Textos de grandes Pensadores
O nascimento na verdade é a primeira morte interna pois recebemos a lapidação externa, sofremos assim uma cirurgia de natureza psicológica de certa forma "dantesca"...
Acredito que ninguém é livre até jogar fora o veneno da endoculturação...
Nas palavras de Nietzsche deixo-te um conselho: "Torna-te quem tu és"....
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Por um amor vira-latas:
Nunca acreditei muito nessas coisas de pré-destinação escritas e descritas nas estrelas, também nunca acreditei no acaso. Inferno astral ? bobagem ! No entanto, no limiar dos meus 40 anos, tenho sido tomado por pensamentos que cumprem um pouco as previsões e pragas lançadas, há tempos, pelos mais velhos. Dentre esses pensamentos, um tem sido recorrente, se feito presente até em meus sonhos, que é o pensamento de que o mundo se descortinaria e todas as etiquetas, rótulos e pompas da juventude se mostrariam como dispensáveis, inúteis e cansativos e nesse momento sentiria falta daquele beijo envergonhado, dado pela mãe, na porta da escola, daquele cachorro vira-latas que tinha encontrado na rua, sem raça definida e que me esperava sentado na rua, ainda em chão batido, que quando me avistava corria em minha direção e pulava no meu peito, com uma alegria tão generosa, que sem se importar se minha camisa ou meu avental branquinho se sujariam, lambia minha cara e honesta e fraternalmente, abrigava-se ao meu lado para dividirmos um pedaço de pão com manteiga ou outro alimento qualquer, não fazia diferença. Minha mãe ?! Sim, esbravejava e maldizia o cãozinho, ao ver o estrago que causara em minha roupa, mas com seu jeito caipira e também muito honesto, pegava o avental ou minha camisa, dirigia-se ao tanque, com uma pedra de sabão Rio, lavava as roupas, as estendia numa corda, que ela chamava de varal, para "cuará"... enquanto isso, eu e meu leal e honesto amigo, nos aquietávamos em algum canto da pequena casa e esperávamos que a velha se acalmasse e fizesse suas previsões: - Um dia você vai sentir falta de tudo isso, sentenciava. É, minha velha estava certa, ela ainda está viva e ainda fazendo previsões. Meu amigo vira-latas morreu. Os vira-latas, nunca sabíamos de onde vinham, quem eram seus antecedentes, quais eram suas comidas preferidas ou quais cuidados especiais deveríamos ter com eles, eles simplesmente apareciam e ofereciam o que tinham de melhor, o AMOR, e esse amor era tão puro e tão verdadeiro que eles também nunca nos perguntavam quais eram nossas origens, quais eram nossos gostos pessoais, eles estavam sempre dispostos a dividir um pão com manteiga ou nossos chinelos. Os pães e os chinelos eram escassos, o AMOR, esse não, o AMOR era abundante. Hoje compramos nossos amigos, com pedigree e recomendações de cuidados, compramos nossos amigos com etiquetas e pompas, nos desumanizamos para humanizar os bichinhos e pagamos caro para disfarçar nossa desolada solidão, pois o pedigree, os mimos e bibelôs não traduzem o amor. Hoje, já me desfazendo das cascas douradas e inúteis das horas, como diz o poeta, desejo apenas e profundamente um AMOR vira-latas.
SABEDORIA -
(Sobre o 31 de Dezembro e 01 de Janeiro. Sobre Avós e Netos. Sobre a Tardezinha. Sobre os Palhaços. Sobre a Poesia.).
Observem as crianças:
elas já nascem
sábias.
Passam a infância inteira
tentando ensinar os adultos
que, por prepotência e
falta de tempo,
não lhes dão a atenção
necessária.
Na adolescência,
por inquietude, irresponsabilidade,
falta de tempo
(numa das aventuras
dessa fase),
deixam-na esquecida,
num canto qualquer do mundo.
Na fase adulta,
hora ou outra,
olham para ela, reconhecem-na,
mas, pelo excesso de compromissos,
severidade, falta de tempo,
não usam-na corretamente.
O Tempo — sábio, dono de tudo —
nos traz junto com a velhice,
a essência da infância.
Agora
carregada de histórias,
experiências e, para alguns
(de olhar atento),
a sabedoria necessária
para prestar atenção
nas crianças
(sábias).
O Tamanho das Coisas -
Bem,
eu me importo com todas
as pessoas.
Sim,
de alguma maneira
me importo.
Algumas mais, outras nem
tanto,
algumas outras bem
menos, enfim.
