Textos grandes

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PARA VÊ-LA FELIZ

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Busco em sua expressão as mais fluentes linhas
de alegria e leveza, um caminhar seguro,
sem o muro de sombras que o mundo institui
para todos os rumos de quem se procura...
Quero tempo e jornada pra lhe ver completa,
ver a luz de su´alma sobre todo o rosto,
folhear em seus olhos uma linda história;
um agosto vencido pela primavera...
Todo sonho tem asas, procure as dos seus,
há um fogo escondido, remova essas cinzas
e verá quantas brasas aguardam seu sopro...
Meu amor não aceita não lhe ver feliz;
é a lei que despacho e tem que ser cumprida;
minha vida se apaga sem a luz da sua...

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MEU FELIZ ANO NOVO

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Muito embora não compartilhe da provável essência do natal, vejo bastante significado no início de mais um ano. Aprecio começos e recomeços; novas chances; reocasiões e repensamentos. Tudo isso deve ocorrer a cada manhã ou toda vez que sentirmos necessidade, mas é algo especial e significativo chegarmos a mais uma etapa de mundo, junto com os seus bilhões de habitantes. Creio muito no pensamento humano e no desejo real um tempo melhor.
A boa vontade do ser humano, que em sua maioria é bom, tem o poder de salvar. É dessa vontade que o mundo sempre dependerá. É graças a ela que ainda não se fez o caos total. Uma vontade com o tempero do amor à vida e ao semelhante, apesar das não semelhanças que nos igualam. Inclusive as não semelhanças de credo, gosto e opinião, que geram conflitos entre os homens e as mulheres de má vontade que julgam o outro, por se julgarem especiais e imunes aos males e às fraquezas inerentes a todos.
Que a nova chance alcançada nos leve à reflexão sobre o que realmente vale a pena. Talvez seja tempo de conhecermos valores maiores do que dinheiro, status e fama. Tempo de termos tempo para quem amamos e para nós mesmos. Uma nova era, em que nos doarmos mais aos nossos filhos tenha mais poder do que dar coisas conquistadas com ausências provindas do excesso de trabalho. Novos tempos, em que a presença fale mais alto que o presente.
É este o feliz ano novo que o meu coração consegue desejar a todos. Eis a grande conquista que a humanidade ainda não valoriza: o amor que aproxima. Que não espera troco nem recompensa. Que põe as pessoas acima de suas posses ou não posses. De seus nomes e sobrenomes. Aparências, feitos e resultados. Credos, etnias, cores, escolhas e orientações. Isto sim é igualdade.

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SOBRE SER FELIZ

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Ser feliz é uma questão de ser. Ser, de fato, e ponto final. Não é crochê, ponto cruz nem cestaria. Muito menos desempenho, agonia, escavação afetiva nem show de comportamento.
É algo sem preço. Vem de graça e nasce feito. Já pertence a quem é, por natureza e vocação. Passa pelo desencanto, a frustração e o ranger dos dentes, mas passa. Dá seu jeito e se perpetua. Jamais se rende ás passagens. Às transições.
As alegrias que vemos comumente quase nunca são espelhos da real expressão do ser feliz. Muitas podem ser simplesmente aparelhos; próteses; mecanismos da essência.
Igualmente, a tristeza facial quase nunca depõe com fidelidade sobre a natureza íntima de quem chora. Ser feliz não é o que paira, pousa e faz turismo em nós. É o que mora.

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SANGUE FRIO

Demétrio Sena, Magé - RJ.

De repente o vazio que me toma;
uma grande lacuna sobre o nada
que já teve uma essência, uma coluna,
mas não foi de fumaça; foi de amores...
Quero ter meus sentidos novamente;
coração que não caiba no meu peito;
minha mente repleta em fantasias
e um leito pra mais do que dormir...
Sem amar e também sem ser amado,
sou leão acuado; nau sem mar;
ter pra dar, e pra ter, faz tanta falta...
De repente o repente que me acorda
com a corda no pulso que nem pulsa,
pois o tempo esfriou meu sangue quente...

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SAUDADE PERDIDA

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Quando amei quem pensava que tu eras,
fui feliz pela minha ingenuidade;
tive a doce verdade sonhadora
que pertence aos romances naturais...
Ao amar uma farsa fiz meu mito;
uma história que sempre quis viver;
pude ser um amante legendário
na medida ideal da fantasia...
Pelas águas de minha ficção,
fui bem fundo e pesquei as emoções
que me deram razão de prosseguir...
A pessoa que amei em quem não és,
já não pousa na tua identidade;
não encontro saudade pra sentir...

