Versos de Clarice Lispector
A minha vida a mais verdadeira é irreconhecível, extremamente interior, e não há uma palavra que a signifique.
Se tenho que ser um objeto, que seja um objeto que grita.
Mas o pior é o súbito cansaço de tudo. Parece uma fartura, parece que já se teve tudo e que não se quer mais nada.
Está fazendo um dia lindo de outono. A praia estava cheia de um vento bom, de uma liberdade. E eu estava só. E naqueles momentos não precisava de ninguém. Preciso aprender a não precisar de ninguém. É difícil, porque preciso repartir com alguém o que sinto. O mar estava calmo. Eu também. Mas à espreita, em suspeita. Como se essa calma não pudesse durar. Algo está sempre por acontecer. O imprevisto me fascina.
Nos piores momentos, lembre-se: quem é capaz de sofrer intensamente também pode ser capaz de intensa alegria.
Não pedi coisas demais para não confundir Deus que à meia-noite de Ano-Novo está tão ocupado.
Eu sou o antes, eu sou o quase, eu sou o nunca. E tudo isso ganhei ao deixar de te amar.
Eu antes era uma mulher que sabia distinguir as coisas quando as via. Mas agora cometi o erro grave de pensar.
(...) quanto a mim mesma, sempre conservei uma aspa à esquerda e outra à direita de mim.
Não tenha medo de meu silêncio... Sou um louco mas guiado dentro de mim por uma espécie de grande sábio...
Tenho medo de escrever. É tão perigoso. Quem tentou, sabe. Perigo de mexer no que está oculto – e o mundo não está à tona, está oculto em suas raízes submersas em profundidades do mar. Para escrever tenho que me colocar no vazio. Neste vazio é que existo intuitivamente. Mas é um vazio terrivelmente perigoso: dele arranco sangue. Sou um escritor que tem medo da cilada das palavras: as palavras que digo escondem outras – quais? talvez as diga. Escrever é uma pedra lançada no poço fundo.
Dessa vez era um amor mais realista e não romântico; era um amor de quem já sofreu por amor.
Vocês não sabem nada de mim. Nunca te disse e nunca te direi quem sou. Eu sou vós mesmos.
Dá-me a tua mão: Vou agora te contar como entrei no inexpressivo que sempre foi a minha busca cega e secreta. De como entrei naquilo que existe entre o número um e o número dois, de como vi a linha de mistério e fogo, e que é linha sub-reptícia. Entre duas notas de música existe uma nota, entre dois fatos existe um fato, entre dois grãos de areia por mais juntos que estejam existe um intervalo de espaço, existe um sentir que é entre o sentir – nos interstícios da matéria primordial está a linha de mistério e fogo que é a respiração do mundo, e a respiração contínua do mundo é aquilo que ouvimos e chamamos de silêncio.
Ah, meu amor, não tenhas medo da carência: ela é o nosso destino maior. O amor é tão mais fatal do que eu havia pensado, o amor é tão inerente quanto a própria carência, e nós somos garantidos por uma necessidade que se renovará continuamente. O amor já está, está sempre. Falta apenas o golpe da graça - que se chama paixão.
Para vermos o azul, olhamos para o céu. A Terra é azul para quem a olha do céu. Azul será uma cor em si, ou uma questão de distância? Ou uma questão de grande nostalgia? O inalcançável é sempre azul.
Eu tenho tanto medo de ser eu. Sou tão perigoso. Me deram um nome e me alienaram de mim.
O que é um espelho? É o único material inventado que é natural. Quem olha um espelho, quem consegue vê-lo sem se ver,quem entende que a sua profundidade consiste em ele ser vazio (...) esse alguém percebeu o seu mistério de coisa.
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