Mas as que mais me
interessam — que eu dedico
mais cuidados, mais atenção,
mais tempo — são aquelas
que têm a capacidadede
contemplar um grão de areia
com a mesma devoção com
que olham o céu.
E olham para o céu
com a humildade dos que
enxergam grandeza num
grão de areia.
Porque as coisas:
os sentimentos, os valores...
a vida,
são do tamanho que a gente
se dispõe a enxergá-las — senti-las.
Eu Mereço Tudo do Nada Que Sou -
"É só um momento,
vai passar!" — todos dizem.
E lá se vai mais um
dia, dois... três semanas,
um mês.
"Calma, calma,
vai passar!"
Então, três meses, sete...
dez anos.
"Quando terminar o
colégio, com certeza
passa.
Casando. Pronto:
casando passa, tenho
certeza."
A verdade é que ninguém mais,
além de mim, tem culpa.
Às vezes,
penso que dormi aos 16 anos
e só acordei aos 35.
(E o que se pode fazer quando
se está dormindo, além
de sonhar?).
Foi o que eu fiz: apenas
sonhei.
A minha vida inteira,
tudo que eu fiz foi sonhar,
no conforto da minha casa,
do meu quarto.
Fui o homem mais forte do mundo quando criança.
Quando adolescente,
o maior jogador de futebol
que já se ouvira falar.
Virei adulto e pensei:
"para ser um grande
artista,
basta escrever algumas boas
canções ou alguns belos
poemas de amor."
Fiz tudo isso.
Às vezes,
de maneira genial,
mas tudo dentro da minha
zona de conforto.
Sempre à espera de um
milagre, sempre à espera
da sorte — sempre a esperar.
A grande coragem — essa —
usei-a para os amores
que tive ou que
pensara ter.
Foram alguns, e todos
se foram.
Mas saibam que,
ao menos por esses,
eu dediquei-me ao
máximo — fiz de
tudo, sabe?
Preocupava-me em dar
atenção,
estava sempre à disposição
para qualquer eventualidade,
cuidava da alimentação,
da saúde.
Caprichava nos detalhes,
imagina:
eu corrigia, com delicadeza,
erros de português.
Nem saberia dizer quantas canções, quantos poemas escrevi-lhes.
Fui totalmente dedicado, esforçado,
afetuoso, nem sei como mantinha
tanta disciplina, tanta devoção.
Sonhei, batalhei, fui até o limite,
mas foi tudo, tudo em vão:
Ninguém quis
ficar.
Hoje,
me sinto mais velho do que
realmente sou.
Hoje,
me sinto mais inseguro que
quando era uma criança
doente.
Hoje,
com uma sensação de rejeição crônica, necessitando, urgentemente
de reparos na alma,
qualquer boa intenção parece-me
amor verdadeiro.
(Ainda que, traumatizado,
desconfie que acabará
amanhã de manhã).
Hoje,
o que restou-me foi este enorme
medo de gente,
medo de ruas desconhecidas,
de multidão.
Hoje,
ainda dentro do meu quarto,
escrevo para mim mesmo,
falando da vida (sonhada),
do mundo (imaginado),
mirando as paredes — ora
quentes, ora frias — independentemente
do que sinto.
Hoje,
como sempre foi,
olho para o teto e ele
limita-me.
As paredes limitam-me.
Limito-me aos cômodos,
à vista da janela já conhecida,
aos rostos íntimos.
E,
certamente por tudo isso,
como um prêmio, indesejavelmente (merecido),
eu estou, exatamente onde estou,
como estou:
perdido, com uma enorme sensação
de inutilidade e aos prantos
no chão.
No chão do banheiro, encostado à privada — que está com a tampa aberta e a descarga quebrada.
O "X" do Problema -
O "X" do problema é que
sempre nos oferecem (primeiro),
o "melhor" de cada um.
E quando começamos,
com o tempo,
a conhecer, verdadeiramente
a essência, já é tarde.
Está ali o sentimento
impregnado — roubando verdades, camuflando defeitos, nos ridicularizando.
E isto,
nesses casos,
é desmoralizante,
traumático, revoltante.
Salvar o Homem -
Para manter-se,
literalmente, ainda vivo,
um poeta, um artista, precisa,
por muitas vezes,
ignorar sua arte.
Largar de mão da visão artística
na maneira como enxerga
as coisas — a vida — e encarar
coisas mais comuns (que, naturalmente, também fazem parte
do seu dia a dia),
de maneira mais crua, mais vazia,
mais real:
Uma conversa estúpida,
com pessoas
estúpidas;
Uma pia de pratos sujos;
Um bico para ganhar alguns
trocados ou um emprego
maçante;
A não compreensão, a não
valorização da sua
arte;
A rejeição, o vazio de algumas pessoas, de alguns sentimentos,
de alguns sonhos — da vida.
