Aline Mariz

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Sobre as palavras


Palavras nada mais são do que letras jogadas num papel quando não existe sentimento dentro delas. Sem sentimentos, as palavras ficam cinza. Ficam sem graça, sem par. Sem poesia, sem verso... Ficam em vão.
As palavras só valem quando já estão transparecendo sentimentos e vão perfumando as pessoas com o cheiro de cada um deles. Só valem quando se fingem de sol e, iluminando, transformam cada lágrima transparente num pedaço de arco-íris.


As palavras valem... Mas só quando se vestem de pincel e pintam as pessoas de vida.

Com defeito


A gente diz o que fazer, dá ordens e grita com ele, mas não adianta de nada... O coração nunca nos obedece. A gente chora, esperneia, e acaba fazendo o que ele diz, e se apaixona por alguém que a gente nunca nem quis. De que adianta tanto esforço, se no final a gente acaba cedendo à vontade do coração? Bem que ele podia nos obedecer pelo menos uma vez. Mas é teimoso... Quer guardar o mundo quando nem consegue guardar um. É bobo, porque se encanta com o que não devia. É burro, porque insiste mesmo sabendo que depois, quando o amor se desfazer, quem mais vai sofrer é ele. Parece que não entende que o amor só é bom quando é pra dois, e se entrega todo, de graça. E no final de tudo, acaba latejando de dor, e ainda faz questão de nos levar junto. Bate por bater, porque não tem mais vontade... E é como se em cada batida a gente sentisse o nosso coração se desfazendo.
Cansei de brigar com ele... Não quero mais ir contra ao que sempre acontece. Não vou mais lutar, vou só me deixar levar pela música que toca agora. Meu coração vai estar sempre no mesmo lugar, do lado de fora, fácil. Esperando a esperança, esperando um amor pra dois.


Cansei de dar ordens... Meu coração é surdo.

Mas tudo deu um nó


Eu
Você
Nós
Na cabeça
Na lembrança
No coração

Você vai
E leva o ‘s’
Acaba com o nós
Mas ainda resta
O nó

Que deu no meu coração

Inserida por alinemariz

Palpite


Julia é uma mulher que tem lá suas feridas, umas já fechadas, e outras bem escondidas; tem sempre um sorriso no rosto, independente de como esteja por dentro; é apaixonada por música, cinema, Vinícius de Moraes e brigadeiro; tenta não se arriscar tanto quando o assunto é coração – embora não tenha muito sucesso quando tenta evitar –; ama o sol e adora um dia de chuva, daqueles pra ficar embaixo do cobertor, vendo filme.

Rodrigo é egoísta, talvez até demais; não é daqueles que contam a sua vida de primeira e diz “acabou”, ele é completamente o contrário; às vezes surpreende como ele é tão complicado e difícil de entender; gosta do sol, mas prefere uma boa chuva; não é lá muito preocupado com o futuro; gosta de observar os sorrisos dos olhos – diz que é o mais sincero – e adora soltar umas cantadas ao pé do ouvido só pra poder ver um sorriso envergonhado.

Embora possa não parecer – ao menos nesse pedacinho contado de cada um -, eles são umas das pessoas mais parecidas que eu já vi... A maior diferença é que Rodrigo tem uma namorada, e o maior problema foi o destino tê-los apresentados na hora errada.

Ou não, vai ver que era pra ser assim mesmo: um amor incomum, que dispensa explicações; que só de olhar, você já entende. É exatamente como Rodrigo definiu: esse amor deles é uma espécie de amor-amizade.

Bem, eles se conheceram num bar, e Julia nunca pensou que isso viesse dar em algum lugar, muito menos nessa amizade que eles têm hoje... Afinal, a primeira coisa que Rodrigo disse para ela foi logo uma reprovação. Ele a viu pedindo cachaça, olhou estranhamente, e deve ter pensado algo como “porque diabos uma mulher ia pedir cachaça? Ela parece tão frágil! Deve estar é querendo afogar as mágoas na cana mesmo”, quando falou:

- Cachaça? Mas que coisa feia, rapaz!

Julia o olhou com uma cara um tanto quanto desprezível, em relação ao comentário dele, mas logo abriu um sorriso e soltou sem nem pensar:

- Mas o que é que tem de feio? Nunca visse uma mulher beber cachaça não, foi? Hahahaha.

- Claro que já, mas é que você parece tão...

- Frágil? Eu sabia que tu tinha pensado alguma coisa desse tipo...

- Bem, era o que eu ia dizer... Mas é que não sei explicar, eu acho que não combina muito bem contigo. Além do mais que cerveja é bem melhor, não acha não?

- Hahahaha, eu não gosto muito de cerveja não, ainda tô aprendendo a gostar. Mas e aí, me conta o que tu pensou quando me viu pedindo cachaça?

E daí em diante, começaram a conversar sem nem saber o quão especial um seria para o outro.

Aos poucos, foram se descobrindo... Era como se em cada dia, Rodrigo contasse um capítulo de sua vida – o engraçado é que ele ainda não acabou o seu “livro” até hoje – e Julia contasse um pedacinho do que ela era. Descobriram gostos iguais para tudo: pra música, pra sentimento, pra escrever, pra olhos e pra sorrisos. O tempo passava rápido para eles, quando na verdade passava tão lento que só fazia uns três meses que eles se conheciam... E mesmo assim, já tinham um laço tão forte como alguém que se conhece há anos.

Num dia, sem nem ter porquê, discutiram que sobre o destino. Disseram que ele havia se atrasado, que havia feito as coisas numa ordem inversa, que eles deviam ter se conhecido antes, só pra ter mais tempo. Mudaram de assunto. Falaram sobre alguns textos, uns filmes e sobre o clima. Caíram no assunto “nós”. Discordaram e concordaram, ficaram sem resposta e sem saber o que dizer. Por fim, chegaram numa conclusão: que deixasse a vida levar, porque o que tivesse de acontecer, iria acontecer de todo jeito.

Ficaram por quase uma semana sem se falar – o que era muito para eles -, até que Rodrigo ligou pra Julia e cantou:

- “Tô com saudade de você, debaixo do meu cobertor. De te arrancar suspiros...”

- “... Fazer amor.” Que música mais indecente pra cantar pra mim, num acha não? Hahahaha.

- Hahahahaha, acho não. Tô com saudade de você... Vamos sair? Agora?

- Agora? Às onze e meia da noite?

- É, agora! Bora pra aquele bar, onde a gente se conheceu?

- Tá bom... Vou só trocar de roupa e a gente se encontra lá em quinze minutos, tá?

