Um Beijo para Ti

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Não confie em qualquer palavra, qualquer sorriso, qualquer beijo, qualquer abraço, qualquer olhar. As pessoas fingem, e muito bem.

Eu sou apenas um beijo da boca do luxo na boca do lixo.

Versos Íntimos

Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão – esta pantera –
Foi tua companheira inseparável!

Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.

Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.

Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!

Augusto dos Anjos
ANJOS, A. Eu e Outras Poesias. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998.

Fácil é abraçar, apertar as mãos, beijar de olhos fechados.
Difícil é sentir a energia que é transmitida.
Aquela que toma conta do corpo como uma corrente elétrica quando tocamos a pessoa certa.

Desconhecido

Nota: Trecho do poema "Reverência ao destino".

Seu coração disse pra sua cabeça, vá, e sua cabeça disse pra sua coragem, vou, e sua coragem respondeu, vou nada, mas sua boca não ouviu e beijou.

Adriana Falcão

Nota: Trecho do Livro 'A Máquina'

BEIJAR BEM

Ok: a gente quer encontrar alguém bonito, inteligente e espirituoso, alguém que não seja muito exibido nem vaidoso demais, que tenha um papo cativante e esteja parado na nossa. Mas e se beijar mal? Sem chance. Tem que beijar bem, tanto eles quanto elas.

Quando escuto alguém dizendo que Fulano beija bem e Sicrano beija mal, quase volto a acreditar em histórias da carochinha. Beijo é a sorte de duas bocas entrarem em comunhão. Pode um Rafael beijar uma Ana e ser uma explosão vulcânica, e o mesmo Rafael beijar uma Cristina e ser um encontro labial de dar sono. Pessoas não beijam bem ou mal: casais se beijam bem ou mal. Há sempre dois envolvidos.

A definição de um beijo bom é que pode ser questionável, mas quem está no meio do entrevero quase sempre reconhece o ósculo sublime.

Beijo bom é beijo decidido, mesmo que a decisão seja levá-lo devagar ao longe.

Beijo bom é beijo molhado, em que os beijadores doam tudo o que há para doar na cavidade bucal, sem assepsia, entrega absoluta.

Beijo bom é beijo sem pressa, que não foi condenado pelos ponteiros do relógio, que se perde em labirintos escuros já que, é bom lembrar, estamos de olhos fechados.

Beijo bom é beijo que você não consegue interromper nem que quisesse.

Beijo bom é beijo que não permite que seu pensamento tome forma e voe para outro lugar.

E, por fim, beijo bom é o beijo que está sendo dado na pessoa por quem você é completamente apaixonada.

Existe beijo ruim? Existe. Beijo sem alma, beijo educado demais, beijo cheio de cuidados, beijo curto, beijo seco. Mas uma coisa é certa: precisa dois para torná-lo frio ou torná-lo quente. Todo mundo pode beijar bem, basta nossa boca encontrar com quem.

Martha Medeiros
Crônica "Beijar bem", 2002.

Nota: Texto originalmente publicado na coluna de Martha Medeiros, no website Almas Gêmeas, a 25 de março de 2002.

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Reconstituição


Tive de repente
saudade da bebida que eu estava bebendo...
tive saudade e tentei me lembrar que gosto faltava,
qual era a bebida...
Fui procurando entre copos e móveis
e dei com sua boca.

A saudade era dela
A bebida era o beijo.

Assim como tem gente que para vencer o alcoolismo evita dar o primeiro gole, algumas pessoas precisam aprender a evitar o primeiro beijo para não reincidir num amor que faz mal à saúde.

Martha Medeiros

Nota: Trecho de Link

Estas alegrias violentas têm fins violentos
Falecendo no triunfo, como fogo e pólvora
Que num beijo se consomem.

William Shakespeare
Romeu e Julieta

Se o teu beijo doesse e torturasse,
transmitisse um veneno e uma doença,
inoculasse o germe da descrença
e destruísse a fé que não renasce!

Se o teu beijo ferisse e condenasse,
fosse um pecado, um crime e uma sentença;
se eu te beijasse e, numa angústia imensa,
fosse ficando negro de uma face!

