar de muito querer ficar e aprender o que pudesse sobre uma felicidade real, eu levaria tristeza para este mundo tão bonito e orquestrado.
O queria bem.
O queria regular e sem arritmia.
Queria que alguém realmente merecesse e ocupasse este lugar.
Certamente não aguentaria a minha solidão e teria uma parada cardíaca dos meus dramas.
Não me suportaria.
Não que seja fraco ou irregular.
Apenas não quero acabar com a sua paz.
Fica bem.
PRA ELE.
Eu sei que estou no meu quarto copo de cerveja e que o nosso amor não é pra essa vida, mas deixa eu acreditar, só um pouquinho, que estamos reservados para algo além do que somos.
Te vejo sendo tão infinito e isso não é normal. Quase sempre me pergunto por que você brilha tanto, me perdendo em meio a teorias ensaiadas. Eu tenho um jeito brega de metaforizar as tuas características mais comuns.
Quinto copo. E a memória senta ao meu lado na mesa, me parecendo uma segunda pessoa.
Você me sorriu pela última vez, como se posasse para uma fotografia. Eu aperto firmemente os olhos, arquivando-a em meus pensamentos. Ela ocupará o seu lugar.
Repartimos a conta. Repartimos a vida e até mesmo o céu estrelado. Deveria existir uma constelação que abrigasse todas as estrelas que já nos observaram sorrir, despreocupados, achando que aquela madrugada de sábado duraria para sempre.
Em você eu vejo a passagem de fuga da realidade que não gosto. Arrisco-me ao dizer que consegue desafiar a lógica quando me instiga a ter receio do nosso oitavo fim, tipo aqueles fins que necessariamente nunca se acabam.
Pois, no meu mundo, não há verdades absolutas. Você sempre será a minha controvérsia.
Mais cerveja. E eu alucino. Te encaro, devoro. Não ligo se a multidão dos teus desafetos me pisotear.
Mergulho nas águas do apego e quase me afogo com todas as palavras que nunca te disse.
Não me assusto. Nunca fui de me vestir com os erros dos outros, com os seus não seria diferente.
Fui sincera na mesma intensidade em que pensava em planos infalíveis, sempre saindo da história como a vilã que enlouquece no último capítulo.
Você recua um passo quando eu exijo nada menos que um final feliz.
Mas ainda estou no bar. Eu e a minha memória. Eu, minha memória e o copo de cerveja.
Então percebo que você percorreu os meus labirintos, encontrou os pontos fracos e, como quem tem todos os mapas, descobriu sentimentos em mim.
Sentimentos são cidades fundadas dentro do peito. Inabitadas, cercadas de concreto e flores. Sentimentos são frágeis; saiba preservar. Cuidado com os escombros. Tente reflorescer.
Mais um copo. E ainda tenho muitos tijolos para recolher.
Você me atingiu em cheio, trazendo nos olhos fundos a artimanha de me fazer pensar em qual ponto do caminho falhei por nós. Você! Com essa sua indiferença que carrega na lábia a espontaneidade de quem nunca tem nada a perder. Que enfia os pés pelas mãos com a sutileza de quem sente prazer em correr riscos.
Qualquer palavra etérea sai da sua boca em tom de você-diz-isso-para-todas. Solto um sorriso amarelo; sei que é verdade. Bem, honestamente, você já provou todos os gostos. E eu aqui. Tão cerveja. Tão memória. Tão louca. Acreditando que é conspiração quando você entra na minha vida de qualquer jeito, mesmo que não queira fazer parte dela.
Talvez, bem lá no fundo, você precise de alguém que tope entrar em coma emocional pelas tuas loucuras. Talvez você precise do meu lado fraco, dos suspiros e da minha insensatez. Precisa do meu caos e da destruição em massa que ocorre dentro das minhas cidades. Precisa sentir o abalo e as trepidações enquanto sussurra no meu ouvido frases nada inéditas.
É. Mais um gole com gosto de ausência. Mais um céu sem estrelas.
Mais um amor que não é pra essa vida.
Toda intimidade tem o seu mal, você sabe.
Sabe que conhecer profundamente alguém é um caminho sem volta. É primavera!
Ele sabe que ela gosta de tulipas e do orvalho da manhã sobre as árvores. Sabe da sua mania de cantarolar no chuveiro e a de revirar os olhos quando é contrariada.
Quando o casal termina, um bocado de outras milhares de coisas entram em um espaço vazio. As paredes foram as suas confidentes; tudo o que passou morre entre elas.