- Tá certo, não demora!

- Relaxa. Beijo.

Julia desligou o telefone e ficou só ouvindo o barulho que seu coração fazia... Ou era amor, ou era saudade. Ela só não sabia bem do que se tratava.

Quando Julia desligou, Rodrigo correu pro banho. Não conseguia parar de pensar no tamanho da saudade que tava sentindo. Saudade do sorriso dela... Das conversas, do carinho. Saudade deles dois.

Julia chegou, e cinco minutos depois, Rodrigo também. Sentaram-se, ele pediu uma cerveja e falou:

- Cachaça, senhorita?

- Hahahaha, não, engraçadinho. Para você que não sabe, agora eu tomo cerveja – e o olhou desprezando o comentário dele de novo.

Parecia que estava tudo igual. O mesmo lugar, o sentimento, eles, a amizade... Tudo estava como era pra ser. Ficaram por lá até quase uma hora da manhã, e nesse tempo, conversaram muito; tanto, que não sei como eles ainda tinham do que falar.

Foram juntos até o carro, estava chovendo. Antes que Julia entrasse em seu carro, Rodrigo a puxou e sussurrou no ouvido dela:

- Me diz como é que você conseguiu me viciar assim, desse jeito, me diz?

- Só te digo uma coisa. Ou melhor, duas. Uma: nem venha com isso agora... Pare. E outra: eu tenho um palpite. Sobre a gente.

- Como é que eu posso parar com você sorrindo pra mim desse jeito e com seus olhos âmbar me olhando assim?

- São verdes, já disse.

- Pra quê tu insiste que são verdes? Âmbar é muito mais bonito.

- Então tá bom, eu deixo que eles sejam âmbar só pra tu.

- Hahahaha, obrigado. Me diz aí, qual é o teu palpite?

- “Eu sinto a falta de você, me sinto só... E aí, será que você volta? Tudo à minha volta é triste... E aí, o amor pode acontecer. De novo, pra você, palpite.” Era esse.

Rodrigo puxou-a pra mais perto e disse, perto da boca dela:

- “Tô com saudade de você, do nosso banho de chuva, do calor na minha pele, da língua na tua”. E esse era o meu pra você.

Beijou-a.

Na cabeça de Julia vinham milhares de coisas para serem gritadas, mas ela só conseguia mesmo era pensar que acabava de descobrir se era amor ou se era saudade. E não era nenhum dos dois.

Rodrigo não conseguia pensar em mais nada, só na chuva fria e o beijo que o esquentava por dentro, e na vontade de ter Julia sempre por perto.

Soltaram-se. Julia o olhou com os olhos cheios da confusão que brotara na sua cabeça, mas com a certeza que vinha de dentro do seu coração e disse:

- Como é que tu conseguiu roubar um pedaço do meu coração assim, tão facilmente?

- Eu sempre fui um bom ladrão.

- Ridículo.

O silêncio fez-se presente por uns dois minutos, e eles sabiam o que havia acontecido ali. Além de ficarem ensopados de água, eles de descobriram o que sentiam. Julia sabia que precisava dele, e Rodrigo sabia que precisava dela; eles eram como um vício, um para o outro.

Rodrigo beijou-a na testa, e já ia embora quando Julia disse:

- Entenda só uma coisa: Eu nunca vou deixá-lo ir.



O resto ficou subentendido, como um parênteses em aberto na cabeça de cada um.

Inserida por alinemariz

Gravado em mim


Eu odeio esse seu jeito de ser tudo que eu sempre quis.

Odeio esse seu jeito de se vestir, porque ele é exatamente como eu queria que fosse. Odeio seu jeito de falar, de andar, de mentir. Odeio o sorriso dos teus olhos e o som da tua risada. Odeio cada palavra que me lembra você. Odeio as músicas que você escuta, porque eu as tinha feito como nossas. Odeio essa sua mania de sorrir sem jeito quando me pede desculpas. Odeio quando você me faz acreditar em cada palavra que sai da sua boca. Odeio o caramelo que preenche seus olhos. Odeio me perder nesse seu sorriso e não saber me encontrar no final.

Odeio esse seu jeito de ser tudo que eu sempre quis, e não te ter só pra mim. E o maior problema é que tudo isso que me faz te odiar é exatamente a mesma coisa que me faz te amar. Essa tua cara de sono, que fala sem nem saber o que diz; essa tua mania de insistir no que já não tem mais jeito; esse seu jeito de saber me usar, de me conhecer, de me convencer... Parece até que você tinha o meu manual de instruções, porque você sabe me decifrar em cada palavra e pensamento meu.

Mas o que eu mais detesto é quando você desfaz o nó que nos amarrava e vai embora. Me deixa aqui, sem ter nem sequer um porquê. Você vai e eu fico em vão... É como se você levasse junto tudo o que faz parte de mim. Você não pensa nada, só em você mesmo; esquece de tudo e simplesmente vai-se embora... E me deixa aqui, com o coração estendido no varal, secando as feridas e com a esperança já no fim. A esperança vai acabando e você ainda não voltou. O relógio marca os minutos, os minutos vão formando horas, as horas formam dias e você não volta.

É quando, antes que o vento pudesse secar o resto de uma gota de esperança, você chega. Chega com o sorriso que eu mais gosto estampado na cara e com palavras que sempre me convencem. E eu odeio quando você faz isso, porque você sabe que independente de quando chegasse, meu coração ia continuar lá no varal, estendido, só esperando você voltar; você sabe que meu coração está impregnado de você, e que por mais que eu queira, não consigo tirar seu cheiro de lá... Tornou-se permanente em mim.

Eu odeio quando você chega e, tão facilmente, me pega de volta. Odeio saber que não te tenho do mesmo jeito que você me tem. Odeio quando você mistura as palavras e me faz acreditar que seu coração é de todo meu. Odeio o barulho que o silêncio faz quando você some. Odeio esse teu jeito inteiro; da cabeça aos pés, em cada pedaço teu... Odeio teu tudo e teu todo, porque ele ainda me faz te amar como eu já não devia.

Odeio não conseguir te arrancar de mim, desde o dia em que você me mostrou a freqüência que era só nossa... Desde o dia em que eu te transformei numa canção, e te gravei em mim, de um jeito pra nunca mais te perder.

Gente


Um velho sentado na esquina, um outro jogando dominó na praça, uma senhora com sua neta no parque, uma moça pegando ônibus pra trabalhar, uma criança pedindo esmola, um filho da rua, um cachorro largado, um palhaço no sinal, cores apagadas, o cinza da cidade. Meu pai, minha tia, seu primo, nosso avô, seu irmão, nosso amigo, sua mãe, minha avó, minha filha, sua sobrinha, uma roda de conversa, a cor dos seus olhos, tua voz, meus trejeitos, violão tocando poesia, amor na ponta da língua.

