Sonetos de Mário Quintana

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Linha Curva

O caminho mais agradável entre dois pontos.

O LUAR

O luar,
é a luz do Sol que está sonhando

O tempo não para!
A saudade é que faz as coisas pararem no tempo...

... os verdadeiros versos não são para embalar,
mas para abalar...

A grande tristeza dos rios é não poderem levar a tua imagem...

Mario Quintana

Nota: Trata-se de um "poema-montagem" com adulterações de origem desconhecida. Os versos foram extraídos e adaptados de outros poemas: "Verso Avulso"; "A Saudade"; "O Berço e o Terremoto".

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O Auto Retrato

No retrato que me faço
- traço a traço -
às vezes me pinto nuvem,
às vezes me pinto árvore...
às vezes me pinto coisas
de que nem há mais lembrança...
ou coisas que não existem
mas que um dia existirão...
e, desta lida, em que busco
- pouco a pouco -
minha eterna semelhança,
no final, que restará?
Um desenho de criança...
Terminado por um louco!

Amar, nunca me coube
Mas sempre transbordou
O rio de lembranças
Que um dia me afogou

E nesta correnteza
Fiquei a navegar
Embora, com certeza,
Não possa me salvar

Amar nunca me trouxe
Completo esquecimento
Mas antes me somou
Ao antigo tormento

E assim, cada vez mais,
Me prendo neste nó
E cada grito meu
Parece ser maior

O que mata um jardim não é mesmo
alguma ausência
nem o abandono...
O que mata um jardim é esse olhar vazio
de quem por eles passa indiferente.

Mario Quintana
Quintana de bolso. Porto Alegre: L&PM, 1997.

Nota: Trecho do poema Jardim interior.

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Vento

Pastor das nuvens.

Hoje encontrei dentro de um livro uma velha carta amarelecida,
Rasguei-a sem procurar ao menos saber de quem seria...
Eu tenho um medo
Horrível
A essas marés montantes do passado,
Com suas quilhas afundadas, com
Meus sucessivos cadáveres amarrados aos mastros e gáveas...
Ai de mim,
Ai de ti, ó velho mar profundo,
Eu venho sempre à tona de todos os naufrágios!

DA ETERNA PROCURA

Só o desejo inquieto, que não passa,
Faz o encanto da coisa desejada...
E terminamos desdenhando a caça
Pela doida aventura da caçada.

Mario Quintana
QUINTANA, Mario. Espelho mágico. Porto Alegre: Ed. Globo. 2005

O Poema

O poema
essa estranha máscara
mais verdadeira do que a própria face...

Mario Quintana
Caderno H. Rio de Janeiro: Objetiva, 2013.

Do Estilo

O estilo é uma dificuldade de expressão.

Trova
Coração que bate-bate...
Antes deixes de bater!
Só num relógio é que as horas
Vão passando sem sofrer.

Da amizade entre mulheres

Dizem-se amigas... Beijam-se... Mas qual!
Haverá quem nisso creia?
Salvo se uma das duas, por sinal,
For muito velha, ou muito feia...

Mario Quintana
QUINTANA, Mario. Espelho mágico. Ed. Globo. 2005

Da vez primeira em que me assassinaram
perdi um jeito de sorrir que tinha...
Depois, de cada vez que me mataram,
Foram levando qualquer coisa minha.

A saudade da amada criatura
é bem melhor do que a presença dela.

Poema da Gare de Astapovo

O velho Leon Tolstoi fugiu de casa aos oitenta anos
E foi morrer na gare de Astapovo!
Com certeza sentou-se a um velho banco,
Um desses velhos bancos lustrosos pelo uso
Que existem em todas as estaçõezinhas pobres do mundo
Contra uma parede nua...
Sentou-se ...e sorriu amargamente
Pensando que
Em toda a sua vida
Apenas restava de seu a Glória,
Esse irrisório chocalho cheio de guizos e fitinhas
Coloridas
Nas mãos esclerosadas de um caduco!
E então a Morte,
Ao vê-lo tao sozinho àquela hora
Na estação deserta,
Julgou que ele estivesse ali à sua espera,
Quando apenas sentara para descansar um pouco!
A morte chegou na sua antiga locomotiva
(Ela sempre chega pontualmente na hora incerta...)
Mas talvez não pensou em nada disso, o grande Velho,
E quem sabe se até não morreu feliz: ele fugiu...
Ele fugiu de casa...
Ele fugiu de casa aos oitenta anos de idade...
Não são todos que realizam os velhos sonhos da infância!

Fere de leve a frase... E esquece... Nada
Convém que se repita...
Só em linguagem amorosa agrada
A mesma coisa cem mil vezes dita.

Mario Quintana
QUINTANA, Mario. Espelho mágico. Ed. Globo. 2005

Tenta Esquecer-me

Tenta esquecer-me...
Ser lembrado é como evocar
Um fantasma... Deixa-me ser o que sou,
O que sempre fui, um rio que vai fluindo...
Em vão, em minhas margens cantarão as horas,
Me recamarei de estrelas como um manto real,
Me bordarei de nuvens e de asas,
Às vezes virão a mim as crianças banhar-se...
Um espelho não guarda as coisas refletidas!
E o meu destino é seguir... é seguir para o Mar,
As imagens perdendo no caminho...
Deixa-me fluir, passar, cantar...
Toda a tristeza dos rios
É não poder parar!

A Coisa
A gente pensa uma coisa, acaba escrevendo outra e o leitor entende uma terceira coisa... e, enquanto se passa tudo isso, a coisa propriamente dita começa a desconfiar que não foi propriamente dita.

Mario Quintana
Caderno H. Rio de Janeiro: Objetiva, 2013.

Um dia...Pronto!...Me acabo.
Pois seja o que tem de ser.
Morrer: Que me importa?
O diabo é deixar de viver.

Linha Reta

Linha sem imaginação.