Poemas curtos de Clarice Lispector
Viver tem dessas coisas: de vez em quando se fica a zero. E tudo isso é por enquanto. Enquanto se vive.
Escrever pensando em leitor é bobagem. Leitor não existe.
Tão poderosa que imaginava ter escolhido os caminhos antes de neles penetrar – e apenas com o pensamento.
A gente não cria os filhos para a gente, nós os criamos para eles mesmos.
Voar alto e selvagemente para soltar as minhas grandes asas. Até agora parece-me que eu não voei grande.
Eu agora sei pensar em nada. Foi uma conquista. Não pensar significa o contato inexprimível com o Nada.
Só depois que você morrer é que vou te amar totalmente. Preciso de toda a tua vida para que eu a ame como se fosse minha.
Em tudo, em tudo você terá a seu favor o corpo. O corpo está sempre ao lado da gente. É o único que, até o fim, não nos abandona.
Mas é que o erro das pessoas inteligentes é tão mais grave: elas têm os argumentos que provam.
Mas se nós, que somos os reis da natureza, não havemos de ter medo, quem há de ter?
Pense que ninguém é uma fortaleza, que nós todos somos apenas humanos e nos ajudamos, pense que não existe uma só pessoa no mundo que não tenha pelo menos uma vez (é pouco uma vez, muito mais vezes) necessidade inclusive de chorar.
Acontece que sou tão ávida da vida, tanto quero dela e aproveito-a tanto e tudo é tanto – que me torno imoral. Isso mesmo: sou imoral.
Além do vento há uma outra coisa que sopra.
Como conseguirei saber do que nem ao menos sei?
Nunca nasci, nunca vivi: mas eu me lembro, e a lembrança é em carne viva.
Não podia me dar ao luxo de pedir, lembrei-me de todas as vezes em que, por ter tido a doçura de pedir, não me deram.
Ah, mas se por um instante eu entender que a fúria é contra os meus erros e não contra os dos outros, então esta cólera se transformará nas minhas mãos em flores, em flores, em coisas leves, em amor.