Mensagens de Rubem Alves

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A Morte não é algo que nos espera no fim. É companheira silenciosa que fala com voz branda, sem querer nos aterrorizar, dizendo sempre a verdade e nos convidando à sabedoria de viver. A branda fala da Morte não nos aterroriza por nos falar da Morte. Ela nos aterroriza por nos falar da Vida. Na verdade, a Morte nunca fala sobre si mesma. Ela sempre nos fala sobre aquilo que estamos fazendo com a própria Vida, as perdas, os sonhos que não
sonhamos, os riscos que não tomamos (por medo), os suicídios lentos que perpetramos. Embora a gente não saiba, a Morte fala com a voz do poeta. Porque é nele que as duas, a Vida e a Morte, encontram-se reconciliadas, conversam uma com a outra, e desta conversa surge a Beleza... Ela nos convida a contemplar a nossa própria verdade. E o que ela nos diz é simplesmente isto: “Veja a vida. Não há tempo a perder. É preciso viver agora! Não se pode deixar o amor para depois...”.
(Do universo à jabuticaba)

Saudade...
A Saudade se parece muito com a fome
A fome também é um vazio
O corpo sabe que alguma coisa está faltando
A fome é a saudade do corpo
A saudade é a fome da alma...

Longe do outro é possível amá-lo. Na distância ele não perturba sua bela imagem. Ela está no retrato, como sempre esteve, congelada eternamente.

Somos donos dos nossos atos, mas não somos donos dos nossos sentimentos. Somos culpados pelo que fazemos, mas não somos culpados pelo que sentimos. Podemos prometer atos. Não podemos prometer sentimentos. “Eu sei que vou te amar, por toda a minha vida vou te amor...” Lindo e mentiroso. Não se podem prometer sentimentos. Eles não dependem da nossa vontade. Sua existência é efêmera. Como o voo dos pássaros...

Rubem Alves
Ostra feliz não faz pérola. São Paulo: Editora Planeta do Brasil, 2008.

Não discutimos, não queixamos e muitas vezes caminhamos juntos através de portas abertas.

“... O Pensamento é uma coisa existindo na imaginação antes de ela se tornar real.
A mente é o útero. A imaginação a fecunda. Forma-se um feto: o pensamento. Ai, ele nasce...!”

“.... Devemos perdoar a nós mesmos.
Não haverá condição de perdão para o outro, senão limpar o caminho que está dentro de você. Quando você perdoa o outro e não perdoa a si pelos erros cometidos, esses se transformam em culpa e o caminho continua fechado para todas as pessoas envolvidas, principalmente para você...! ”

"Os que têm medo sonham. Porque tenho medo da cidade grande onde me perco eu sonho com cidade grande que posso amar. É uma utopia. Não existe. Mas não tem importância. Valéry perguntou: “Que seria de nós sem o socorro das coisas que não existem?” O que não existe socorre. Oscar Wilde, que sabia do socorro das coisas que não existem, escreveu: “Um mapa do mundo que não inclua o país da Utopia não merece nem mesmo um olhar, pois ignora o único país ao qual a Humanidade constantemente chega. E quando a Humanidade lá atraca, fica alerta, e levanta novamente as âncoras ao vislumbrar terra melhor…”."

As flores dos flamboyants, dentro de poucos dias, terão caído. Assim é a vida. É preciso viver enquanto a chama do amor está queimando...

"Penso que borboletas, seres alados, diáfanos e coloridos, devem ser emissários dos deuses, anjos que anunciam coisas do amor. Imaginei então que aquela borboleta era um anjo disfarçado que os deuses me enviavam com uma promessa de felicidade."

