Poemas curtos de Clarice Lispector
Saudade é um pouco como fome. Só passa quando se come a presença.
A pior cegueira é a dos que não sabem que estão cegos.
Ser feliz é uma responsabilidade muito grande. Pouca gente tem coragem.
Em vida, observo muito, sou ativa nas observações, tenho o senso do ridículo, do bom humor, da ironia, e tomo um partido.
O ar tinha gosto de sábado. E de súbito os dois eram raros, a raridade no ar. Eles se sentiam raros, não fazendo parte das mil pessoas que andavam pelas ruas. Os dois às vezes eram coniventes, tinham uma vida secreta porque ninguém os compreenderia. E mesmo porque os raros são perseguidos pelo povo que não tolera a insultante ofensa dos que se diferenciavam.
Todo caso de loucura é que alguma coisa voltou. Os possessos, eles não são possuídos pelo que vem, mas pelo que volta.
Quando estou sozinha procuro não pensar porque tenho medo de de repente pensar uma coisa nova demais para mim mesma.
Como começar pelo início, se as coisas acontecem antes de acontecer?
Não sou pretensiosa. Escrevo para mim, para que eu sinta a minha alma falando e cantando, às vezes chorando...
Nós ainda somos moços, podemos perder algum tempo sem perder a vida inteira.
E eu impávida finjo que não tenho dono. Pontas de cigarro apagadas eu recebo. Um dia vou pegar fogo. De noite fico sozinha no escuro, vazia, pousada num canto do chão. Meu silêncio fede. Ai de mim, que sou o receptáculo da morte das coisas.
As almas fracas como você são facilmente levadas a qualquer loucura com um olhar apenas por almas fortes como a minha.
Perdi o jeito de ser gente. Não sei mais como se é. E uma espécie toda nova da "solidão de não pertencer" começou a me invadir como heras num muro.
Parece que às vezes sou espontânea demais e isso me torna engraçada.
(...) cabelos negros e um vestido azul, de frente à penteadeira, bonita apenas pelo fato de ser mulher...
O esquecimento das coisas é minha válvula de escape. Esqueço muito por necessidade.
Eu sonho acordada, mesmo como uma mocinha de quinze anos. É o que se chama de sonho estéril. Imagino conversas, imagino situações e cenas – pareço nunca ter tido nenhuma experiência.
Não façamos esforços inúteis, pois o amor nasce ou não espontaneamente, mas nunca por força de imposição. Às vezes é inútil esforçar-se demais... nada se consegue; outras vezes, nada damos e o amor se rende a nossos pés. Os sentimentos são sempre uma surpresa. Nunca foram uma caridade mendigada, uma compaixão ou um favor concedido.
Que o Deus me ajude a conseguir o impossível, só o impossível me importa.