Poemas curtos de Clarice Lispector
E naquele momento evitava precisamente a solidão que seria uma bebida forte demais.
Agora eu conheço esse grande susto de estar viva, tendo como único amparo exatamente o desamparo de estar viva. De estar viva – senti – terei que fazer o meu motivo e tema. Com delicada curiosidade, atenta à fome e à própria atenção, passei então a comer delicadamente viva os pedaços de pão.
Talvez eu agora soubesse que eu mesma jamais estaria à altura da vida, mas que minha vida estava à altura da vida. Eu não alcançaria jamais a minha raiz, mas minha raiz existia.
Me mato? Não. Vivo como bruta resposta. Estou aí para quem me quiser.
Eu tenho uma aparente liberdade mas estou presa dentro de mim.
Só porque é difícil compreender e amar o que é espontâneo e franciscano. Entender o difícil não é vantagem, mas amar o que é fácil é uma grande subida na escala humana.
Não sei o que fazer da aterradora liberdade que pode me destruir. Mas enquanto eu estava presa, estava contente? ou havia, e havia, aquela coisa sonsa e inquieta em minha feliz rotina de prisioneira?
Esperar que algo amadureça é uma experiência sem par: como na criação artística em que se conta com o vagaroso trabalho do inconsciente.
Sou cheio de muito amor e é isso o que certamente me dá uma grandeza.
Quero captar o meu é. E canto aleluia para o ar assim como faz o pássaro. E meu canto é de ninguém. Mas não há paixão sofrida em dor e amor a que não se siga uma aleluia.
Porque a melhor frase, sempre ainda a mais jovem, era: a bondade me dá ânsias de vomitar. A bondade era morna e leve, cheirava a carne crua guardada há muito tempo. Sem apodrecer inteiramente apesar de tudo. Refrescavam-na de quando em quando, botavam um pouco de tempero, o suficiente para conservá-la um pedaço de carne morna e quieta.
A respiração contínua do mundo é aquilo que ouvimos e chamamos de silêncio.
Mas a nostalgia do presente. O aprendizado da paciência, o juramento da espera. Do qual talvez não soubesse jamais se livrar.
Perdi alguma coisa que me era essencial, e que já não me é mais.
Quem não tiver medo de ficar alegre e experimentar uma só vez sequer a alegria doida e profunda terá o melhor de nossa verdade.
Minha coragem foi a de um sonâmbulo que simplesmente vai.
Mas vale a pena. Mesmo que doa.
Eu bem que me controlo, mas sou tão sensível.
Escrevo para me livrar da carga difícil de uma pessoa ser ela mesma.