Tudo se move ao mesmo tempo, se interliga e passa por nós de uma só vez. Vai, volta, passa de novo, se mostra, remexe, mistura e por pouco, quase que tudo se junta numa coisa só. Quase. E é por esse quase, que nem tudo nos marca.

A gente passa na rua, vê gente aqui e ali: não guarda. Vi o rosto de um, não sei o nome do outro. A senhora que me pedia esmola, ficou na calçada; não tinha rosto, ficou pra trás no retrovisor. Mais de seis bilhões de pessoas no mundo e nem quinze chegam a nos marcar de verdade. Chega a ser engraçado a quantidade de gente que só passa por nós, sem nos acrescentar nem ao menos um "bom dia" ou uma lembrança.

Mas também tem aqueles que nos marcam por toda uma vida. Tem gente que a gente nem tem o direito de escolher, mas vai estar sempre ao nosso lado. Tem gente que a gente só olha, e já sabe que ali vai nascer uma amizade que vai durar muito tempo. Tem gente que é fácil de ser cativada. Tem gente que nos ganha pela dificuldade de conquistá-la. Tem gente que é chata, mas que mesmo assim, a gente gosta. Tem gente que só dá uma palavra, e já nos conquista. Tem gente que parece que guardou as melhores palavras pra saber como nos cativar. Tem gente que nem fala nada, mas nos ganha com um sorriso. Tem gente que chega de repente, arruma um pedacinho no coração da gente e se instala por lá mesmo, como uma raiz que a gente não consegue – e nem quer - arrancar. Também tem daquela gente que arruma um canto dentro da gente, e bem de mansinho, vai embora. E vai tão de mansinho, que a gente só percebe quando a saudade já está nos rasgando por dentro.

Saudade.

É só aí que percebemos quando alguém nos marcou. O que marcou, ficou; e isso, não será esquecido enquanto houver esse sentimento quente e inquietante dentro de nós.

Saudade de cada frase perdida entre duas bocas, da sua cor vista em teus olhos, daquele livro que lia quando pequeno, de uma música, de um verso dito inapropriadamente, de um erro, de uma saudade, de uma pessoa, de surpresas, da verdade, da sinceridade, do amor, de uma cor, de uma foto... Saudade é tudo aquilo que um dia chegou pra nós, e, por sorte - ou não -, ficou preso em cada pedaço nosso.

Inserida por alinemariz

Fica


Talvez seu sorriso ainda brilhe lá no fundo das minhas lembranças. Lá no cantinho, bem escondido, pra ver se não aparece... Pra se esconder de mim mesma. Na verdade, o problema é que você anda se escondendo por dentro de mim esses dias, com medo de que eu lhe pegue e lhe tire de onde está. Será que você não aprende que não te quero fora de mim? Como pode você ver meu sorriso e não entender que ele ainda brilha pelas borboletas que você traz ao meu estômago? Entenda: eu sempre fui sua, e se um dia, por ventura, deixar de ser... Ainda serei: no meu inconsciente tem uma parte que não suportaria ficar sem você.

Você vai (re)aparecendo devagar, ficando mais evidente em mim. Agora, meus olhos refletem os seus. Suas cores, suas vontades e seu horizonte. Buscamos um mesmo fim, um mesmo nós. Estamos quase como um só, e você já parou de se esconder. Você vai ficando, e me levando nesse passo, só com o som do meu coração, fazendo uma música só nossa.

O tempo já se foi, passou. Você ficou e eu só faço cantarolar aquela música de Chico Buarque, para lhe lembrar todos os dias que não precisa se esconder em mim de novo. Aquela, "Fica". Canto toda, e quando chego na minha parte preferida, repito até cansar.

Repito, repito, repito... E quando canso, meu coração toca nossa música, cantando assim: "Mas fica, meu amor... Quem sabe um dia, por descuido ou poesia, você goste de ficar".

Inserida por alinemariz

Sem tempo nenhum, só primavera


Quando olhei bem no fundo dos teus olhos, não acreditei no que eles me diziam. Eles nem sequer falavam nada; gritavam um adeus, sem um porquê ou alguma razão. Será que tudo isso aconteceu mesmo? Queria que você não tivesse ido embora... Às vezes imagino que você está atrás da porta, só esperando que eu volte pra me dizer coisas de amor.

Foste embora tão repentinamente que estranhei: ainda permaneces em mim. Teu cheiro, tua cor, teus olhos, tuas palavras sussurradas, tuas -nossas - músicas, tua voz, teu riso contagiante, tuas mentiras sinceras e histórias mal contadas... Porque não levaste os teus próprios pedaços? Já cansei de carregá-los pra qualquer lugar que vou.

Sabe-se lá porque que eu fui inventar de te fazer de abrigo. Eu sempre soube desse teu jeito desapegado de tudo, mas quem manda ter um coração cheio de defeito? Pedi pra trocarem assim que descobri o que havia de errado, mas me disseram que não tem garantia. Se quiser conserto, tem que esperar por alguém que queira fazê-lo. Mas quem? Parece que ninguém mais tem esse problema. Repito pro meu coração inúmeras vezes: "descansa, coração, descansa... amar não é pra você", mas ele não obedece, afinal, não seria agora que ele começaria a acatar minhas ordens. Ama desgovernado e não tem nada que o impeça quando ele realmente quer. Vai no compasso da dança que lhe convir - ou não -, e não escuta mais ninguém, só seu próprio som.

Fecho os olhos para deixar de pensar um pouco em ti e mesmo assim, só te vejo. Meu coração bate com teu som, e mesmo que eu não queira, cada palavra minha tem uma ponta tua. Cansei de tentar te evitar... Não me cures mais de você, só volta e fica ao lado meu. Recuperaremos o que foi perdido, dentro de nós só haverá primavera...


Quando voltares, meu bem, não haverá mais hora... O tempo esperará por nós, para guardar nosso momento, como se fosse uma caixa de lembranças.

