Trechos pequenos de Fernando Pessoa

Cerca de 964 pequenos Trechos de Fernando Pessoa

Se te é impossível viver só, nasceste escravo.

Fernando Pessoa

Nota: Trecho do "Livro do Desassossego", de Fernando Pessoa (heterônimo Bernardo Soares).

Evil is everywhere on earth, and one of its forms is happiness.

O mal está por toda a Terra e uma das suas formas é a felicidade.

(Aforismos e afins)

Cada dia me traz com que esperar
O que dia nenhum poderá dar.
Cada dia me cansa da esperança...
Mas viver é esperar e se cansar.

O prometido nunca será dado
Porque no prometer cumpriu-se o fado.
O que se espera, se a esperança é gosto,
Gastou-se no esperá-lo, e está acabado.

Tive grandes ambições e sonhos dilatados – mas esses também os teve o moço de fretes ou a costureira, porque sonhos tem toda a gente: o que nos diferença é a força de conseguir ou o destino de se conseguir conosco.

Há qualquer coisa
de longínquo em mim neste momento.
Estou de facto à varanda da vida,
mas não é bem desta vida.
(...)
Sou todo eu uma vaga saudade,
nem do passado,
nem do futuro:
sou uma saudade do presente,
anônima,
prolixa e incompreendida.

Ah, meu maior amigo, nunca mais
Na paisagem sepulta desta vida
Encontrarei uma alma tão querida
Às coisas que em meu ser são as reais.

Fernando Pessoa
PESSOA, F. Poesias Inéditas (1930-1935). Lisboa: Ática, 1955 (imp. 1990).

"Há um cansaço da inteligência abstrata, e é o mais horroroso dos cansaços. Não pesa como o cansaço do corpo, nem inquieta como o cansaço do conhecimento e da emoção. É um peso da consciência do mundo, um não poder respirar da alma”.

( Bernardo Soares [Semi-heterônimo de Fernando Pessoa]).

Fiz de mim o que não soube
E o que podia fazer de mim não o fiz.
O dominó que vesti era errado.
Conheceram-me logo por quem não era e não desmenti, e perdi-me.
Quando quis tirar a marcará,
Estava pegada à cara.
Quando a tirei e me vi ao espelho,
Já tinha envelhecido.

Fernando Pessoa
Poesias de Álvaro de Campos. Lisboa: Ática, 1944.

Nota: Trecho do poema Tabacaria.

...Mais

Não adianta tirar da mente o que não sai do coração.
Você apaga os momentos, mas as lembranças se mantêm
vivas dentro de você

Falhei em tudo. Como não fiz propósito nenhum, talvez tudo fosse nada.
(Tabacaria)

A vida que se vive é um desentendimento fluido, uma média alegre entre a grandeza que não há e a felicidade que não pode haver.

Árvores, pedras, montes, bailam parados dentro de mim...

Ninguém entende ninguém. Tudo é interstício e acaso, mas está tudo certo.

Fernando Pessoa
Aforismos e afins. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

O homem é um animal que quer existir.

Fernando Pessoa
Aforismos e afins. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

Os psiquiatras sabem (às vezes) como trabalha o espírito doente, mas não como trabalha o espírito são.

Fernando Pessoa
Aforismos e afins. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

Mas como é que eu sei que estou consciente? Estou consciente de que estou consciente? Será isto possível?

Que a consciência da própria inimportância é o acume do conhecimento da vida.

Fernando Pessoa
Aforismos e afins. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

Que homem de gênio não é obcecado por um sentido de missão?

Fernando Pessoa
Aforismos e afins. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

A ação aperfeiçoadora de um amor puro, seja ele por uma mulher ou por um rapaz, é um dos encantos do mundo.

Fernando Pessoa
Aforismos e afins. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.

Eu gosto tanto de ti que tenho vergonha de mim. Há todas as razões boas para eu não gostar de ti, menos a de eu não gostar, porque gosto. É fantástico a gente sentir o que não quer e ter um coração independente.

Fernando Pessoa
Aforismos e afins. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.