Há história nos lugares mais banais da cidade. A cafeteria, ela indicou. O bar da esquina, era o refúgio dele de toda quinta-feira.
Existiu verdade onde brotou o silêncio. Existe um passado mudo, congelado, pronto para ser mencionado onde a saudade atentar. Pois o passado é uma pessoa invisível que anda ao seu lado, que cresceu junto com todos os caminhos que você escolheu deixar para trás.
E ela é um álbum de memórias, suas lembranças estão coladas em seu corpo.
Ainda existirá ele quando a sua música favorita tocar no rádio. Existirá ela quando as flores começarem a desabrochar. De novo e de novo.
Emoções são momentos bons subestimados pela força do tempo. Emoções são tão incertas quanto um último suspiro. Há emoção nos olhos que se cruzaram, nas peles que se afrontaram. Há emoção na simplicidade do afeto, na decepção que, por ventura, calou qualquer voz. Emoções são belezas cruéis; somos vítimas delas.
E o tempo não para!
Eles vão se tornar cada vez mais vítimas. Cada vez mais distantes.
Talvez o mundo os separe, ou o sentimento de que algo bom aconteceu - e valeu a pena -, os una. Seus nomes sairão um da boca do outro em tom de poesia. Até porque, além do espaço vazio, há milhões de mundos novos a serem descobertos para quem cai na atmosfera de outrem.
Nestes mundos não existem partidas, apenas chegadas. Existem sorrisos incalculáveis e pouca pressa!
Então, ainda é primavera!
E, com ela, o recomeço não parece ser algo tão ruim. Pois pessoas são linhas que se cruzam de vez em quando. Sinuosas.
Pessoas são trens rápidos, ansiosos pela próxima estação.
Aí você finalmente aprende que pessoas são lições que a vida te dá.
Então, lá está ela.
Hoje é quinta-feira, ela decidiu entrar no bar da esquina.
Ele pode estar tomando um café neste exato momento. Até mesmo admirando tulipas.
E no meio disso tudo, pode ser que os sorrisos brilhem em seus rostos. Um precisava acontecer para o outro. Um precisava existir para o outro, mesmo que fosse apenas por uma breve queda na atmosfera.
Às vezes eu queria amar alguém tanto quanto amo a letra de Stop Crying Your Heart Out do Oasis. Assim como amaria flutuar em nuvens de quadros impressionistas.
Às vezes me flagro cantarolando com um violão invisível entre os braços. Eu desconheço os acordes. Mas ele os conhecia.
Ah, ele! Todos os clichês do amor cabiam nas suas sete notas. Ele repetia os refrões enquanto fitava o dia nascendo através da janela. Seus dedos brincavam em meio ao caos. Nunca começava antes do primeiro cigarro. Criou as suas próprias regras.
Seu violão era a sua máquina de escrever. Compositores são poetas que a vida esqueceu de presentear com a arte do silêncio. Os seus sentimentos têm tons e harmonias; pausas e bis.
Eu me acostumo! Mesmo sabendo que não duraríamos mais do que um álbum inteiro do Pink Floyd. Serei mais uma história, mais um balançar de cordas. Terei cinco estrofes e dois refrões. Meu nome vai ser ocultado. A canção irá servir como uma recordação boa para alguns; insuportável para outros.
Enquanto isso - do outro lado da cidade -, estarei me reestruturando aos pouquinhos.
Eu só preciso do barulho que vem do meu peito para estampar o papel. Eu só preciso lembrar-me do cheiro de cigarro mentolado para naufragar no mar branco das folhas. Porque poetas são compositores sem ritmo. Meus dedos são ágeis, assim como o músico nas cordas. Minha alma grita, pois precisa. Meu coração ritmado cria todo o tipo mirabolante de melodias.
Eu o conheci no meio das minhas incertezas. Nossos bloqueios criativos se atraíram. Esse era o nosso nível de igualdade. Um não era superior ao outro, havíamos cicatrizes iguais.
Não é o que dizem? Por onde passamos deixamos um pouquinho da gente. Pessoas que assinam as nossas peles; carimbam as nossas vidas. Eu sei que na vida dele muitas outras se tornarão canções pelo que não deu certo. E voltaremos ao recomeço, uma vez que o ser humano tem a necessidade de pertencer. Seja a uma música, a um poema ou lembrança.
