Sair de Casa
Sua graça não caminha pela casa
Se move blindada em abstrações
Irrelevantes são as coisas
Da cabeça
Estantes
Livros esquecidos
E todos os outros móveis que continuam no mesmo lugar
Assim como eu
Aqui
Onde a cama ainda é cama
E a TV televisão
Na sua ausência digo seu nome baixo
Não ao teto ou ao quebrado espelho
Mas à porta
Cristalizando ali sua presença
Te vendo em cada prisma
Refletindo
Diagonalmente a múltipla esperança
Numa perplexidade boba e infantil
Lembro de quando eu deitava na entrada de casa pra ficar olhando as nuvens em dias ensolarados e sentir aquele ventinho gostoso, era, no mínimo algo normal, habitual, era uma criança que olhava as nuvens tentando dar-lhes formas. Não, não era. Eu, somente olhava, não pensava em nada, só.. olhava. Pacientemente, eu olhava.
Em outros momentos mais tarde, eu preferia dias nublados, sempre me fizeram sentir melhor, não sei, no mais profundo de mim mesma eu acho, como se eu pudesse entender coisas que não imaginava que fosse me perguntar. E era tão triste e intenso os dias nublados. Os dias nublados sempre são tristes e intensos pra mim.
Sem poder dizer: "levei minha namorada de carro até sua casa/ Portanto ando a 666 quilômetros na contramão e desenvolvi asas
Atenção
A gente estava vendo um filme. Eram quase sete horas na noite. Eu não estava em casa. A gente se reuniu na casa do Wilian, o único de nós que tinha um aparelho de dvd na favela de quem a gente era chegado.
Eu resolvi ir embora. Alguém me mandou ficar mas eu não quis. Alguém falou que tinha algo errado mas eu não estava atento.
Atenção. Atenção é o que separa muitos de nós, vivos, do cemitério da vila formosa. Atenção é um bem precioso. Um pai que a tem salva o filho das drogas. Um operário salva o braço. Um motorista evita a colisão de frente. Da Vinci percebe o sorriso da mona Liza. Você aprende. Se mantém vivo.
Atenção. O pugilista não prestou atenção ao direto de direita que o derrotou. A mulher não deu atenção a dor suave e suportável com que o corpo a alertava sobre o câncer no estômago. O executivo não teve atenção à tímida previsão do analista novato que teria salvo sua empresa da crise mundial. Controladores de tráfego aéreo teriam percebido um avião fora de rota e avisado a defesa aérea no dia onze de setembro de dois mil e um.
Não atentei para a rua de entrada da favela deserta as sete da noite de um sábado. Não atentei para a possibilidade de correr um perigo sem volta. Não percebi que a favela estava em guerra, mais uma vez.
Atravessei o portão de grade e antes que eu me desse conta que estava na rua senti algo gelado e áspero na lateral do meu pescoço. Eu teria em qualquer outra situação colocado a mão no lugar para saber o que me causava o frio mas por estranho milagre não o fiz. Sabia o que era. Olhei para o chão e a lâmpada do poste projetava uma sombra fácil de decifrar e difícil de aceitar. Um ser apontava uma arma pra outro. Era uma arma grande. O mais baixo se encontrava parado na mira do primeiro. Perceber que eu não tinha uma arma na mão fez com que minha barriga e nuca gelassem tanto que a arma me pareceu relativamente quente ao meu pescoço.
A sensação de morte é algo estranho. Já vi a morte de frente algumas vezes mas nunca realmente acreditei que fosse morrer por mais que fosse óbvio. Essa noite foi um desses casos. Não me movi por um segundo que me pareceu uma hora e pensei "Se me mexer ele atira, mas tenho que explicar que não sou inimigo, um invasor de outra quebrada" - ainda que ele pudesse ser.