Inserida por alinemariz

Sabe... eu sempre tive medo mesmo é de que tudo acabasse em mentira. E esse medo ainda prevalece por dentro de mim. Eu tenho medo de que tudo seja moldado na mentira. Eu tenho medo de que os sentimentos verdadeiros acabem. Eu tenho medo, principalmente, de ficar sem acreditar em nada, do que de acreditar em tudo. Não suporto meios-termos. Ou é quente ou é frio... o morno não tem graça. Ou ama ou não ama... ninguém ama pela metade. Ou é ou não é... porque ninguém existe em pedaços soltos – só os corações que se partem... mas que acabam se juntando no final. Não, eu não concordo com esse mundo. Na verdade, esse mundo me assusta. As pessoas, as baratas, as opiniões... tudo me deixa assustada. Com medo, talvez. O medo, novamente. O medo só serve mesmo é pra fazer a dor crescer, pra apagar a vida e e acabar com o amor. O medo é uma brecha que se faz grande... Sou música, fotografia, palavra, sentimento e vida. Sou mais uma. De Chico a Chico, de Clarice a Manuel... sou eu. Vou sendo, vou levando... vou amando. E principalmente, vou acreditando. Pois é... Apesar dos pesares, eu ainda acredito que tudo ainda vai caber num belo ‘happy end’ e com direito a beijo final.

Inserida por alinemariz

Meus olhos sorriem mais do que minha própria boca, e quando prendo o riso, meu corpo ri sozinho. Talvez nem eu me entenda. Nem ninguém. Talvez o que eu escreva seja um monte de palavras pintadas de sonhos junto com um monte de sentimento e vontade; afinal, é o que sou, é do que estou cheia, e é o que levo pra perto de quem amo.

Sabe, acho que a gente idealiza demais o amor... É tudo tão difícil de acontecer, de existir e de ser, realmente. Eu já cansei de pedir pra que chegasse um amor daqueles de cinema pra mim... Cansei de implorar, de esperar. Deixa pra lá, né? Daqui a pouco vai estar chegando um, novo em folha... Dizem por aí que o amor é imprevisível, mas eu sei prever quando ele pode chegar.

Ele chega quando a gente menos espera.

Inserida por alinemariz

Meus olhos sorriem mais do que minha própria boca, e quando prendo o riso, meu corpo ri sozinho.

Inserida por alinemariz

Mania


Eu até que podia tentar dizer o que acho, mas não vou, não. Não tenho tempo para perder tentando colocar em palavras algo que só poderia ser explicado com gestos. Uma conversa de olhares, quem sabe... Mas como? Você sumiu, desbotou junto com a cor da nossa foto. Eu podia até tentar dizer com palavras como você chegou e ficou, mas não vou. Hoje eu não preciso tomar minha dose de você; não preciso me lembrar disso, nem de nada... Hoje eu não quero lembrar que sinto saudade.

É tudo tão complicado quando eu tento explicar... Eu não vou explicar, não. Eu só sei que tenho saudade, é isso. Saudade de quando você falou comigo pela primeira vez, me olhou nos olhos e sorriu. Era tudo tão simples, sem explicação... As coisas só aconteciam, sem precisar de um porquê.

Nós não precisávamos de palavras: não havia nada que seus olhos dissessem que os meus não pudessem entender. Acho que desaprendi a me explicar daí... É mais fácil se acostumar a só sentir e a falar de um jeito inventado.

Seria tão bom - e estranho, admito - se nada disso tivesse acontecido. Nem você, nem esse seu sorriso, nem nossos gestos, nem o perfume quente e doce que você deixou em mim. Esse perfume que me acompanha desde o dia em que te vi e você falou comigo pela primeira vez; você me olhou nos olhos e sorriu. Porque tudo tinha que ser tão complicado? Essas coisas tem mania de ir e voltar nas minhas lembranças... Elas bem que podiam ficar paradas, guardadas lá no fundo, pra quando eu te ver, não ficar com o coração pulando de saudade ou o que quer que seja.


Pra que eu fui inventar de lembrar disso tudo? Que mania de amor que esse coração tem.

Inserida por alinemariz

O tanto que eu vou salvar



Então é assim, exatamente como você disse que deveria ser. Aos poucos, vou me esquecendo de como éramos. Esquecendo da brisa, dos conselhos soprados, das mentiras, das fotos, das conversas na madrugada, de você... E de mim. Não acerta tudo, não. Eu ainda queria que sobrasse um pouco de nós pra guardar, nem que seja na minha memória.

Você conseguia me fazer de bobo só colocando aquele seu sorriso torto no rosto, me tinha aos seus pés, era tudo tão fácil. Eu me deixei levar, como nunca havia deixado antes... Esqueci a razão, permiti que meu coração me guiasse dessa vez. Bobagem. Eu até diria que fui ingênuo ao entregar meu coração a ele mesmo, para que se entregasse a você. Mas eu não fui. Cada parte de tempo preenchida entre nós teve um sentido, um sim, um não, um talvez, umas respostas e alguns quiproquós... Cada pedaço de mim estava felizmente cheio de você. É uma pena que você estivesse certa sobre toda aquela história dos amores serem imprevisíveis, e acabarem quando bem quiser, levando tudo o que se passa junto.

Aos poucos, vou te perdendo no tempo; é como se você fosse uma foto velha, perdendo a cor com o passar dos dias e lembranças. Espero que o tempo não te leve pra tão longe de mim... Ainda estou resolvendo o tanto que eu vou salvar das nossas conversas sem pressa ou dos beijos sem mais nem menos. Não vá tão longe, ainda te quero por perto de vez em quando. Você pode mudar seu nome pra nostalgia, eu não vou ligar, não... Só fica por aí. Aparece de vez em quando.

Não vai embora, não. Eu não consigo tirar os olhos de você assim, tão fácil.


Não some, não. Ainda não sei o que tanto quero gravar de você.

Inserida por alinemariz

Em tempo


Meus olhos batem nos teus; te encontro. Pra quê? Você sorri, ativa o descompasso do meu coração. Disfarço. Ou pelo menos acho que estou disfarçando essa minha cara de bobo sempre que te vejo. Eu tenho que disfarçar, não importa... Não posso deixar nada transparecer assim, como realmente é. Qualquer deslize, e tudo aparece.

Prefiro que continue assim, com essas mentiras pra mim mesmo. Prefiro que continue desse jeito - relativamente - quieto pro meu coração. Prefiro só te olhar de longe, sem você perceber, e pensar como seríamos se tivéssemos uma chance de fazer dar certo... De te conquistar, de te ter assim, toda pra mim.


Me escondo, mas sei que não posso fazer muita coisa... Num dia desses, o amor me acha de vez.