É nessa hora que ele precisa
entender que, às vezes,
é preciso matar o poeta, o artista
para salvar o homem.
Pequenino -
Ninguém encara a solidão
de um chão de banheiro
sujo e frio, e finge
chorar.
Já interrompi um banho
porque havia um pequenino inseto
se afogando naquela água
de lágrimas e sabão.
Só queria que os meus problemas ficassem do tamanho que eles realmente são.
E não do tamanho que eu os transformo e eles transformam-me.
No Limite -
É uma noite maldormida por anos;
Dias que não amanhecem ou
nunca acabam;
É um desânimo crônico
estendido;
Uma falta... excessos... solidão.
É um não trabalho;
um não relacionamento;
uma não realização — pequenas e repetidas rejeições diárias — invisíveis aos outros.
Invisíveis a todos
os outros.
São dias cheios de coisas vazias,
em que nada acontece
e,
aparentemente
são nesses dias em que
"nada acontece",
que pessoas esgotadas,
saturadas — no limite —
desistem de
tudo.
Mistura Ácida -
Agora são
exatamente 3h37 de uma
madrugada quente de
novembro.
E neste momento
tudo que preciso fazer
é dormir.
Apenas dormir.
Mas dormir é tudo que eu
não consigo fazer.
As notícias correm,
palavras vêm e vão de um lado
para o outro dentro da minha
cabeça que não sossega,
não se desliga.
Uma mistura ácida de lembranças presentes, desejos reprimidos e saudades incuráveis.
Que noite:
enquanto todas as outras pessoas, bem ou mal,
tocam suas vidas em
frente,
tudo que eu consigo fazer
é sentir-me completamente parado, travado, inútil — perdido.
Esta Página -
Quando um dia,
se um dia, tu chegares
até esta página e leres estas linhas,
saibas que eu terei te amado
a cada dia:
De sol ou de chuva ou naqueles em que há de tudo um pouco, e
nada de mais há.
Terei te amado a cada noite escura
ou de luar, e, quem sabe, nos
sonhos das madrugadas
mais solitárias.
Terei te amado sempre que tu sorriste ou choraste, ou não fizeste nem uma coisa nem outra.
Terei te amado a cada falta tua,
a cada lembrança tua, a cada
saudade da gente,
Pequena.
Sim,
eu terei te amado, inevitavelmente,
a cada segundo antes que tu
chegaste até aqui — nesta página,
com estas linhas, estes versos.
E,
talvez
continuarei a te amar
mesmo depois que tu enxugares
o rosto, fechares o livro e
esqueceres-me numa
noite de um sábado
qualquer da tua
vida.
O Peso -
O peso da idade é sentido nas costas, ombros, braços, pernas, ossos e articulações doloridas.
Na falta de força e resistência e vitalidade de outrora.
Os restos acumulados de esforços repetitivos, horas extras, noites maldormidas, estresse, e a fragilidade natural do corpo no passar dos anos denunciam: estamos ficando velhos (ainda que tenhamos um espírito jovem).
Mas o verdadeiro peso da idade sente-se mesmo é na consciência: na realidade de todas as decisões e escolhas feitas.
O Calendário -
Em cima da mesa uma bandeja com ovos, uma cesta com algumas frutas, uma lata de óleo, remédios, pães e biscoitos.
Ainda na mesa à esquerda, uma garrafa de vinho tinto pela metade e uma de café cheia.
No centro facas e garfos e colheres dentro de um prato transparente, ao lado de um copo com água.
À direita um maço de cigarros, uma caixa de fósforos e um calendário na beira, meio que suspenso, quase para fora.
Nos rótulos informações nutricionais, composições químicas e advertências.
De tudo ali, o mais cruel, silencioso e implacável era o Calendário - que tudo conhecia, tudo abraçava, tudo devorava - tão certo e tão simples, no Tempo de ser: passado, presente e futuro.
Princípio, meio e fim.
Sendo apenas uma folha qualquer, numa mesa qualquer, numa tarde qualquer, de um dia qualquer, no cruel e silencioso e implacável Tempo de uma vida cronometrada (regressivamente).
Lucidez -
Eu vejo e sinto e pressinto, detalhadamente, a vida e seus sabores e dissabores.
Em cores e sons e sentidos.
Recordo e revivo, com intensidade e nitidez, tudo, ao extremo.
Sinto o Tempo presente no ranger dos ossos e suor da pele;
No medo do desconhecido;
Na poesia dos gestos simples e nobres do meu filho.