Se o teu beijo deixasse ferida
e meus lábios sangrassem toda a vida
e eu tombasse murchando sobre o pó...

Tu serias o horror de toda a gente!
Mas eu te ampararia docemente
e pediria, em troca, um beijo, um só!

Já não se encantarão os meus olhos nos teus olhos,
já não se adoçará junto a ti a minha dor.

Mas para onde vá levarei o teu olhar
e para onde caminhes levarás a minha dor.

Fui teu, foste minha. O que mais? Juntos fizemos
uma curva na rota por onde o amor passou.

Fui teu, foste minha. Tu serás daquele que te ame,
daquele que corte na tua chácara o que semeei eu.

Vou-me embora. Estou triste: mas sempre estou triste.
Venho dos teus braços. Não sei para onde vou.

...Do teu coração me diz adeus uma criança.
E eu lhe digo adeus.

Pablo Neruda
Presente de um poeta

Existe gente que precisa da ausência para querer a presença. O ser humano não é absoluto. Ele titubeia, tem dúvidas e medos, mas se a pessoa REALMENTE gostar, ela volta. Nada de drama.

Arnaldo Jabor

Nota: Trecho do texto "Relacionamentos" com autoria atribuída a Arnaldo Jabor.

Canção de Outono

Perdoa-me, folha seca,
não posso cuidar de ti.
Vim para amar neste mundo,
e até do amor me perdi.
De que serviu tecer flores
pelas areias do chão
se havia gente dormindo
sobre o próprio coração?

E não pude levantá-la!
Choro pelo que não fiz.
E pela minha fraqueza
é que sou triste e infeliz.
Perdoa-me, folha seca!
Meus olhos sem força estão
velando e rogando aqueles
que não se levantarão...

Tu és folha de outono
voante pelo jardim.
Deixo-te a minha saudade
- a melhor parte de mim.
E vou por este caminho,
certa de que tudo é vão.
Que tudo é menos que o vento,
menos que as folhas do chão...

Cecília Meireles
Poesia completa: Volume 2. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2001.

No meio do caminho

No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra.

Nunca me esquecerei desse acontecimento
na vida de minhas retinas tão fatigadas.
Nunca me esquecerei que no meio do caminho
tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
no meio do caminho tinha uma pedra

Carlos Drummond de Andrade
"Uma pedra no meio do caminho". Rio de Janeiro: Editora do Autor, 1967.

É assim que te quero, amor,
assim, amor, é que eu gosto de ti,
tal como te vestes
e como arranjas
os cabelos e como
a tua boca sorri,
ágil como a água
da fonte sobre as pedras puras,
é assim que te quero, amada,
Ao pão não peço que me ensine,
mas antes que não me falte
em cada dia que passa.
Da luz nada sei, nem donde
vem nem para onde vai,
apenas quero que a luz alumie,
e também não peço à noite explicações,
espero-a e envolve-me,
e assim tu pão e luz
e sombra és.
Chegastes à minha vida
com o que trazias,
feita
de luz e pão e sombra, eu te esperava,
e é assim que preciso de ti,
assim que te amo,
e os que amanhã quiserem ouvir
o que não lhes direi, que o leiam aqui
e retrocedam hoje porque é cedo
para tais argumentos.
Amanhã dar-lhes-emos apenas
uma folha da árvore do nosso amor, uma folha
que há-de cair sobre a terra
como se a tivessem produzido os nosso lábios,
como um beijo caído
das nossas alturas invencíveis
para mostrar o fogo e a ternura
de um amor verdadeiro.

Pablo Neruda
Poemas de amor de Pablo Neruda

Conhece-te a ti mesmo, torna-te consciente de tua ignorância e serás sábio.

À distância

Há quem por ti de longe vela,
Deseja te ver sempre brilhar,
Oferece-te carinho e zela
Por tua felicidade e bem-estar.

Alguém com palavras pincela
O quanto encanta o teu olhar,
Compõe versificada aquarela,
Almeja admiração demonstrar.

Tanta dedicação assim revela
Ser pouco importante o lugar,
Se uma paixão existe e é bela
Até a distância poderá superar.