Inserida por alinemariz

Largados ao vento


Mil pedaços de mim
Vagam por aí
Soltos
Jogados
E inquietos

Mil pedaços de mim
Gritam, desesperados
Esquecidos num canto qualquer


Mil pedaços de mim
Que falam
E não dizem nada


Mil pedaços de mim
Esperam, agoniados
Por algo que queira juntá-los

Mil pedaços de mim
Espalhados
Guardados numa caixa
A qual deram o nome de coração

Inserida por alinemariz

Discrepância do destino


Discutiam. Falavam sobre qualquer coisa sem grande importância, e acabaram numa dessas brigas idiotas, por motivo nenhum; daquelas que se esquecem com um beijo de desculpas. Brigaram, sem mais enrolações, por nada.

João saiu, puto com a vida, com o tempo, com ele mesmo. Foi pra casa de um amigo, onde rolava uma festa. Eram 3h da manhã, e nem sinal de Filipa. Nenhuma mensagem, nenhuma ligação. Conheceu uma Maria-sei-lá-o-quê - ele nem quis saber o nome dela, ou já nem lembrava mais -, e conversaram por mais uma hora e meia ali, encostados no barzinho. Sabe-se lá por qual motivo - vai ver, gostava de gente deprimida -, essa menina beijou João, e ele, sabe menos ainda porque diabos respondeu àquela insensatez. Beijaram-se, então; e agora aquilo era taxado de traição. Na cabeça dele, aquilo não passara de uma loucura sem motivo, talvez só uma maneira de descontar toda a raiva que guardava, um absurdo dar ao ocorrido o nome de traição. Aquilo não era trair, afinal, ele não estava traindo o sentimento de ninguém; nem o dele próprio, nem o de Filipa. Aquilo não podia ser capaz de separá-los. Chegou em casa quando o sol já botava uma cor no céu, e quando deitou-se, seu celular tocou. Era uma mensagem. De Filipa. "Espero não ter te acordado. Me liga amanhã, assim que acordar. Beijo". Depois dessa, nem sequer conseguiu dormir. Virava de um lado para o outro na cama, sem saber o que fazer. Tinha de contar à Filipa, isso não podia ficar guardado pra sempre em silêncio, não dava. Esperou o dia correr mais um pouco. Tomou coragem e mandou outra mensagem, onde dizia "Acordou não. Mais tarde nos falamos. Tenho algo pra te contar. Beijo". Acabou cochilando.


...


Depois que João saiu, Filipa só conseguia chorar. De raiva. Morria de raiva por uma briguinha idiota daquelas ter dado nisso, tinha raiva dela mesma, raiva de ser tão orgulhosa. Ligou para suas amigas, e acabaram fazendo uma festinha do pijama. Viram uns três filmes, e quando chegou a vez de ver "Singin' in the Rain", Filipa já chorava de novo, de saudade. Mas era tão orgulhosa, que nem queria saber de dar um sinal de vida pra João. Continuou vendo o filme - ou fingindo que via. Eram 3h da manhã, e nem sinal de João. Nenhuma mensagem, nenhuma ligação. "Eu não quero nem saber! Ele que tá errado, se quiser que me procure. Vou ver esses filmes idiotas, que é o melhor que eu faço!"- Falou pra si mesma, jurando que enganava alguém. Suas amigas viam o desespero nos olhos de Filipa, como se ela estivesse prestes a desabar. Não importava se eles tinham brigado à tarde e era só a madrugada do outro dia; o que importava era o sentimento deles, separado por qualquer coisa sem importância. Acabava "Singin' in the Rain" exatamente quando os pássaros começaram a anunciar o novo dia. Filipa deixou seu orgulho de lado. Tomou coragem e mandou uma mensagem pra João. "Espero não ter te acordado. Me liga amanhã, assim que acordar. Beijo". Ficou nervosa, não sabia como ele estava, nem nada. Rolou de um lado pro outro na cama, sem sono, angustiada. O dia se arrastou mais um pouquinho, e ela cochilou. Acordou com uma mensagem. Era João, que respondendo, dizia: "Acordou não. Mais tarde nos falamos. Tenho algo pra te contar. Beijo". Depois dessa, não tinha remédio, não tinha sono e não tinha lágrima que conseguisse segurar a ansiedade de Filipa.




O dia se arrastava lentamente, cada segundo contando como um minuto.

Inserida por alinemariz

Dentro de você


Dizem por aí que o amor é imprevisível. Bem, eu não acho que seja lá muito verdade, afinal, eu sei quando é que ele chega em nossas vidas: quando a gente menos espera. Imprevisível foi você, que apareceu sem mais nem menos na minha frente, num desses dias cinzas - no céu e dentro de mim -, transparecendo mil e um jeitos. Eu sabia que você era estranho. Deve ter sido por isso que comecei a gostar de você; eu gosto de gente doida. Que mais eu pude fazer? Só te olhar, te ver sorrir, ouvir suas histórias... Deixar encantar-me por você.

O tempo passou tão rápido pra nós: voou, correu, pulou os dias. Dizemos muito, mas tudo parece ser tão pouco. És de uma vasta alma, cheia de segredos e lugares nunca alcançados.

Me aproximo bem devagar, de close em close, que é pra você nem sentir. Você diz que te conheço pouco, que você muda muito, que nunca ninguém vai conseguir te entender por inteiro... Mas você esquece que tão mutável quanto você é, eu também sou. É bom que seja assim, bem lentamente. Eu sei que inda consigo me encaixar em você, lá dentro mesmo, bem escondida, e quando você notar... Bem, aí eu já terei me gravado em você, como uma tatuagem, que nunca mais e de jeito nenhum poderá sair. Porque é que você tem que lutar tanto? Seria tão mais fácil se me deixasse entrar, se já deixasse a porta ou até mesmo a janela aberta... Só me deixa te mimar, assim, sem pressa... Eu sei que um dia vou ter que deixá-lo ir.

Mesmo quando eu tiver que ir, não se esqueça do que me ouviu dizer... Sentimentos só mudam de um para outro, nunca mudam a si próprios. Amor não muda, principalmente o nosso; e esse sim, será igual por muito tempo. O quanto me importei e o que eu senti, será permanentemente equalizado na voz do meu coração...

Calmamente, um lírio virá a florescer em você a cada primavera interior. Eu sei que você vai lembrar de mim, do momento em que nos conhecemos naquela floricultura. E assim, talvez você perceba que eu nunca vou deixá-lo ir.

