Saudades de Alguém que Mora Longe
O Lampejo
O poema não voa de asa-delta
não mora na Barra
não freqüenta o Maksoud.
Pra falar a verdade, o poema não voa:
anda a pé
e acaba de ser expulso da fazenda Itupu
pela polícia.
Come mal dorme mal cheira a suor,
parece demais com o povo:
é assaltante?
é posseiro?
é vagabundo?
frequentemente o detêm para averiguações
às vezes o espancam
às vezes o matam
às vezes o resgatam
da merda
por um dia
e o fazem sorrir diante das câmeras da TV
de banho tomado.
O poema se vende
se corrompe
confia no governo
desconfia
de repente se zanga
e quebra trezentos ônibus nas ruas de Salvador.
O poema é confuso
mas tem o rosto da história brasileira:
tisnado de sol
cavado de aflições
e no fundo do olhar, no mais fundo,
detrás de todo o amargor,
guarda um lampejo
um diamante
duro como um homem
e é isso que obriga o exército a se manter de prontidão.
Quando alguém pergunta a um autor o que este quis dizer, é porque um dos dois é burro.
Se você odeia alguém, é porque odeia alguma coisa nele que faz parte de você. O que não faz parte de nós não nos perturba.
Da calúnia
Sorri com tranquilidade
Quando alguém te calunia.
Quem sabe o que não seria
Se ele dissesse a verdade...
Se alguém te perguntar o que quiseste dizer com um poema, pergunta-lhe o que Deus quis dizer com este mundo...
Guardar raiva é como segurar um carvão em brasa com a intenção de atirá-lo em alguém; é você que se queima.
Se existe no mundo coisa mais aborrecida do que ser alguém de quem se fala é certamente ser alguém de quem não se fala.
Se escolheres o prazer, conscientiza-te que atrás dele há alguém que só te trará atribulações e arrependimento.
Se alguém varre as ruas para viver, deve varrê-las como Michelângelo pintava, como Beethoven compunha, como Shakespeare escrevia.