“Ensinar é um exercício de imortalidade.
De alguma forma continuamos a viver
naqueles cujos olhos aprenderam a ver
o mundo pela magia da nossa palavra.
O professor assim, não morre jamais.”
“O corpo é o lugar fantástico onde mora, adormecido, um universo inteiro…
Tudo adormecido. O que vai acordar é aquilo que a Palavra vai chamar…
As palavras são entidades mágicas, potências feiticeiras, poderes bruxos que despertam os mundos que jazem dentro dos nossos corpos, num estado de hibernação, como sonhos…
A este processo mágico pelo qual a Palavra desperta mundos adormecidos se dá o nome de educação."

Livro "A alegria de ensinar"

Não, não é verdade que o sofrimento torna melhores as pessoas. O sofrimento frequentemente embrutece, tira a sensibilidade, tira a esperança, torna cruéis as pessoas. Um Deus – ou força cósmica – que usasse o sofrimento para evolução seria muito curto de inteligência – não saberia aquilo que os homens aprenderam: que a única força capaz de fazer as pessoas ficarem melhores é o amor.

O ato de ouvir exige humildade de quem ouve. E a humildade está nisso: saber, não com a cabeça mas com o coração, que é possível que o outro veja mundos que nós não vemos. Mas isso, admitir que o outro vê coisas que nós não vemos, implica reconhecer que somos meio cegos… Vemos pouco, vemos torto, vemos errado.

Rubem Alves
Ostra feliz não faz pérola. São Paulo: Planeta, 2008.

Amamos não a pessoa que fala bonito, mas a pessoa que escuta bonito... A arte de amar e a arte de ouvir estão intimamente ligadas. Não é possível amar uma pessoa que não sabe ouvir.

Rubem Alves
Ostra feliz não faz pérola. São Paulo: Planeta, 2008.

Gosto de ler orações. Orações e poemas são a mesma coisa: palavras que se pronunciam a partir do silêncio, pedindo que o silêncio nos fale. A se acreditar em Ricardo Reis, é no silêncio que existe no intervalo das palavras que se ouve a voz de “um Ser qualquer, alheio a nós“, que nos fala. O nome do Ser? Não importa. Todos os nomes são metáforas para o Grande Mistério inominável que nos envolve. Gosto de ler orações porque elas dizem as palavras que eu gostaria de ter dito mas não consegui. As orações põem música no meu silêncio.

⁠aprendo que o amor nada tem a ver com apego, segurança ou dependência, embora tantas vezes eu me confunda. Não adianta querer que seja diferente: o amor é alado.

⁠Amar é brincar. Não leva a nada. Porque não é para levar a nada. Quem brinca já chegou.

Rubem Alves
A alegria de ensinar. 6.ed. Campinas: Papirus, 2000.

A ostra, para fazer uma pérola, precisa ter dentro de si um grão de areia que a faça sofrer.

Rubem Alves
Ostra feliz não faz pérola. São Paulo: Planeta, 2021.

⁠"Mas o que me assombra mais não são as coisas que os seres humanos fazem. São os pensamentos que eles pensam."

A ideia de que o corpo carrega duas caixas – uma caixa de ferramentas, na mão direita, e uma caixa de brinquedos, na mão esquerda – me apareceu quando me dedicava a entender santo Agostinho. Pois ele, resumindo o seu pensamento, disse que todas as coisas que existem se dividem em duas ordens distintas. A ordem do uti (ele escrevia em latim) e a ordem do frui. Uti, “o que é útil, utilizável, utensílio”. Usar uma coisa é utilizá-la para se obter uma outra coisa. Frui, “fruir, usufruir, desfrutar, amar uma coisa por causa dela mesma”. A ordem do uti é o lugar do poder. Todos os utensílios, ferramentas, são inventados para aumentar o poder do corpo. A ordem do frui, ao contrário, é a ordem do amor – coisas que não são utilizadas, que não são ferramentas, que não servem para nada. Elas não são úteis; são inúteis. Porque não são para ser usadas, mas para ser gozadas. A tradição cristã tem medo das coisas que são guardadas na caixa dos brinquedos. Nessa caixa se guarda a origem do pecado: o prazer…
(Do universo à jabuticaba)

Inserida por Filigranas