Inserida por alinemariz

O tempo passa quando quer


De um profundo caramelo,
Sempre me prendeu
Como se seus olhos fossem um elo
Meu, só meu

Saudade é como uma onda
Tem hora pra ir
E pra voltar
Não importa se é mar
Ou um simples coração
Impregnado com gotas de ilusão

Saudade bate e volta
Às vezes forte
Às vezes fraca
Depende da maré
Em que se resolve mergulhar

Meu coração mergulhou
E se afogou
No caramelo
Que cantava em teus olhos

Me perdi
E não quis
E não consegui me encontrar
Naquele turbilhão de coisas que giravam dentro do meu mar

Meu coração tornou-se um barco
À deriva, perdido nalgum esconderijo meu

Inevitavelmente,
Agora só depende de esperar
O tempo
Que o tempo demora pra curar
E esquecer
O dia em que eu me afoguei em você

Querer



Me deixa pintar a vida como eu quiser! Cansei de tantos dias cinzas dentro de mim. Eu quero pintar minha alma de todas as cores; quero libertar o meu pássaro azul, sem medo… Eu quero ter a vida na sua forma mais crua e sincera que se pode ter. Quero me jogar nesse mundo, abrir o coração pro vento, deixar o tempo levar consigo o que quiser de mim. Quero que você me invada, me explore e conheça todos os cantos que existem no meu interior. Quero saber falar como quem grita o que sente, como quem escolhe e inventa as melhores palavras para se expressar. Quero levar comigo toda a alegria que puder, mas quero que exista um pouco de tristeza também... Ninguém aprende só com felicidade. Quero o óbvio, o intocado, o distante e a mesmice de todos os dias. Quero sentir todas as saudades: a de quem está ao seu lado, a de quem está em outro canto do país, a de uma época, a de um amor, a de uma voz, a de uma música, a de um livro, a de um sábado à tarde, a dos cheiros... Quero tanto que nem sei mais o tanto que quero. Quero desaprender a medir os sentimentos; quero aprender a ser mais de mim, cada vez mais. Quero sentir e tocar essa vida com a palma da minha mão. Quero que minha vida seja vasta; tão imensa que não se possa pegar com uma mão - nem duas -, mas que caiba inteira na minha memória, como uma doce lembrança de dezembro. Quero que tudo que vivi, vivo e viverei seja como um souvenir, um presente mesmo, escrito e feito por mim, de um jeito indecifrável para os que não têm dentro de si a magia de ver através do comum. Quero minha vida dentro de um sonho. Não um sonho impossível, mas um sonho daqueles que a gente realiza, que só é preciso vontade e enxergar além de um horizonte distante. Quero o tudo, o nada e mais um pouco... Posso parecer gananciosa, mas não sou não. Só sei que quero poder espremer e tirar o sumo dessa vida, fazer com que ela seja deliciosa, sem amargar no final. Eu só quero poder viver. Viver, no sentido mais amplo da palavra, da forma mais intensa e despreocupada que se possa imaginar.


Quero viver o mundo que floresce em mim todos os dias, com todas as borboletas que eu tiver direito!

(E quero que você venha comigo).

Inserida por alinemariz

Agora dei pra me fazer lembrar todo santo dia que meu coração não aguenta mais toda essa invenção de amar - ou não deveria. Colei atrás da porta um post-it que tem assim:



"Meu amor,
Você não se cansa dessa vida, não? Dá um tempo pra esse teu coração... O coitado já está cansado de tanto amar."



Leio e releio todos os dias, mas isso é que nem regra: coração nenhum obedece.

Inserida por alinemariz

Pra te lembrar

Daqui eu consigo ouvir
O som que vem lá de fora:
É o céu que muda de cor
De acordo com a música que toca
No meu interior

É a música que eu fiz pra você
Mas você não precisa saber
Ela não é sua, nem nunca foi
Não fala de nós, muito menos sobre os dois
Não chama teu nome nas entrelinhas
Nem pede pra você voltar
É só mais uma canção
Que toca ao som do coração
Num ritmo (des)ritmado
E num balanço desengonçado

É só mais uma canção
Dessas que não têm razão
Dessas que se parecem com você,
Aparecendo sem nenhum por que
Só pra me fazer arder
E até pensar em morrer
De amor
De tanto amor
Que nascia em mim
Assim como o sol nascia
E pintava aquele dia
Com as cores dos seus olhos

Você me prendeu aqui
Do lado de dentro de mim
Com amor pra todo lado
E desde então escrevo
Essa música que agora toca
E pinta o céu lá fora
Com as mesmas cores
Do dia que se perdeu na minha memória

Essa música que agora toca
Eu que fiz pra você
Mas ela não é sua, não
Muito menos possui alguma razão
Não fala do dia que insistiu em nascer
Nem sequer fala do quanto eu quis você

Essa música nada mais é
Do que uma tentativa de te resgatar
De te apanhar lá do fundo da memória
Pra relembrar a história
Do dia em que tudo desapareceu,
E o sol nasceu pra brilhar no mar
Só pra nos ver morrer de amor...

Relembrar o dia
Em que nada mais poderia existir
Só nós dois,
que ficaríamos ali, para sempre intactos,
sendo um só.

Inserida por alinemariz

Voltando no final de mais uma canção

Filipa saiu de lá com um vazio. Ela não sabia do que se tratava, mas aquilo doía. Doía dentro. Dentro do nada, dentro do vazio. Como é que um nada podia doer? Até onde ela sabia, coisas que não se tocam não podem doer. Mas doía, o nada doía, e pronto. Talvez não fosse nada. Talvez fosse o coração dela. O velho, bobo, inconstante e fácil coração de sempre; aquele que agora estava machucado, sem saber o que realmente queria. Chovia. Parecia que o tempo queria levá-la para outro lugar, para alguns meses atrás... Talvez o tempo quisesse ajudá-la a decidir como é que as coisas ficariam: se o relógio esquecido na casa de João ficaria por lá mesmo ou se todo o amor deles merecia algo melhor. Talvez ainda existissem muitos "e se" no meio do caminho, mas quem sabe isso não acabaria com um daqueles abraços sem fim?

Como que um jeito de fazê-la pensar, a chuva trazia aquilo que ela tentava não lembrar num momento de raiva desses. A cada gota que pousava em sua pele, Filipa se lembrava de tudo que já passou ao lado de João: o começo, algumas brigas, uma carta dele, a foto que mais gostava, a música que ele fez, as pétalas da primeira flor que ele deu pra ela e que permaneciam coladas na agenda. Depois vinha a briga mais estúpida que tiveram e o seu resultado. Ela odiava lembrar disso. Dava dor de cabeça. Devia ser o coração subindo aos ouvidos e gritando que sentia falta. E como sentia.

