Poemas curtos de Clarice Lispector
Sou uma árvore que arde com duro prazer. Só uma doçura me possui: a conivência com o mundo.
Um homem me disse que no Talmude falam de coisas que a gente não pode contar a muitos, há outras a poucos, e outras a ninguém. Acrescento: não quero contar nem a mim mesma certas coisas. Sinto que sei de umas verdades. Mas não sei se as entenderia mentalmente. E preciso amadurecer um pouco mais para me achegar a essas verdades.
É preciso coragem para me aventurar numa tentativa de concretização do que sinto. É como se eu tivesse uma moeda e não soubesse em que país ela vale.
Adiar o momento em que terei que começar a dizer, sabendo que nada mais me resta a dizer. Estou adiando o meu silêncio.
Nunhum gesto meu era indicativo de que eu, com os lábios secos pela sede, ia existir.
O olhar psicológico me impacientava e me impacienta, é um instrumento, é um instrumento que só transpassa.
Se soubesses da solidão desses meus primeiros passos. Não se parecia com a solidão de uma pessoa. Era como se eu já tivesse morrido e desse sozinha os primeiros passos em outra vida. E era como se a essa solidão chamassem de glória, e também eu sabia que era uma glória e tremia toda nessa glória divina primária que, não só eu não compreendia, como profundamente não a queria.
A pior descoberta foi a de que o mundo não é humano, e de que não somos humanos.
É que as coisas simplesmente não eram do seu lado. Pensou uma bobagem: até sua pequena cara era de lado. Em esquina. Nem pensava se era bonita ou feia. Ela era óbvia.
Engoli com alguma dor meu orgulho que sempre fora feroz, e aceitei humilde o que o destino me dava de esmola.
Definir a eternidade como uma quantidade maior que o tempo e maior mesmo do que o tempo que a mente humana pode suportar em ideia também não permitiria, ainda assim, alcançar sua duração. Sua qualidade era exatamente não ter quantidade, não ser mensurável e divisível porque tudo o que se podia medir e dividir tinha um princípio e um fim.
Mesmo sofrer era bom porque enquanto o mais baixo sofrimento se desenrolava também se existia.
A vida humana é mais complexa: resume-se na busca do prazer, no seu temor, e sobretudo na insatisfação dos intervalos. [...] Toda ânsia é busca de prazer. Todo remorso, piedade, bondade, é o seu temor. Todo o desespero e as buscas de outros caminhos são a insatisfação.
Aviso: não confundir bobos com burros.
Nota: Trecho da crônica Das vantagens de ser bobo.
...MaisCaótica, intensa, inteiramente fora da realidade da vida.
Que alívio. Felicidade, meu bem, é alívio.
Vida não tem adjetivo. É uma mistura em cadinho estranho mas que me dá em última análise, em respirar. E às vezes arfar. E às vezes mal poder respirar. É. Mas às vezes há também o profundo hausto de ar que até atinge o fino frio do espírito, preso ao corpo por enquanto.
Se reflito demais, deixo de agir.