Tentei ficar calmo e prestar atenção, ainda que tardia. Ele não disse nada. Hoje nada me ocorre mais plausível do que aquele segundo que alguém espera, um pouco antes de atirar fatalmente em alguém que não tem chance de defesa. Acho que por isso os vilões quando tem o herói na mira ficam discursando em vez de executar logo o rival. Não é fácil - pra minha sorte - se tornar um carrasco. Não tem volta. Atirar em alguém que pode ser uma ameaça é mais fácil que subjugar alguém com tanta covardia, pelo menos para quem tem algum escrúpulo.
Ouvi a arma ser engatilhada. A sombra no chão confirmou o áudio como um retrovisor. Ele ia atirar em mim. Eu ia morrer ali naquela calçada. Nunca teria visto a minha esposa nem tão pouco acalentado minha filha. Não teria visto o rosto no espelho com barba. Seria só mais um. Pensei em tudo isso nos quatro ou cinco segundos que durou toda a cena mas nem assim eu acreditei que ia morrer. Não era a hora. Como alguém que crê no gol até o último minuto e quando o juíz apita o fim sente que mais um último ataque seria eficiente. Percebi que é fácil perder mas não é possível aceitar a derrota sem vê-la face a face.
O Wilian gritou algo de dentro do portão. A frase tinha um nome próprio e uma explicação que me absolvia, mas me apliquei tanto em prestar atenção no meu executor para quem eu ainda não havia olhado que não ouvi o que o wilian disse. Outra frase se seguiu me chamando para dentro, mas eu não tinha ação. Uma mão me puxou para dentro com violência e eu finalmente olhei para o atirador - que não atirou. Era alto, careca, de camiseta regata. Parecia o MV Bill com uma espingarda calibre doze cromada de cano serrado. Não me lembro do seu rosto mas me lembro da arma. Senti a ponta áspera do cano dela na minha cabeça. Nunca vou esquece-la. O portão se fechou. Eu estava vivo.
Victor Arapê
Numa tarde de abril 1998 encontrei meu amor, levei-o para casa agarrado em meus braços, ficamos juntos por 13 anos, mas no dia 17/07/2011 ele morreu nos meus braços. Não sabia que amava tanto um ser de outra espécie. O nome dele era Chip, um cão pastor belga de olhar calmo e sereno. Muitos diziam que tinha olhar de tristeza ou bondade. Foi meu amor dentre todos os seres.
O amor pode ser comparado a uma casa. O amor se constrói com as nossas próprias mãos, com os nossos sentimentos, com a nossa força e com o que a gente tem pra dar. Por mais que se tenha feito de uma maneira “errada”, de uma maneira que pode desabar a qualquer momento, devemos consertar, correr atrás, e buscar um jeito de formar um raiz naquele lugar, mas isso somente se tivermos a certeza de que aquele é o lugar certo. Talvez passe um vento e acabe com tudo aquilo, tudo o que voce construi e tudo o que voce juntou para formar o que se tem hoje. Mas as lembranças, estarão no coração do mesmo jeito, as lembranças de um lugar aonde voce foi feliz , um lar. Se o lar fosse o seu coração e a casa o amor, agora sim, voce acreditaria que há possibilidade de ser feliz ?
O ser humano é igual a uma casa se não tiver uma boa base para se ergue com o passar do tempo, o teto desaba.
Se estiver triste, tente se ocupar, tente se animar. Se sua casa tiver chata, vá para casa dos outros. Se tiver vontade de gritar, grite até perder a voz. Se tiver vontade de rir, ria até sentir dor. Se tiver vontade de chorar, chore até pegar no sono. Costuma funcionar.