Dois dias se passaram arrastando e talvez Filipa nem se importasse mais com o que João havia feito. Ela só tinha medo de que pudesse acontecer de novo ou de que ele não gostasse mais dela tanto quanto dizia. Resolveu que não ia mais ficar sentada na varanda olhando pro céu e lembrando das cores que viveu com João - cada momento junto deles remetia à uma cor diferente, ou várias, ou era tão inconstante e mutante quanto um brilho furta-cor. Decidiu que dali iria sair, e sair atrás dele, como uma criança que procura por seu brinquedo favorito. "Dois dias se passaram! Dois dias pularam no tempo enquanto fiquei aqui! Pensei demais. Tá na hora de deixar meu coração agir, como sempre foi". Saiu de casa correndo com a mente, andando num passo ainda mais apressado, com o coração embrulhado na sua mão. Filipa acompanhava o passo do mundo.

...

Acordou com um daqueles barulhinhos chatos do celular quando se recebe uma mensagem. Era de Filipa. "João, tô chegando aí... Desce. Beijo." Olhou pro relógio, eram 11h da manhã. Num pulo, saiu da cama e foi se arrumar. Contrariando seu jeito de sempre, João demorou. Demorou no banho, demorou pra se aprontar. Ele não conseguia pensar. Sentia. Sentia medo. Sentia o frio na barriga, como se fosse a primeira vez que via Filipa. Sentia o amor bater forte. Sentia seu coração batucar tambores como era no princípio. Desceu e esperou ela chegar.

...


Filipa chegou. Estava no portão, quando viu João. Olharam-se de longe. Ambos correram por dentro, ansiosos pelo o que estava por vir. Acho que os dois sabiam o que aconteceria ali; era óbvio. Filipa quebrou o silêncio.


- Pulando todo o blá-blá-blá, me diga logo de uma vez: você ainda gosta de mim? Digo, você ainda me ama, como tantas vezes já disse e diz?

- Filipa, quando você foi embora daqui naquele dia, eu senti meu coração correr atrás de você naquele seu passo apressado. Me peguei pensando nesses dois dias em como eu amo tudo o que é seu. Sabe, amo até aquilo que possa ser feio, estranho ou sei lá o quê. Eu amo como você fica vermelha quando te faço ficar com vergonha, amo seu jeito pulante de andar, seu jeito de se vestir, seu jeito meio louco de se posicionar sobre alguns assuntos, seu sinal perto da boca, seu beijo pulsante e carinhoso. Acho que o amor é assim, só amar e pronto. O amor deve ser um estado de não saber. A gente não sabe de nada quando ama, a gente não sabe definir o que é que sentimos. Ninguém sabe. Só o que se sabe é que se ama. E é isso. Se amar for sentir afeto por cada pedaço seu, então eu te amo. E acho que esses dois dias só me fizeram pensar mais nisso. Eu senti a sua falta. Talvez sentir falta ajude a pensar melhor. Eu até pensei em como você conseguiu me atingir. Ninguém nunca chegou onde você está hoje. Você está no lugar mais alto de mim. Eu sempre me protegi, nunca quis que ninguém chegasse lá, sempre tive medo. E agora tenho. Tenho medo de te perder, de fechar esse lugar de novo... É tão bom quando alguém chega e fica, sabe? Eu só quero você. Quero que você fique, cada vez mais. Quero que você perdure aqui dentro.

- "Eu não nego, eu me entrego... Você é meu grande amor e hoje eu vou te dizer 'Eu te amo'. Eu imploro, eu te adoro. Você tem meu coração a bater pra você mais uma canção!". Lembra?



Deram um daqueles beijos pulsantes e urgentes, clamando pelo sentimento que quase se perdeu. E aquilo seria eterno, como um abraço que fazem os corações se encostarem. Dali em diante, só o tempo os acompanharia, se roendo de inveja daquele amor.

Inserida por alinemariz

Só por uma vez, um fim



Eu queria conseguir só por uma vez, ao menos, parar todos os meus pensamentos. É que às vezes cansa tentar tantas vezes e não conseguir pôr um fim nisso tudo. Queria ter dentro de mim para sempre a paz que me invade quando paro pra olhar o rio e sinto o vento batendo no meu rosto. O problema é que essa calmaria nunca fica; ela é rápida, dá o gosto e corre para o outro lado. Minha cabeça vai à mil, não para em momento algum, sempre tem uma coisa para ser pensada, para ser remoída, para bater numa mesma tecla, para mudar meu humor. Seria tão mais fácil se a gente não complicasse qualquer coisa que vem a nossa frente. Porque é que a gente tem que lidar com seres humanos? Todos eles são fadados a errar e errar e errar constantemente. Eu, ele, você. Todos nós erramos e erraremos muito daqui pra o final disso que chamamos de vida. Eu sei, você sabe, mas todos nós continuamos fingindo não saber de nada. E pra quê? Pra culpar um ao outro quando algo dá errado, quando algo sai da reta que traçamos para andar. Esquecemos que nada é linear. O tempo passa, o mundo dá voltas e acabamos parando no mesmo lugar, andando por linhas tortas - e ainda achando que elas são lineares - e entrelinhas mal entendidas por aqueles que nunca entendem a magia que cabe num momento de loucura e silêncio. Talvez a vida seja só essa loucura que a gente vive a cada segundo, milésimo e instante, e juntando tudo isso que a gente passa, quem sabe a gente não acha um final feliz depois? Ainda tem tanta pedra, caminho e chão pra gente andar. São infinitos pensamentos que correm na minha mente, são milhares de sentimentos a correr por minhas veias, são saudades a escorrer por meus olhos, são risadas vermelhas, são sorrisos vindos do coração, são batidas de carnaval e samba dentro de mim, são noites e mais noites arrumando um jeito de disfarçar o que qualquer um pode ver olhando para mim. É tanta coisa junta, tanta mistura, tantos “eus” dentro de mim mesma… É tanta correria pra achar uma saída, que é por isso que minha cabeça vai à mil sem parar. Tá tudo bem, tudo sempre estará. Acabará melhor quando num dia desses, pode ser qualquer dia mesmo, me apareça alguém que pense em compartilhar dessas mesmas loucuras, magias e silêncios da vida. Talvez seja aí que todo esse infinito torne-se finito ou dê uma pausa pra minha alegria estar em foco. É aí que o carnaval que vive dentro de mim sairá pela avenida, sentindo-se completo. Deve ser num desses momentos em que se sente por completo toda a essência de ser e estar. Deve ser aí o final feliz com direito a beijo de fim.