E ele é todo sentimento. Eu sou toda pedra. Ele sempre viveu todos os momentos; fumou todos os cigarros; cantou todos os refrões. Mas aprendeu a duvidar das palavras e dos poetas. Nós queríamos ficar juntos, ao mesmo tempo em que todos os versos diziam ao contrário.
Mas eu nunca o amei!
Mesmo ficando com a mania de curtir os álbuns dos anos 70, de criar regras, de anotar as coisas em um bilhete na geladeira para não esquecer o que fazer. Mesmo esperando silenciosamente o fim do primeiro cigarro, em seguida o pigarro seco e, por fim, os graves e agudos do violão. Eu não o amei nem quando fiz o meu melhor poema dedicado aos amores que perdemos no meio do caminho. Ou os caminhos que perdemos em meio aos amores ilusórios.
Ele nunca soube me dizer o que era impressionismo, eu nunca quis aprender a tocar violão. Ele não gostou dos meus poemas; eles eram indecisos - porque lua em libra é o meu segundo nome. Eles eram tristes, pois eu sabia que nunca seria o seu Wonderwall, do mesmo modo em que ele nunca seria aquele que poderia me salvar.
Nossos mundos colidem, nossos karmas se cumprimentam como velhos amigos de uma vida cansada. Por isso preferi amar Stop Crying Your Heart Out do Oasis. É mais fácil. Aceitável.
Assim como a música, tivemos o nosso tempo cronometrado. Assim como um poema, seremos eternizados em pequenas estrofes do passado que resignamos.
“Aguente!” – diz a música – “Não se assuste! Você nunca mudará o que aconteceu e passou...”
E isso me conforta até a próxima manhã, sem ninguém cantarolando refrões na janela...
A coincidência anda de mãos dadas com os nossos desencontros. Esqueça os planos. Eles não gostam dos nossos abraços. Esqueça as datas. Nós sorrimos em meio ao imprevisto. O tempo não está do nosso lado. Destinos são quebra-cabeças; sorte, o nosso disfarce. Remamos contra a maré, derrotamos os nossos monstros emocionais. Tentamos.
Não viramos amor. Nosso final feliz termina com outras pessoas ocupando os nossos lugares. Éramos um teste de resistência e perdemos as forças. Éramos contrários.Sabíamos que ambos não iriam para frente se um fosse a fraqueza do outro. Até porque amor não é sinal de fraqueza. O amor não sugere desculpas. O amor é o mais natural dos acasos.
Amores são momentos. Eu vou te recordar numa música e você guardará as minhas piadas sem graça. Amores são mais do que momentos, são mapas. Desenhados por rotas antigas e por lugares jamais visitados. Escolha o seu refúgio, ou siga desbravando. Talvez nos orgulhemos do que nos tornamos, do que conquistamos, do que descobrimos. Pois se descobrir também faz parte do que deixamos para trás. Mudamos de ideia. O que antes era certo é duvidoso agora. Nosso Norte não é mais o mesmo. Quanto mais longe andamos em direções opostas, mais invencíveis ficamos.
Destinos são quebra-cabeças que juntamos ao longo dos danos. E no final isso faz sentido. Uma vida inteira faz sentido. Relacionamentos, por mais intensos, não passam de fases. Aprendemos a lição para não errar no seguinte. E não é o fim do mundo.
Sentimentos são os músculos involuntários do nosso corpo. Não mandamos, nem desmandamos. E eles se adaptam. A um sorriso novo, a um abraço mais apertado. Se adaptam em lugares que nem pensamos em explorar. Que não exploraríamos se o tempo estivesse ao nosso favor.
Obrigada por ser um passado bom que mora em uma parte de mim a qual não habito mais. A lembrança fica em cada canto da cidade que nos serviu de esconderijo. Mas é hora de sair do conforto e encontrar as coordenadas da felicidade. Viva por alguém que te faça ter vontade de criar planos e rotas. Viva pelo acaso. O passado já está escrito, saiba o que fazer com o seu presente. Não demore onde não precise parar. Questione todas as dúvidas. Se encontre antes de encontrar outra pessoa. Viva uma vida cuja história mereça ser contada.
Ser do signo de Câncer é ter a certeza de que, em seu coração, há um livro de romance esperando para ser escrito. “Sensível” é o seu segundo nome. Não peça explicações quando ela mesma não sabe se explicar. É sentir a emoção antes da razão; o carinho antes do toque. É viajar em uma nuvem carregada de sonhos, flutuar até onde a imaginação alcança. Lunáticos por natureza, cautelosos por sobrevivência.