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AMIZADE PLATÔNICA

Demétrio Sena, Magé – RJ.

Foram anos de olhares tão só meus,
de carinho isolado, sem resposta,
uma cumplicidade no vazio
de quem gosta e não gosta; só se deixa...
Fui amigo platônico, distante,
mesmo próximo, pleno de presença;
tive afetos restantes dos descuidos
ou de surtos da tua solidão...
Sob as perdas, os danos que sofri,
rabisquei as versões de realidade
que não vi, mas vivi de não viver...
Minha mente seguiu meu coração
sob o vão das imagens afetivas,
e teus nãos me nutriram de silêncios...

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NO CÉU DO ME CONCEITO

Demétrio Sena, Magé - RJ.


Quando criança, tive grande admiração pelos adultos trabalhadores que eu conheci. Era fã do sorveteiro, por exemplo. Aquela roupa branquinha - pelo menos nas primeiras horas do dia -, que lhe dava enorme respeitabilidade, não era simplesmente uniforme. Não para mim. Era uma espécie de farda. Também olhava com espanto e admiração, os operários metidos em seus macacões, rumo ao trabalho nas indústrias ou na construção civil. Nesse tempo, queria ser qualquer uma dessas figuras, quando crescesse: sorveteiro, amolador de ferramentas, operário, motorista ou "gringo". Gringo, para mim, era vendedor de roupas e outros itens ou bugigangas, por causa do senhor português que vendia de porta em porta, e assim o chamavam, naturalmente por sua nacionalidade.
Se não desse para ser nada disso, tudo bem; eu me conformaria em ser arquiteto, médico, cientista, empresário, advogado, escritor, oficial do exército, músico e até professor. Acabei escritor e professor, o que mais tarde escolhi, não porque passei a desprezar as preferências da infância, mas porque descobri no meu íntimo essas vocações, que também dão pouco dinheiro, no meu caso, mas me causam muito prazer, além do enorme orgulho... o mesmo que teria, se fosse qualquer profissional bem resolvido, por amar a profissão e ter consciência de que o trabalho é motivo de orgulho.
Nestes tempos em que a mídia só louva os ricos, famosos, poderosos e influentes, apontando-os como os únicos bem sucedidos, por causa dos grandes resultados materiais que ostentam, às vezes creio que permaneci criança. O mesmo menino que ambicionava profissões bem simples e rudimentares, reconhecendo nelas uma dignidade que hoje não vejo reconhecida nos olhos de quase ninguém. Às vezes, nem mesmo nos de quem as exerce, por ser influenciado negativamente pela visão corporativa dos meios de comunicação.
Tenho, evidentemente, meus ícones culturais e artísticos. Amo a literatura e sou fã de alguns escritores. Aprecio artes plásticas, música, filmes, novelas, outras manifestações culturais, e isso me faz admirar quem as pratica. Também admiro cientistas, desportistas, arquitetos, advogados, empresários, médicos, conferencistas, porém não mais nem menos do que aqueles trabalhadores que sempre foram meus ídolos. Continuo tendo grande admiração pelo sorveteiro, o operário, o amolador de ferramentas, o motorista, o "gringo" e todos os outros cidadãos que, só por serem trabalhadores, honestos, e saberem viver dignamente com o que ganham, são bem sucedidos... e por essa virtude, são estrelas no céu do meu conceito.

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ALEGRIA DE PROFESSOR

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Meu querido ex-aluno; é com satisfação e grande orgulho que o reencontro e constato que você se formou um homem digno. De bem. Admiro grandemente sua desenvoltura e a simpatia no atendimento a tantas pessoas diferentes. De culturas, condições econômicas diversas e temperamentos opostos. Venho sempre aqui, por se tratar de um espaço gastronômico democrático, ao alcance até mesmo de um simples professor como eu. Você deve ser novo nesta casa, pois é a primeira vez que me atende.
A propósito, sabe quem vi um mês atrás? Marcele; a menina endiabrada e linda que adorava beijar os meninos da classe para provocar ciúmes em todos eles; lembra? Ela também está ótima; bem sucedida como você. Trabalha honestamente. Creio que se tornou comissária de bordo. Quem não encontro faz muitos anos é o Tião Azulão, aquele menino tímido que a turma toda zoava por causa do cacoete com os olhos, mas tive notícias suas que me deixaram feliz como estou agora: ele comprou um terreno de bom tamanho, na roça, depois de receber uma ótima indenização por processo movido contra uma empresa em que trabalhou. Nesse terreno, Tião arregaçou as mangas e fez uma bela plantação de coqueiros. Fornece cocos para vários quiosques em uma praia do Rio.
Bem; agora preciso ir. Foi realmente um prazer encontrá-lo. É sempre ótimo ter boas notícias de meus ex-alunos. Saber que seguiram suas vidas com dignidade, não importa em que profissões. Com muito ou pouco estudo, muita gente se perde pela vida e julga ter sucesso, tão somente por ganhar muito dinheiro com o que faz, mesmo levando a sociedade ao caos. É o caso dos traficantes, agiotas, milicianos, sequestradores, políticos e similares. Ainda bem que vocês, ao invés disso, têm coragem para trabalhar.

