Sim nós dois

O céu deu-nos o hábito, / bom substituto da felicidade.

Parece, na verdade, que nós nos servimos das nossas orações como de um jargão e como aqueles que empregam as palavras santas e divinas em feitiçarias e em efeitos de magia.

A nobreza do espírito, com respeito àquela tradicional, oferece-nos a vantagem de podermos atribui-la a nós mesmos.

Quando o doutor escreve a receita, olha-nos uma última vez para ver se põe um remédio dos caros ou dos baratos.

O grande prazer que nos dá falarmos de nós próprios deve fazer-nos recear não darmos nenhum aos que nos ouvem.

Não ha coisas úteis ou inúteis: a medida do seu valor está em nós.

Nós, os pobres, somos como o algarismo zero, que por si só nada vale e faz valer a cifra que a ele se junta - tanto mais quanto mais zeros lhe forem acrescentados.

Chamemos, pois homens de gênio os que fazem depressa o que nós fazemos devagar.

Lastimamo-nos da nossa ignorância, mas é ela que produz quase todo o bem do mundo: não prever faz com que nos empenhemos.

Não há coisa mais fácil que vencer os outros homens, nem mais difícil que vencer-nos a nós mesmos.

Às vezes acontece sentirmo-nos felizes por um minuto. Não se deixem levar pelo pânico: é uma questão de segundos e depois passa.

Dizem-nos por vezes - é um fato - inclinai-vos perante os fatos. Ou seja, «acreditai». Acreditai porque aqui o homem não interveio.

A fatalidade não é senão aquilo que nós queremos.

O segredo de todo o poder consiste em saber que os outros são ainda mais covardes do que nós.

Por melhor que digam de nós, não nos dão nenhuma novidade.

A desconfiança põe-nos de sobreaviso contra todo mundo.

Normalmente, convencem-nos com mais facilidade as razões que nós próprios encontramos do que as que vieram ao espírito dos outros.

Quando a fortuna nos dispensa do trabalho, a natureza sobrecarrega-nos de tempo.

Todos nós temos a ideia pervertida de que o cérebro humano é um órgão para pensar. Nada está mais longe da verdade.

Crer na fatalidade, é criá-la em nós mesmos.