Poemas curtos de Clarice Lispector

Bom, agora eu morri. Mas vamos ver se eu renasço de novo. Por enquanto eu estou morta. Estou falando do meu túmulo.

Clarice Lispector

Nota: Trecho de entrevista concedida ao repórter Júlio Lerner, na TV Cultura, em 1977.

No fundo a gente não está querendo alterar as coisas, está querendo desabrochar de um modo ou de outro, né?

Clarice Lispector

Nota: Trecho de entrevista com Júlio Lerner para a TV Cultura, em 1977.

Minha alma tem o peso da luz. Tem o peso da música. (...) Tem o peso de um olhar. Pesa como pesa uma ausência. E a lágrima que não se chorou. Tem o imaterial peso da solidão no meio de outros.

Clarice Lispector
Gotlib, Nádia B. Clarice: uma vida que se conta. São Paulo: Ática, 1995.

Nota: Último bilhete escrito no hospital da Lagoa, no Rio de Janeiro, em 7 de dezembro de 1977.

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Inútil querer me classificar: eu simplesmente escapulo não deixando, gênero não me pega mais. Estou em um estado muito novo e verdadeiro, curioso de si mesmo, tão atraente e pessoal a ponto de não poder pintá-lo ou escrevê-lo. Parece com momentos que tive contigo, quando te amava, além dos quais não pude ir pois fui ao fundo dos momentos.

Clarice Lispector
Água viva. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

E, se você me achar esquisita, respeite também. Até eu fui obrigada a me respeitar.

Clarice Lispector
A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trecho da crônica Ao Linotipista.

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Mas sentimentos são água de um instante. Em breve – como a mesma água já é outra quando o sol a deixa muito leve, e já outra quando se enerva tentando morder uma pedra, e outra ainda no pé que mergulha.

Clarice Lispector
A legião estrangeira. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trecho do conto A legião estrangeira.

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Meu Deus, me dê a coragem de viver trezentos e sessenta e cinco dias e noites, todos vazios de Tua presença. (...) Faça com que a solidão não me destrua. Faça com que minha solidão me sirva de companhia. Faça com que eu tenha a coragem de me enfrentar. Faça com que eu saiba ficar com o nada e mesmo assim me sentir como se estivesse plena de tudo.

Clarice Lispector
Um sopro de vida. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

Nota: Trecho adaptado de Link

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Minha vida é um grande desastre. É um desencontro cruel, é uma casa vazia. Mas tem um cachorro dentro latindo. E eu – só me resta latir para Deus. Vou voltar para mim mesma. É lá que eu encontro uma menina morta sem pecúlio.

Clarice Lispector
Um sopro de vida. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

O dia corre lá fora à toa e há abismos de silêncio em mim. A sombra de minha alma é o corpo. (...) Sou feliz na hora errada. Infeliz quando todos dançam.

Clarice Lispector
Um sopro de vida. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

Escrever é o mesmo processo do ato de sonhar: vão-se formando imagens, cores, atos, e sobretudo uma atmosfera de sonho que parece uma cor e não uma palavra.

Clarice Lispector
Um sopro de vida. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

Eu tenho tanto medo de ser eu.

Clarice Lispector
Um sopro de vida. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

Muito elogio é como botar água demais na flor. Ela apodrece.

Clarice Lispector
Gotlib, Nádia B. Clarice: uma vida que se conta. São Paulo: Ática, 1995.

Nota: Trecho de entrevista com Ziraldo, em 1974.

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Escrevo com o corpo. E o que escrevo é uma névoa úmida.

Clarice Lispector
A hora da estrela. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

Que minha solidão me sirva de companhia, que eu tenha a coragem de me enfrentar.

Clarice Lispector

Nota: Adaptação de trecho do livro "Um sopro de vida".

O dia corre lá fora à toa e há abismos de silêncio em mim.

Clarice Lispector
Um sopro de vida. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

Mas não havia nela miséria humana. É que tinha em si mesma uma certa flor fresca. Pois, por estranho que pareça, ela acreditava. Era apenas fina matéria orgânica. Existia. Só isto. E eu? De mim só se sabe que respiro.

Clarice Lispector
A hora da estrela. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

Cuidado com suas preocupações, dizem que dá ferida no estômago.

Clarice Lispector
A hora da estrela. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

E falo bem baixo para que os ouvidos sejam obrigados a ficar atentos e a me ouvir.

Clarice Lispector
Água viva. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 1998.

Acho que sábado é a rosa da semana; sábado de tarde a casa é feita de cortinas ao vento, e alguém
despeja um balde de água no terraço: sábado ao vento é a rosa da semana. Sábado de manhã é
quintal, uma abelha esvoaça, e o vento (...)

Clarice Lispector
A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trecho da crônica Sábado.

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No meio do meu silêncio e do silêncio da rosa, havia o meu desejo de possuí-la como uma coisa só minha. Eu queria poder pegar nela. Queria cheirá-la até sentir a vista escura de tanta tonteira de perfume. (...) Até chegar à rosa foi um século de coração batendo. (...)
O que é que fazia eu com a rosa? Fazia isso: ela era minha.

Clarice Lispector
Felicidade clandestina. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 1998.

Nota: Trecho do conto Cem anos de perdão.

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