Sim nós dois

Nada nos torna tão amáveis como o julgarmo-nos amados.

Todos nós somos levados ao mesmo lugar; / na urna agita-se a sorte de cada um: / mais cedo ou mais tarde, a sorte terá de ser lançada, / e nos fará entrar no barquinho em direcção ao exílio eterno.

Nós só vivemos contradições e para as contradições; a vida é tragédia e luta perpétua sem vitória e sem esperança de vitória; ela é contradição.

Os seres aos quais servimos de amparo são para nós um apoio na vida.

O mal é aquilo que não perdoamos a nós próprios.

Apenas há princípios imortais, visto que, no dia em que um princípio morre, apercebemo-nos de que se tratava simplesmente dum paradoxo.

Ao dizer algo de condensado sobre a realidade, aproximamo-nos já do sonho, ou antes, da poesia.

O senso comum diz-nos que a terra é imóvel, que o sol gira à sua volta e que os homens que vivem nos antípodas andam de cabeça para baixo.

A razão engana-nos mais frequentemente que a natureza.

Se queres provar-nos que és competente em agricultura, não o proves semeando urtigas.

Um passo a mais para nos perdermos e reencontramo-nos.

Os poetas ajudam-nos a amar: só servem para isso.

Somos tão responsáveis por sermos inteligentes como de sermos estúpidos. Não devemos orgulharmo-nos mais de uma coisa do que corar pela outra.

É sempre bom aprendermos, mesmo com os nossos inimigos; raramente é bom arriscarmo-nos a instruir, mesmo os nossos amigos.

A solidão da poesia e do sonho tira-nos da nossa desoladora solidão.

Os nossos pais, piores do que os seus, geraram-nos / ainda mais celerados do que eles; nós, por nossa vez, geraremos / filhos ainda mais perversos do que nós.

Para bem julgarmos é preciso afastarmo-nos daquilo que julgamos, depois de havermos estimado. Isto é verdade quanto aos países, aos seres e nós próprios.

Divertimo-nos com os doidos na hipótese de que o não somos.

Os homens poderiam parecer-nos mais justos ou menos injustos, se não exigíssemos deles mais do que podem ou devem dar-nos.

Todo o bem que dizem de nós não nos diz nada de novo.