Ouço o som do agora no vento que me assanha os cabelos e, neste instante, ameniza o calor do sol, em um quase fim de tarde, de uma quarta-feira qualquer de novembro.
Tenho anseios presentes que deuses me antecipam em pensamentos complexos, desordenados que disparam sinais e alarmes de alerta constantes.
Por quê?
A vida me chega em realidade e sonhos lúcidos:
E é esse o grande desafio; o grande duelo.
Se não, o grande mal.
Perto da Perfeição -
Recordo-me o dia
em que ela havia esquecido
sua garrafa d'água
aqui em casa.
E já depois das cinco horas da tarde
(bem perto daquele instante mágico),
numa quarta-feira chuvosa e fria,
enquanto eu preparava um café,
ela me aparece.
Vem até a cozinha,
onde estou,
e pega sua garrafa.
Olha o horizonte pela janela
enquanto jogamos algumas palavras fora
e se vira
em direção ao corredor.
Então,
de súbito,
eu a pego pelo braço
e a abraço.
Alguns segundos ali:
ela,
eu,
aquele abraço,
sua risada,
seu cheiro,
seus cabelos,
meus pensamentos e desejos,
a chuva e o frio,
o café quentinho,
a Tardezinha...
E ela se vai.
Me deixando a seria impressão de que eu cheguei muito perto da perfeição.
Somos Escravos das Nossas Necessidades -
Eu precisaria ignorar tudo,
tudo que me faz escravo
pela pele,
pela vontade,
pelo desejo.
Junto com esse sentimentalismo escancarado,
descontrolado
por coisas e pessoas.
Isso,
durante,
talvez, uma semana,
duas, um mês, quem sabe.
E talvez assim,
eu encontrasse as respostas necessárias
para me ter de volta primeiro
e poder, enfim,
me dar por inteiro
e são.
Dias Ruins -
Neste instante,
olho pela janela e verifico que
hoje
o sol se pôs sem cerimônia.
E o meu olhar está a fitar
o horizonte
sem graça.
(Salvo erro, claro)...
Há o canto e o voo
dos pássaros.
Há,
ainda,
uma bela mistura de cores
e luzes
e o que eu não vejo.
Mas hoje (triste),
o sol se pôs sem cerimônia.
E enquanto fecho olhos e janelas e cortinas,
abro-me para dentro:
Até os mais soberanos têm dias ruins.
Só Amanhã Passa -
Ei...
Está em sua casa?
Preciso muito te ver.
Conversar,
saber o que tem lido,
quantos objetos quebrou
este mês.
Quero,
por um instante,
parar os meus olhos
nos teus
até você ficar sem graça
e dizer:
"o que foi?"
Olha...
a gente divide um chocolate,
uma canção,
talvez
um verso,
um pensamento,
ou poesia.
Aquela velha piada do Chaves,
naturalmente,
um sorriso ou gargalhada,
sei lá...
Mas
acho melhor
dividirmos caminho:
É que está longe demais
para te abraçar
e dizer que sinto muito...
muito a sua falta.
Desde ontem,
(e só amanhã
passa).
Quinta-feira, 29 -
Chegará o dia
em que você
não mais poderá contar
com sua mãe
ou seu pai
ou irmão
ou qualquer outro
parente.
Nem mesmo um amigo
para desabafar
ou
pedir ajuda.
Será somente você
diante do mais assustador
dos seres:
você mesmo.
Lhe restará,
então,
sua essência
finalizada;
seu caos existencial
materializado;
suas crenças
inutilizadas.
O medo
em sua forma absoluta;
as lembranças
em uma espiral veloz
e abstrata...
A esperança,
enfim,
devolvida.
(Morrer,
então,
deve ser isto).
17:57 -
E toda vez que este horário me cai
eu penso:
É sempre um dia a menos.
E não importa como está seu dia,
sua semana,
seu mês...
Não importam todas as religiões,
deuses ou diabos.
Não importa o ouro
ou a prata,
nem o mais precioso
diamante.
Não importa todo o bem
ou mal que você tenha feito
na vida
ou onde mora
ou com o quê trabalha.
Não importam todos os amores
ou desamores
(vividos ou não vividos),
todos os amigos
e a infância ou juventude
de outrora.
Não importa toda a poesia do mundo
ou toda a arte
ou tudo que,
de algum modo,
eterniza algo,
alguém ou alguma coisa.
E mesmo o mais nobre dos gestos:
o sorriso do meu filho
(com todo o encanto,
toda leveza,
toda cura),
diante da força soberana
e implacável do Tempo
não importa:
É sempre um dia a menos.
E é essa a grande verdade
ou a única.