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VAIDADE HUMANA

É a mania de grandeza que nos torna pequenos e fúteis para reconhecer a real grandeza dos pequenos gestos. Das palavras discretas. Das profissões humildes. Dos pequenos passeios. Dos momentos e os espetáculos menos espetaculares. Pelo nosso apego extremado à ostentação e às impressões do todo, somos pobres dos detalhes que nos enriquecem a partir da essência.

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IRMÃOS, GRAÇA E LEI

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Tenho a imensa felicidade de ter vários irmãos, e cada um deles com as características plenas de um irmão. Pessoas de quem posso abusar de vez em quando, e que sabem que também podem abusar de mim, de vez em quando. Isso não quer dizer que não abusamos sempre um do outro, e que não há uma confusão ou outra, quando excedemos o de vez em quando. Mas as confusões logo acabam sem que ninguém humilhe ninguém por questões de superioridade, obrigação ou direito. Nada de hierarquia, porque entre irmãos não há hierarquia.
É exatamente nas confusões (que logo acabam) que vejo o grande encanto de ter vários irmãos e saber que entre nós não valem aquelas regras rígidas da sociedade que nos cerca, em nome da legalidade que muitas vezes é cruel, mesmo sendo legalidade. irmãos precisam saber que podem abusar um do outro; podem ser sem vergonha e descarados entre si, alheios à velha história do sob pena de... ou do tal de limite que tudo tem que ter.
Já existe à nossa volta um mundo cheio de pessoas que massacram e cobram virtudes além da realidade; reivindicam direitos e impõem deveres, quase sempre na medida exata de seus egos, conveniências, ambições pessoais e comandos. Uma sociedade que estabelece guetos pela hierarquia por posses, força física ou intelectual, preferências, admirações e simpatias. Se a família, ou mais especificamente os irmãos copiarem a sociedade externa para colar no seu meio, deixará de ser família. Deixarão de ser irmãos.
Irmãos não podem viver na lei... irmãos de sangue têm que viver na graça... ou a relação se torna uma desgraça.

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AMIZADES EROTIZADAS

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Amizades entre gêneros opostos têm sempre um quê de sensualidade. É um quê que na maioria das vezes não avança, porque a natureza da relação já se arraigou tanto, a ponto de não caber outro contexto. Se o contexto de amizade for violado, logo depois não haverá mais nada. Amizade, amor nem paixão. Talvez rancor, pela consciência da perda causada com a troca de relacionamento. Às vezes, pela forçação infrutífera de um dos lados. Isto equivale a dizer que amizade é eterna. Relação amorosa, especificamente, não. Por isso, trocar aquela por esta pode ser o que chamam comprar gato por lebre.
Mas algumas relações desta natureza crescem tanto e ficam tão profundas, mesmo não se tornando paixão nem amor, considerando o sentido específico da palavra, que não dá para mantê-las, cruamente, no exato nível das grandes amizades. Tampouco para transformá-las em romances. Quando isso ocorre, a única saída é deixar a natureza cumprir o seu papel improvisador, e não fugir da erotização do laço. Inicia-se, nesse patamar, o que há tempos classifico de amizade erotizada. Muito mais do que íntimas, as amizades erotizadas têm o poder de preservar o que já existe, sem que nenhum sentimento seja confundido nem haja traição, considerando que, na maioria das vezes, ambos ou pelo menos um dos lados já vive uma relação especificamente amorosa. Um compromisso.
Nas amizades erotizadas, a fantasia é permitida em palavras afetuosas, gestos e afagos um pouco mais apimentados e até exposições incomuns; porém, sem a relação sexual; o beijo apaixonado; o compromisso e o sentimento de posse que posteriormente poriam tudo a perder com cismas, cobranças, ciúmes, e o rompimento definitivo. Terminal de sentimentos irremediavelmente negativos.
Por isso nunca transforme em romance uma grande amizade. Quase nunca dá certo. O quase é para não me chamarem de radical. Prefira erotizar o relacionamento, para não correr o risco de perder, de uma vez por todas, uma pessoa especial em sua vida. O romance durável costuma ser aquele que já nasce romance ou se torna paixão, amor futuramente conjugal, sem passar pela grande amizade. Se você conhece casos que deram certo, em definitivo, fora desse contexto, esteja certo: conhece as exceções disponíveis à sua volta.

