Poemas curtos de Clarice Lispector
Não entendo de sonhos. Mas este me parece um profundo desejo de mudança de vida. Não precisa ser feliz sequer. Basta ano novo. E é tão difícil mudar. Às vezes escorre sangue.
Eu vivo à espera de inspiração com uma avidez que não dá descanso. (...) Cheguei mesmo à conclusão de que escrever é a coisa que mais desejo no mundo, mesmo mais que amor.
Eu sou uma chama acesa! E rebrilho e rebrilho toda essa escuridão.
Tenho que ter paciência para não me perder dentro de mim. Vivo me perdendo de vista.
Vou dormir porque não estou suportando este meu mundo de hoje, cheio de coisas inúteis.
Sou feliz na hora errada. Infeliz quando todos dançam. Me disseram que os aleijados se rejubilam assim como me disseram que os cegos se alegram. É que os infelizes se compensam.
Ah, está se tornando difícil escrever. Porque sinto como ficarei de coração escuro ao constatar que, mesmo me agregando tão pouco à alegria, eu era de tal modo sedenta que um quase nada já me tornava uma menina feliz.
O não sentido das coisas me faz ter um sorriso de complacência. De certo tudo deve estar sendo o que é.
Estou muito próxima, de um modo geral. É bom e não é bom. É que sinto falta de um silêncio. Eu era silenciosa. E agora me comunico, mesmo sem falar. Mas falta uma coisa. Eu vou tê-la. É uma espécie de liberdade, sem pedir licença a ninguém.
Não estava abatida de chorar. (...) E sua tristeza era um cansaço grande, pesado, sem raiva.
Por enquanto há diálogo contigo. Depois será monólogo. Depois o silêncio. Sei que haverá uma ordem.
Ninguém saberia de que negras raízes se alimenta a liberdade de um homem.
Frases que lhe saíam fáceis e incolores mas que em mim se cravavam, rápidas e agudas, para sempre.
Um domingo de tarde sozinha em casa dobrei-me em dois para a frente – como em dores de parto – e vi que a menina em mim estava morrendo. Nunca esquecerei esse domingo. Para cicatrizar levou dias. E eis-me aqui. Dura, silenciosa e heroica. Sem menina dentro de mim.
É que o mundo de fora também tem o seu “dentro”, daí a pergunta, daí os equívocos. O mundo de fora também é íntimo. Quem o trata com cerimônia e não o mistura a si mesmo, não o vive, e é quem realmente o considera “estranho” e “de fora”. A palavra “dicotomia” é uma das mais secas do dicionário.
E todos os dias ficarei tão alegre que incomodarei os outros, o que pouco me importa, já que eu tantas vezes sou incomodada pela alegria superficial e digestiva dos outros.
O pior é que sou vice-versa e em ziguezague. Sou inconcludente. Mas é preciso me amar como involuntariamente sou. Apenas me responsabilizo pelo que há de voluntário em mim e que é muito pouco.
Às vezes no amor ilícito está toda a pureza do corpo e alma, não abençoado por um padre, mas abençoado pelo próprio amor.