Depois de uma viagem de 3 horas, finalmente cheguei em casa. Cansada, sonolenta e ainda machucada por dentro. Parece que quanto mais você tenta fugir dos seus sentimentos mais fortes ele ficam. Mas, de qualquer forma, meu sono me dominava e eu só pensava em duas coisas: banho e cama. E foi exatamente o que eu fiz. Mas não foi tão fácil pegar no sono... Quando eu cai na cama foi como se o mundo tivesse se jogado em minha cabeça. Eu comecei a lembrar do que havia acontecido... Seu rosto veio na minha mente claro e lindo como sempre. Eu não queria mas... chorei. Chorei todas as lágrimas que guardei durante esse fim de semana. Chorei para limpar meu coração. Não sei porque chorei tanto. Eu tinha era que me conformar e me aquietar, mas não consegui. Depois de muito chorar finalmente senti o sono se aproximar. Só que pra minha inquietação retornar foi só me virar pro outro lado e perceber que a secretário eletrônica piscava e gritava por mim. Mas com toda certeza era minha mãe querendo noticias. Ignorei. Cai no sono. Ao acordar já eram 10hrs da manhã. Tinha que ouvir a secretária e dar noticias minhas para minha mãe, viajei sem ela saber e ela deve ter surtado. Peguei o jornal e uma xicara de chá e apertei o botão. Tal foi minha surpresa ao ouvir uma voz conhecida, mas que não era da minha mãe.
- Oi, sou eu. Você não esta mesmo né? - longa pausa- Eu só queria te dizer que... eu sinto muito, eu sou um idiota e não te mereço. Mas eu te amo, tanto que doi em mim a tua dor. Não vou suportar isso nem mais um dia. Adeus, meu amor.
Depois de ouvir a mensagem minha cabeça deu mil voltas e eu só consegui pensar no pior. Peguei a chave do carro e sai correndo em direção da casa dele.
Chegando lá gritei por ele, mas nada ouvi. Subi as escadas com desespero... Olhei os quartos e quando abri a varanda lá estava ele sentado em uma cadeira mas lindo do que nunca cho-ran-do. Isso mesmo chorando. Eu nunca tinha o visto chorar e não acreditei que fosse por mim... mas era.
- Você...
- É tô vivo.
- Mas você...
- Ia me matar?
Balancei a cabeça em sinal positivo.
- Eu ia me matar... mas vi que ia fazer uma burrada enorme.
- É? - perguntei quase sem voz. Minha garganta estava totalmente seca.
- Sabe porque eu não me matei? Por você. Você é parte de mim, se eu me matasse eu estaria te matando também. Eu conseguiria viver sem mim mas não sem você.
Não resisti aquele olhar... O puxei para mim e o abracei com tamanha força que talvez o tenha machucado. Olhamos um nos olhos do outro e ambos pronunciamos as palvras fatais:
- Eu te amo.
Um ladrão pode roubar seu sapato, sua casa e seu conforto, mas nunca o seu conhecimento, sua cultura e sua educação.
E já pensou se ele chegasse em casa e disesse:
- Mãe, eu estou amando, como nunca amei antes e como nunca achei que amaria. Ela é a mulher dos meus sonhos. È com ela que eu quero estar em todos os momentos. È ao lado dela que eu quero envelhecer, é com ela que eu quero viver.
Sinto a tua falta, quando volto pra casa. Quando preciso de alguém pra segurar na minha mão, pra atravessar a rua.
Casa velha;
Cheira poeira, mofo.
As árvores te dão as sombras;
As sombras te descansa no calor.
O sol ilumina sua imagem.
Casa velha tu és!
Nas noites és sombria;
Ninguém se aproxima;
O medo domina.
Casa velha;
Quem te quer, quem te deixou?
Continua no mesmo lugar;
Casa velha;
Que te renovas?
Paredes rachadas,
Telhado quebrado;
Quarto escuro;
Sala sem luz...
Mas ainda seduz.
Houve alguém,
A quem te planejou,
Nunca esquece...
Teu coração padece.
Mas ainda há forças,
Continua em pé.
Sobrevive o frio do inverno sozinha,
Mas casa velha...
Não de seu tempo...
Mas, de um passado.
Seus olhos molhados.
Sabe...
Há alguém do outro lado...
Que ainda te quer.
Passaram-se os dias...
A luz retornou.
A alegria bate a porta...
A porta se cai,
És tu que anseia,
Que adentre alguém...
E viva contente...
Em seu interior.
Paulo Sérgio Krajewski.
31 de Março de 1998.