Ser canceriano é ter a capacidade de doar o coração ao outro. É saber ouvir com a alma. É cuidado. Os sentimentos são como vidro, nem pense em não segurá-los pelas pontas dos dedos.
Câncer é a proteção por trás do conflito interno, é a reconciliação difícil, a resistência teimosa. É ser um caminho de flores, às vezes repleto de espinhos. Saiba onde pisar!
É ser cativante como uma melodia doce; os seus conselhos superam as suas ações. “Faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço!” – bem-vindo ao mundo dos caranguejos.
Mas nem por um segundo pense que conhece verdadeiramente um canceriano, ele pode lhe surpreender. Por trás da postura vulnerável um vulcão em erupção corre através das suas veias. Intensidade é a sua corda bamba. Rancor e ternura correm em sentidos opostos, é 8 ou 80.
Ser de Câncer é decorar o alfabeto de sentimentos de trás pra frente. É ser instável como as marés e ter várias fases, assim como a Lua. A oscilação de humor é um carro que pega de 0 a 100 km/h em 3 segundos. Não diga o que ele tem que fazer, pois não será ouvido. Não tente uma batalha emocional com o canceriano. Essa é a sua arma. Está no território dele.
A facilidade com a qual Câncer consegue lidar com os extremos de si é mágica e complexa. Tornar-se distante e frio é tão fácil quanto mostrar lealdade a quem gosta e, acima de tudo, aos que demonstram igualdade e confiança. O rancor interminável é uma mania feia que os caranguejos nunca aprenderão a superar.
Ser canceriano é ser um colecionador nato. Há um museu em sua memória. Há histórias e mais histórias em cada objeto e fotografia que já guardou. Colecionam desde amores e decepções, até lugares e segredos. O passado é o seu ninho. É algo protegido a sete chaves. É um laço difícil de ser rompido.
E ai de quem duvidar do sexto sentido canceriano! Ai de quem duvidar de que, mesmo com um olho no passado, ele se preocupa com o futuro! Ai de quem duvidar de que ele não consegue lidar com milhares de características em apenas uma personalidade!
Ser ambicioso e ciumento, mas ao mesmo tempo, humanitário e generoso. Tímido e impaciente. Calmo e amante de aventuras.
Ser do signo de Câncer é amar incondicionalmente. Seja um livro, uma música ou alguém.
Nós somos um amontoado dos nossos danos. Nossos olhos cor de terra fazem fronteira. Meu outono não combina com a sua primavera. Um cai e o outro se regenera. Um chora e o outro ri.
Nossos defeitos superam as nossas qualidades. Nossos sonhos não estão mais guardados na mesma caixa. Há sempre um conflito, você é a razão. Eu sempre perco a guerra. A emoção é a minha trincheira.
Músicas declamam as histórias que jamais contaremos a alguém. Vamos odiar e, por fim, esquecer. Talvez sentir inveja por elas durarem mais do que o nosso encontro. Um abismo de palavras não ditas nos consome. Pois não há antídoto para o silêncio. Ele é a resposta para as perguntas cujo resultado já sabemos. É território neutro. O meio termo. E sempre odiamos meio termo.
Nós somos o que ninguém viu. Os cacos do que ninguém sentiu. Há história por trás do desvio do olhar. Há contratempo nos assuntos que morreram em alguma desistência nossa. Há estranheza nas letras de canções familiares.
Eu já usei aquela sua camisa azul e você já reclamou do meu vizinho que fala alto. Há vida por trás das situações que enterramos; das peles que assinamos. Pois o silêncio também narra romances ruins.
O clímax não interessa mais quando o fim chega. Os motivos para ir embora sobrepõem o oposto. O mundo ficou pequeno para as nossas birras. O nosso enredo não atrai. Nos entediamos na mesma frequência.
Nossos nomes não estão no título de uma música do Legião Urbana. Você não estava perdido e não se agarrou a mim. Não tivemos o nosso próprio tempo, pois todo o tempo do mundo já estava cronometrado. Palavras são erros e os erros, bem, são meus.
Eu falo em seguir em frente, mas eu mesma nunca fui muito de ouvir os meus conselhos. Cometo erros, esqueço aniversários e sou grossa até quando não quero. Mas, apesar dos meus defeitos, sempre tive muitas expectativas no amor. Sério! Como seria. Que formato teria...