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A PALAVRA PALAVRA

Demétrio Sena, Magé - RJ.

A grande crise do tempo que atravessamos é de palavra. Em todos os grupos, clãs e camadas sociais a palavra é um artigo banalizado, e por isso, em franca extinção de sentido. Se temos o hábito de apontar os políticos como os únicos não cumpridores da palavra, chegamos ao ponto em que tal afirmação é injusta, pois eles fizeram escola. Todos nós aprendemos a não cumprir compromissos, promessas, juras e acordos... palavra dada, gravada ou escrita. Nem mesmo assinada e com firma reconhecida. Tudo isto, sem falar dos que jogam conversa fora; prometem o que não podem cumprir... arrotam.
Como se vê, não falo apenas dos contextos mais arrojados e grandiosos da palavra, mas também do dia a dia. Os momentos; nuances; detalhes. O “dia desses”, o “qualquer hora”, o “daqui a pouco” e o “peraí”. A palavrinha sem importância para quem dá, mas de grandes expectativas para quem recebe, muitas vezes sem pedir ou fazer cobranças, mas que a partir daí estabelece uma expectativa que pode ser danosa. Com o fenômeno da falência da palavra, o ser humano se descompôs em mentiras, fraudes, dissimulações, apropriações e posses do que não lhe pertence por natureza, direito nem ética.
Ela, que um dia valeu e se bastou por meio de gestos simbólicos e códigos naturais ou instintivos de honra, hoje não tem qualquer valor, mesmo com todos os aparatos de garantia do seu cumprimento. Estamos no tempo em que urge reformularmos os nossos valores e conceitos, pelo bem do próprio mundo, para devolvermos aos cofres arrombados do caráter humano aquele sentido pleno e verdadeiro da palavra palavra.

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FELIZ DIA NOVO

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Desejo a cada ser essencialmente humano, que o dia seguinte seja pleno de alegrias, realizações e novos sonhos a serem realizados. E que o dia seguinte ao seguinte venha mais iluminado ainda, por surpresas inesquecíveis que serão superadas por outros, outros e todos os outros dias.
Nessa fila dos dias cada vez melhores o amor, a paz e a boa vontade natalizem os corações abertos aos bons presságios e sentimentos relevantes. Corações ateus e cristãos, espontâneos e contritos, porém bons. Contraditórios em seus conflitos existenciais, mas perfeitamente perdoáveis pela natureza e pelo próprio possível Criador de tudo. Criador tão supremo e superior, se de fato existe, que para Ele pouco importa ser louvado ou não. Elogiado ou não. Acreditado ou não pelos seres imperfeitos que teria criado, e certamente não os culpa se não for por maldade, má fé, arrogância, egoísmo absoluto, barbáries de qualquer natureza.
Feliz dia novo para os próximos propriamente próximos e também os próximos distantes. Os semelhantes de fato semelhantes; os nem tanto assim; os semelhantes realmente semelhantes. Para os que também me desejam bons dias, me consideram irmãos apesar das possíveis diferenças de cor, nacionalidade, classe social, filosofia e credo. Da mesma forma para os que me julgam, condenam e desejam, intimamente, que minh´alma sofra essas agonias eternas supostamente reservadas aos que não acreditam, exatamente como eles nas mesmas coisas.
Cada dia de vida seja melhor para todos. Até mesmo para os que tentam parecer melhores que todos, e dizem para si próprios, com a intenção de se convencerem, que os outros são os outros.

