Adson Guedes
Curto tua inocência refletida nesse olhar, mas mal posso esperar pelo dia em que teu demônio interior se libertará, despejando verdades que me consumirão.
Conheces a temível lenda da Yara?
Onde pescadores sucumbem ao encanto,
levados por uma sereia nativa,
afogados na sedução do desconhecido
tuas pernas me prendem feito serpentes nas águas escuras,
agarrado aos teus cabelos macios, o ondulante curso da cor do rio,
sou arrastado pela correnteza traiçoeira
para a profundidade dos teus olhos
amanheço extinto,
submerso em teus seios
tu és a sereia que assombra meus poemas mais profundos.
Se todos fossem brutalmente honestos uns com os outros, estaríamos imersos num mar de tragédias silenciosas, onde palavras afiadas seriam as únicas ferramentas de interação.
As ilusões são nossas defesas, resguardando-nos da insanidade, estimulando até o mais sábio dos idiotas.
Tu és amazônida até a alma, teus relevos como serras que ocultam o sol ao romper do dia, teus olhos, negros como o rio, teus cabelos longos, contos que seduzem. Teu maior pecado ? Ter surgido em terras distantes, como uma lembrança esquecida.
Olhos refletindo o rio, corrente profunda
Tu és Manaus, cabelos, pele morena
ardente, perigosa, nas noites tempestuosas
Há quem te ame, há quem te odeie apaixonadamente.
Em um dia qualquer despertei, o rosto cansado, um fio de prata coroava meus cabelos. Uma parte de mim, história enrugada. Brinquei em demasia nas ruas, com crianças, corações, em terras longínquas. Agora, reúno os fragmentos, carregando os fardos do passado em meu peito, transformando a agonia em arte, buscando inspiração em risos e rios.
A menina do mercadinho da esquina, com o sorriso de desafio.
Cada vez que a vejo, me perco nos traços do seu rosto e dos fios de seus cabelos, minha mente se desnuda e corre por outras sinuosidades.
É como uma explosão íntima, apenas com o encontro de olhares.
O poder do intelecto é que você pode estar robusto, frágil, na miséria ou na riqueza e ainda assim será sempre intrigante.
Caminho sobre a ponte da travessia final mirando a selva amazônica, observo sorrisos desesperados e pálidos, diante desse espetáculo.
Nenhum paraíso resplandece quando enfermidades corroem as raízes internas.
No pulsar das noites de sábado.
Ela imaginava o luxo do melhor restaurante da capital,
mas nos encontramos em um simples boteco
Compartilhando histórias íntimas na extensão da noite.
" Não és minha, amor. És livre!
caso prefiras ficar, vamos embriagar-nos de vida, falar bobagens sem fim, escancarar o riso e que se dane o mundo."
Lábios de mel de terras estrangeiras
Tu chicoteias meu rosto com teus cabelos longos sedosos.
nessa nação em ruínas, eu te resgataria, e juntos, mergulharíamos na tempestade do meu Brasil
nossas angústias entrelaçadas na cama, no cotidiano
Seriam eternizadas em páginas rabiscadas de desespero,
por mãos calejadas de ansiedade.
Conheço tua alma, não és santa, minha musa. Navegamos nesse mar de libertinagem, cobiçados e solitários. Encanta-me com teus artifícios de sereia e vamos mergulhar juntos; uma saga de dois canalhas irresistíveis.
Não é talento, são tragos de café, com aroma enfeitiçante, entrelaçados nos cachos ondulantes e sedutores dessas águas.
Nessas voltas e reviravoltas, pisando sobre tábuas rangentes, eu me acostumei com a exuberância dessas plantas; as vitórias-régias são lendas que acendem meu juízo.
Tudo que é majestoso e rústico, carrega em suas curvas os elementos poéticos essenciais para a inspiração e a construção de uma obra-prima.
Eu anseio por ti, breves instantes fugidios
Por um minuto enlouquecedor,
Por um segundo arrebatador,
Por uma noite em chamas
Por um dia de entrega completa,
Por uma semana em êxtase
Por um ano de fervor incandescente,
Por uma década avassaladora
Quero-te
Ignorando o ponteiro que avança.
E eu me fascinava por aquelas marquinhas de biquíni,
pareciam dois rios que corriam lado a lado sem se misturar.
Ela me mandava fotos suadas e cruas,
cada imagem um soco na alma,
eu, desejando a arte como válvula de escape,
em toda sua plenitude,
compor melodias, dar vida às telas,
mas não sou Mozart, nem Da Vinci
no fim, só me restam estas palavras banais e pesadas.
Vagueio pelos relevos dos contornos da mãe natureza
com sua floresta devastada
desolada
eu beijo cada pedaço desta terra inundada
O fogo voraz que a consome é
intenso.
Não acenda meu instinto
com teu perfume
nem adoce meus pecados
com teus beijos
não seduza minha boca
com teus seios
nem fortaleça minha mão
em teus cabelos
Às vezes, o não é um convite sutil.
Parabéns, rapaziada, pela marca
dos trinta anos, três décadas de trajetória.
As canções de rádio do velho boteco ganham significado agora.