O amor imaturo diz: eu te amo porque preciso de ti.
O amor maturo diz: eu preciso de ti porque te amo.

Erich Fromm
A arte de amar (1956).

Renova-te.
Renasce em ti mesmo.
Multiplica os teus olhos, para verem mais.
Multiplica-se os teus braços para semeares tudo.
Destrói os olhos que tiverem visto.
Cria outros, para as visões novas.
Destrói os braços que tiverem semeado,
Para se esquecerem de colher.
Sê sempre o mesmo.
Sempre outro. Mas sempre alto.
Sempre longe.
E dentro de tudo.

Cecília Meireles
Cânticos. São Paulo: Moderna, 1981.

Nota: Cântico XIII.

...Mais

Amei-te e por te amar
Só a ti eu não via...
Eras o céu e o mar,
Eras a noite e o dia...
Só quando te perdi
É que eu te conheci...

Quando te tinha diante
Do meu olhar submerso
Não eras minha amante...
Eras o Universo...
Agora que te não tenho,
És só do teu tamanho.

Estavas-me longe na alma,
Por isso eu não te via...
Presença em mim tão calma,
Que eu a não sentia.
Só quando meu ser te perdeu
Vi que não eras eu.

Não sei o que eras. Creio
Que o meu modo de olhar,
Meu sentir meu anseio
Meu jeito de pensar...
Eras minha alma, fora
Do Lugar e da Hora...

Hoje eu busco-te e choro
Por te poder achar
Não sequer te memoro
Como te tive a amar...
Nem foste um sonho meu...
Porque te choro eu?

Não sei... Perdi-te, e és hoje
Real no [...] real...
Como a hora que foge,
Foges e tudo é igual
A si-próprio e é tão triste
O que vejo que existe.

Em que és [...] fictício,
Em que tempo parado
Foste o (...) cilício
Que quando em fé fechado
Não sentia e hoje sinto
Que acordo e não me minto...

[...] tuas mãos, contudo,
Sinto nas minhas mãos,
Nosso olhar fixo e mudo
Quantos momentos vãos
Pra além de nós viveu
Nem nosso, teu ou meu...

Quantas vezes sentimos
Alma nosso contacto
Quantas vezes seguimos
Pelo caminho abstrato
Que vai entre alma e alma...
Horas de inquieta calma!

E hoje pergunto em mim
Quem foi que amei, beijei
Com quem perdi o fim
Aos sonhos que sonhei...
Procuro-te e nem vejo
O meu próprio desejo...

Que foi real em nós?
Que houve em nós de sonho?
De que Nós fomos de que voz
O duplo eco risonho
Que unidade tivemos?
O que foi que perdemos?

Nós não sonhamos. Eras
Real e eu era real.
Tuas mãos - tão sinceras...
Meu gesto - tão leal...
Tu e eu lado a lado...
Isto... e isto acabado...

Como houve em nós amor
E deixou de o haver?
Sei que hoje é vaga dor
O que era então prazer...
Mas não sei que passou
Por nós e acordou...

Amamo-nos deveras?
Amamo-nos ainda?
Se penso vejo que eras
A mesma que és... E finda
Tudo o que foi o amor;
Assim quase sem dor.

Sem dor... Um pasmo vago
De ter havido amar...
Quase que me embriago
De mal poder pensar...
O que mudou e onde?
O que é que em nós se esconde?

Talvez sintas como eu
E não saibas senti-o...
Ser é ser nosso véu
Amar é encobri-o,
Hoje que te deixei
É que sei que te amei...

Somos a nossa bruma...
É pra dentro que vemos...
Caem-nos uma a uma
As compreensões que temos
E ficamos no frio
Do Universo vazio...

Que importa? Se o que foi
Entre nós foi amor,
Se por te amar me dói
Já não te amar, e a dor
Tem um íntimo sentido,
Nada será perdido...

E além de nós, no Agora
Que não nos tem por véus
Viveremos a Hora
Virados para Deus
E n'um (...) mudo
Compreenderemos tudo.

Fernando Pessoa
Pessoa Inédito