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MEUS MEDOS

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Sempre tive um medo imenso de ficar grande sem crescer. De amadurecer sem ficar maduro. Curtir a vida, os lances, oportunidades, e não curtir minha essência.
Desde cedo não sabia como era isso, mas o meu coração girava em torno dos medos. Queria o corpo em sintonia plena com o espírito, para que o rótulo correspondesse ao conteúdo. Meu rosto, meu resto e minhas palavras não fossem a propaganda enganosa de quem não sou.
Tinha pavor de brilhar e mesmo assim permanecer no escuro de uma ignorância equivocada, com ares inúteis de sabedoria. Temia puxar um saco de filosofias hipócritas, bondades plásticas e religiosidades vãs, de conveniências e chaves que abririam as portas da sociedade. Da popularidade familiar. Do prestígio ao meu redor e os apupos externos de quem olha e pronto. Não importa ver, porque isso dá prejuízo; afasta os favores e subtrai prestígios com vistas a vantagens futuras.
Tenho muitos; muitos vícios, defeitos e desmandos. Bem maiores do que os que julgo, até condeno em terceiros, mas temia os vícios, defeitos e desmandos menores. De quem vai mas não vai. Finge que não, no entanto é. Finge que sim, porém não. Tudo sempre a depender das perdas e os danos; dos lucros e as cotas... ou até das sobras e as sombras que lhes restem ou não.
Tive medo imenso de aprender a fingir. A simular. Ganhar na estampa e levar a melhor na lábia. Ser quem não sou. Talvez até jamais ser; só estar. Fazer acordo com as rotações do mundo, as demandas da vida e as músicas conforme as quais devo dançar nas horas desconsertantes. Nos momentos em que não vejo saída, se não for pelas concessões.
Jamais deixei os meus medos. Eles me ajudam a ser menos pior do que sou. Não os troco pela coragem sonsa de abrir mão das minhas verdades para supostamente me dar bem.

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FELIZ ANO TODO

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Peço a todos, licença para não gostar, nem mesmo agora, no calor das obrigações do fim de ano, daquela pessoa que o meu coração ainda considera indigna de afeto, respeito e admiração. Verdade não dá trégua. Sinceridade não tira férias. E se de repente me deu aquele desejo de perdoar ou ser perdoado, peço também licença para fazê-lo depois. Bem depois da fragilidade a que somos expostos no fim do ano, por influência das propagandas e as mensagens institucionais específicas destes dias.
Depois, sim. Caso ainda sinta esse desejo de me aproximar ou reaproximar de quem quer que seja, quero fazê-lo despojado; sem emoções obrigatórias e qualquer selo de religiosidade sincera ou hipócrita. Que seja mesmo eu, aquela pessoa prostrada ou ereta confessando as falhas e pedindo perdão ou praticando a grandeza de perdoar; o que é bem mais fácil, porque nos deixa bem "na foto". Seja qual for minha posição, ela só há de ser autêntica ou pelo menos confiável, se o meu caráter não estiver bêbado nem hipnotizado pela ocasião maciça. Mais ainda, se a minha temperança, boa vontade ou repentino amor ao desafeto secular não tiver montado suas bases em conveniências de última hora.
Quem espera qualquer atitude nobre de minha parte, pegue a senha e fique na fila. Detesto correr o risco de fazer firulas ou dar espetáculos ocasionais que a médio prazo poderão perder consistência e gerar interrogações. Tenho, sim, velhos arrependimentos que pretendo expurgar um dia, com pedidos de perdão, porque me sinto mesmo culpado, e até alguns perdões para distribuir, pois algumas pessoas, mesmo poucas, também me devem esse pedido e até já o fizeram. Só falta minha parte. Não sou bom em ser bom. Seja como for, nada será no fim do ano. Nem na páscoa ou no dia do perdão. Muito menos no dia da bandeira.
Quanto aos mais, aqueles que já desfrutam do que há de melhor ou menos pior em mim, quero e deixarei carimbados os meus sinceros desejos de um feliz ano todo e um próspero todo dia. Aos familiares e amigos queridos, a reiteração do amor, o respeito e admiração. Aos desafetos, meu nada. Nem ódio nem amor. Nem isto nem aquilo. Somente o lamento por não sabermos, de ambos os lados, o que estamos eventualmente perdendo, quiçá evitando, com a distância do próximo.