O que eu não sabia, e o que ninguém me disse, é que o amor não é aquela bala perdida que te acerta sem mais nem menos. Bom, pelo menos comigo funcionou diferente. Foi como ter um alarme no peito e escutá-lo esbravejar. Sentir que era a hora de ser um plural.
O amor te deixa bobo e paranoico. As nuvens passam a ter formas, os pássaros cantam mais alto. Você não é você quando se apaixona. O mundo é colorido em duzentos tons de vermelho e você gosta de escutar promessas, mesmo que não tenha pedido para ouvi-las. Amor é pensar fora do corpo. Saber ler mentes, decorar trejeitos e, quem sabe até, aprender a fazê-los também.
Amar é abaixar a guarda e mandar o exército de autossuficiência recuar.
Amar é compromisso. Amar é uma palavra decisiva. E palavras são destinos, caminhos em linhas que a alma escreve. Escreve na parede do peito do outro. Até porque, você não pode iniciar um incêndio sem uma faísca.
Você ama pela convivência, ama pela afinidade. Ama e entende que ser perfeito não interessa. Perfeição não discute, ela tem medo de ser machucada. Pois com a perfeição não existem os receios. Não tem meio termo. A perfeição te deixa desleixar e some com todas as coragens que você nunca pensou em ter.
Então, por algumas vezes, posso até pensar que o amor é uma bala perdida sim. Pois você sobrevive. E recomeça. E valoriza o que tem. Faz planos, compra duas passagens, dois travesseiros. Aprimora-se por dois, se reinventa duplamente. Dentro do nosso universo existe um equilíbrio maluco. O que um faz, o outro faz.
No amor eu consigo improvisar. Aprendo que ser melhor é cronológico, enquanto os sentimentos são atemporais. Aprendo que tenho medo de cometer erros, tenho medo de passar os meus aniversários sem ninguém por perto, medo de ter um vinho na geladeira por mais de três semanas por não ter com quem beber.
Percebi que a vida não é um conto de fadas. É concreta, com pessoas e sensações reais. E essa realidade me envolve, atiça e pasma. Pois, neste plano, o amor será sempre o nosso ponto de encontro. Ponto de ônibus coberto que nos abriga em dia de chuva.
Eu subestimei o amor e a capacidade que ele teve de me mudar. Mas o amor também me subestimou e eu provei - para mim mesma até -, que ter alguém para esquentar os pés (e o coração) não era de todo ruim.
Um dia a vida te convence de que os recomeços são necessários. Que amar demais e por dois não é recíproco. Aprende que esse tempo de que tanto falam é desleal quando quer e honesto quando pode. Percebe que o amor não é para os fracos, mas sim para os distraídos. Descobre que a vida não é essa bomba relógio cronometrada que alguns dizem.
Um dia o choro abafado no travesseiro transforma-se em sorriso bobo. E você percebe que finais felizes podem não ser tão mágicos quanto o presente. E se contenta com isso. Entende quando o sofrer passa do ponto e para de cultivá-lo.
Um dia a tempestade volta a ser apenas uma garoa fina. E, para cada sorriso seu, uma estrela brotará no céu. Aí, vai entender que nada pode durar além do sufoco da alma. Vai aprender a sentir o cheiro do perigo e ir embora. Saberá fazer as malas. Refazer a vida.
Um dia a vida te convence de que tentar acumular uma pilha de erros com alguém não satisfará a tua felicidade. E vai entender que nada que não passe de teoria merece a oportunidade de ser real. Que os sonhos são maiores que as falsas alegrias. Que difícil mesmo é ficar em cima do muro, enquanto milhares de chances preciosas são perdidas todos os dias.
Um dia você vai saber que ser sozinho não é - e nunca foi -, ser solitário. E aprenderá a viver sem grades, tanto no peito quanto fora dele. E se apaixonará pelas reviravoltas da vida, as voltas que o mundo dá.
Então, você vai encarar o passado como se não o conhecesse. Para os outros, um mistério. Para você, apenas mais um segredo.
Um dia, se o recomeço não fizer sentido, tente entender que, às vezes, é preciso juntar todos os montinhos de distrações e soprá-los ao vento. Compreenda que muitas pessoas vão se perdendo pelos caminhos, enquanto tentamos achar os nossos.
Assuma todos os riscos. Leia todas as peles. Decifre todos os mapas. Siga fazendo o melhor que sabe. Não deixe ninguém tentar modificar o que você é.
Pode levar tempo, mas você entenderá o valor da liberdade que o primeiro passo pode lhe proporcionar.