The love you take is equal to the love you make


Andava sempre no mesmo passo apressado, como se isso fosse um jeito de correr para onde queria ir e de parar o tempo, como se existisse alguma maneira disso acontecer. Mesmo com toda essa pressa, ela observava atentamente o que estava ao seu redor, embora as coisas parecessem um pouco borradas, ela sempre reparava em tudo. Apesar de detestar rotina, destino e quaisquer outras coisas que fossem planejadas demais, ela sempre fazia o mesmo caminho na hora do almoço: saía voando do trabalho direto para a sua lanchonete preferida, uma no estilo dos anos 60 onde a qualquer momento tocava Beatles. Toda vez que voltava para o trabalho ela desejava parar o tempo só para poder andar mais devagar, pra não ter que ficar vendo nada borrado e pra poder ouvir o restinho de música que ficara na sua cabeça, mas nunca atendiam o seu pedido e ela acabava indo-se embora quase que correndo mesmo, como quem tem asas nos pés e vendo tudo passar rápido demais. Rotina pra ela era como uma espécie de regra, que existe para limitar as pessoas, e ela detestava ser limitada pelos outros; mas por incrível que pareça, ela não se incomodava nem um pouco com essa rotina de trabalho/lanchonete-que-toca-beatles/trabalho, talvez por ter sido ela a criadora do costume ou só porque sabia que um dia enjoaria de estar fazendo tudo sempre igual. Por hora, ela não se cansava de pegar o mesmo caminho nem de sempre brincar com as listras do chão, talvez se cansasse do trabalho vez ou outra, por estar cansada mesmo ou só por querer chegar a casa e deitar a cabeça no travesseiro pra poder sonhar com o amor que sempre quis ter, mas enquanto não enjoava, ia fazendo igual sem importar com a chegada do dia em que ela cansaria. A vida dela estava assim mesmo, repetitiva, cheia de correria e sonhos deixados de lado e ela mesma sabia que aquilo ia logo mudar, porque o destino é metido demais pra querer deixar alguma coisa acontecer por vontade dos outros.

E não deu outra: cansou-se. Num outro dia acordou cedo, botou Little Joy pra tocar enquanto comia, tomou banho, colocou um vestido simples e quando já estava fechando a porta para ir trabalhar, deu bom dia para o sol. Trabalhou num ritmo tão apressado quanto seu passo e resolveu que só iria almoçar duas horas depois do que estava acostumada. Passou-se o tempo e ela foi para a velha lanchonete-que-toca-beatles por um caminho diferente e andou mais devagar, olhando para as novas coisas que encontrava no caminho de um jeito encantado e calmo. Foi nesse olhar mais calmo e menos borrado que ela percebeu um cara que estava sentado na mesa ao lado da sua, com dois amigos que provavelmente deveriam ser apenas colegas de trabalho. Esse cara parecia estar sozinho, sua mente estava nalgum lugar totalmente distante daquela mesa onde seus colegas conversavam alguma coisa sobre futebol e mulher. De repente, ele começa a se mexer como se estivesse dançando "All my loving". A primeira impressão que se tem é que aquilo era, no mínimo, estranho, afinal, um cara que não está nem aí para nada e olha para o vento não deve ser alguém normal... Ou não deveria. Mas era na cabeça da garota do começo da história. E é aqui que tudo muda, quando ela se atreve a dizer:

- Ei! É impressão minha ou você está dançando essa música que tá tocando? Hahaha.

Ele olha pra ela com uma cara de "mas quem diabos é você para estar falando de mim?", mas, mesmo assim, responde rindo:

- Dançando, dançando, eu não estou, afinal, só estou sentado tentando fazer um balanço. Hahahaha. Mas peraí, não tem como ficar parado numa música dessas! É boa demais... Eles são geniais!

- Ah, eles são indescritíveis! Muito bom mesmo. Mas enfim... Deixa eu começar de novo: Oi, Meu nome é Luísa! E o seu? Hahaha.

- Oi, Luísa! Meu nome é Gabriel. Hahahahaha.

E continuaram conversando até acabar a hora do almoço e cada um ter que voltar para o seu trabalho. Não deu para falarem muito nem para se conhecerem bem demais, mas qualquer um que tivesse visto os olhos deles enquanto falavam de uma afinidade ou outra, veria que dali poderia nascer bem mais do que uma amizade baseada nas coisas em comum. Trocaram telefones e ambos voltaram correndo com o velho passo apressado, mas dessa vez apressados para que o tempo passasse logo e alguém resolvesse ligar.

O primeiro a fazer alguma coisa foi Gabriel. Assim que saiu do trabalho, mandou uma mensagem: " 'Something in the way, she knows... And all I have to do is think of her' - Beatles cai sempre muito bem, né? Vai fazer alguma coisa hoje? A gente bem que podia continuar nossa conversa mais tarde... Beijo." E quase que na mesma hora - talvez só estivesse esperando ou na dúvida se fazia algo ou não -, Luísa respondeu, mais ou menos assim: " 'Something' é uma das minhas músicas preferidas, acertasse em cheio! Hahaha. Gosta de sushi? Tem um aqui na minha rua que é uma delícia! Beijo."

Gabriel nem era muito fã de sushi, mas acabou dizendo que adorava e três horas depois lá estavam eles no tal sushi-que-é-uma-delícia, com ele enrolando ela, conversando mais do que comia e inventando papo até onde não tinha, só para que Luísa não percebesse. Ela fingia que não percebia, mas a essa altura já tinha notado até a cor da meia que ele usava. Conversa vai, conversa vem, acabaram ficando por lá até não ter quase ninguém e eles se darem conta que se não fossem embora, seriam sendo chutados dali.

Ele foi deixar Luísa em casa, afinal, já eram pra lá das 2h30 da manhã e ele não iria deixá-la ir andando para casa. Chegando lá, Luísa convidou-o para entrar e depois de um certo blá-blá-blá sobre incomodar ou não, ele acabou entrando. Conversaram distraidamente por cerca de uma hora e meia, quando ele olhou para o seu relógio e viu que já passavam das 4h da manhã.

- Eita! Já são 4h15, Luísa. Vou nessa. Tá na hora, né? Hahaha.

- Vai não, menino. Fica aí! A gente ainda tem tanta coisa pra conversar, não acha não?

- Acho. Eu não queria ir agora, mas é que tá ficando tarde demais. - E foi aí que ele cantarolou: - "I don't want leave her now..."

E ela acompanhou:

- "...You know I believe and how". Usar essa música é pedir pra ficar! Hahaha. Fica mais, vai?

- Fico.



E ficou não só até amanhecer, mas ficou por muito tempo na vida dela. E fica. E ainda continua lá.

Inserida por alinemariz