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DAS RELAÇÕES HUMANAS

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Para entrar numa relação, seja de amizade, amor e até trabalho, é preciso que haja um consenso. Que os dois, três ou mais queiram; de preferência, na mesma proporção. E a cada peça desse complicado engenho é permitido até fingir não querer, se for o melhor para quem o faz.
Para sair não é assim. A liberdade ocorre de outra maneira. Deixa de ser coletiva. É pessoal. Cada um sai quando quer; não há nem deve haver consenso. Por isso, ninguém precisa fingir querer até criar uma forma confortável de sair. Nem é justo e decente arquitetar situações para que outro assuma sua desistência. Dramatizar a verdade, pelo simples plano de sair bem... ou sair “por cima”.
Pra dizer a verdade, não há saídas por cima, por baixo nem pelas tangentes. No que tange as relações humanas de qualquer natureza, só existem duas saídas... ou duas portas: uma delas é a da frente... naturalmente, a outra é a dos fundos.

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DOS GRANDES SENTIMENTOS

Demétrio Sena, Magé - RJ.

O que tentamos tornar menos especial depois de muitos anos não tem como voltar à estaca mais ou menos. Só à velha estaca zero. Nunca mais acharemos os rudimentos do passo a passo que chegou ao status de uma vida. Também não existe o muito; muito menos o pouco especial. Especial é o que é; sua intensidade já é a máxima.
Não há como sonhar com a existência do tempo e do espaço em que tudo começou, porque o começo esmaeceu. Nada está no lugar do que um dia se tornou muito além, pois os anos venceram as impressões iniciais de leveza e superficialidade. A boa superficialidade que permite o não compromisso afetivo dos que simplesmente se gostam.
Quem deseja domar a natureza de um grande amor, uma grande amizade ou qualquer outro sentimento que alcançou pro(porções) mágicas e agora teme a magia, não encontra um projeto para o nada. Doravante, não haverá um caminho a desvendar e seguir.
Nenhum córrego se apresenta para essa intenção de amenizar o sentimento extremado e desafiador. Só mesmo a órbita ou a catarata insondável que desata o todo em um ato e o precipita no espaço vago. Na lacuna do que foi para sempre transformado e não há nada que o destransforme.
Creia, de uma vez por todas, que a queda nesse tal nada não pode ser lenta e gradual como foi a subida para o que é. Não há freio nem pausas para quem pretende pular a janela traseira de um grande sentimento.

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SENTIMENTO PREMIADO

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Sempre fui mais feliz do que você, justamente pela ilusão da qual vivi. Tive na inocência o poder de acreditar em mentiras e dissimulações que abracei como verdades incontestáveis. Ainda hoje sou mais feliz, porque posso cultivar as saudades que só eu tenho do que só existiu em meus sentimentos. Quando quero, revisito emoções guardadas em um lugar inacessível para você.
Jamais tive que achar entre mil expressões, maquiagens ou traços de felicidade. Não precisei usar máscaras tecidas por trejeitos, palavras e ações. Efeitos especiais para mostrar, sabe-se lá por que razão, inexistentes desejos; prazeres; vontades. Fui o que sou com quem foi o que não é. Foi tão somente para mim. Nunca para si própria, porque temia o fim do que sequer começou em seu coração.
Meu amor a punia por ser fingida e me premiava pela transparência. Enchia minh´alma de sorriso e vida, com sua conivência equivocada. Foram muitas as flores que lhe dei... que se tornaram espinhos em seus recantos obscuros. Tentei fazê-la feliz, e fui usado... usado e feliz, porque me deixei fluir livremente no folhetim escrito por sua infelicidade natural.

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GENTE FELIZ

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Obrigado por tudo, embora tenha
dado em nada; no vácuo; no deserto;
céu aberto sem fundo nem visão
para nova esperança noutro amor...
Obrigado, inclusive, por não ter
se obrigado a mentir um pouco mais;
por me ver como alguém que merecia
ver a sua real identidade...
Fui feliz porque fui, não fiz de conta
e gostei do licor falsificado,
sendo amado apesar de não ter sido...
Não se culpe da culpa que hoje sente
quando mente outra vez pra não sei quem;
é alguém que porcerto está feliz...

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SOBRESSER

Demétrio Sena, Magé - RJ.

Seja grande ou pequeno, mas inteiro;
é assim que se vive de verdade,
pois nenhuma metade se completa
com a simples metade de outro alguém...
Una o ato à palavra proferida,
tenha sonhos e passos em comum,
ponha vida nas cores propagadas
e carimbe o papel que desempenha...
Não importa o que ditam ao redor
nem a dor pessoal de ser quem é,
será sempre vazio ser quem são...
Tenha fé no caminho e se desbrave,
cave o túnel, depois requeira luz
e não chegue ao final antes do fim...

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