Rio
Esse lamentável incêndio no Museu carioca nos mostra como é tratada a cultura, em nosso país pelos nossos governantes.
Um dos setores que recebe menos investimentos, menos atenção; onde há a maior incidência de desvio de finalidade, de politicas públicas, etc.
Daí se dar para ter uma ideia de como é difícil ser um artista neste país, remando contra a maré e tendo que vender (adiar) os sonhos para conseguir sobreviver (dentro daquilo que chamamos de realidade).
Esta mania de ser joãoandrade
só me traz problema.
Quando todos esperam muito,
faço um poema.
Quando tento ser outro,
repito o mesmo esquema.
Se o poeta estiver certo,
minha alma é pequena.
O Mar Vermelho iniciou-se às 06:00 hs de hoje e um tanto atrasado, mas veio à um intenso fluxo no rubro e inerente falar de constatarmos a delicada fase de sintonia que consiste em aguçar a minha feminilidade com ele e com a natureza, qual e assim, trouxe a fresca chuva em sua união até o Rio.
Por mais que hoje em dia seja difícil, não podemos desacreditar das coisas que sempre acreditamos querer um dia para a nossa vida.
Às vezes falo, grito,
mesmo estando mudo.
Há sentimento
que não se traduz.
As palavras não dizem tudo.
Se a esta hora o agora
se fez em você passivo,
é porque de algum modo
estou em você cativo.
Se a esta hora meu verso
é espelho e você me lê,
é porque de algum modo
estou vivo em você.
Os vencidos não têm história
e a glória é tarde
para a palavra vazia.
Sincronizo o tempo
e os vencidos escorrem
pelo ralo da pia.
Conto do Desmantelo Azul
Uma vez, durante a primavera, eu vi o mar. Era fim de tarde, eu era criança, pouco mais de seis anos. Foi a primeira, foi a última vez.
O encontro, no horizonte, do céu azul com um mundo de espelho azulado com moldura azul-dourada invadiu meus olhos, arrebatou minha alma. Nunca nada mais enxerguei.
Uma vez, durante a primavera, ouvi o mar. Era fim de tarde, eu criança era, pouco mais de seis anos. Foi a primeira, foi a última vez.
O encontro do marulho azul com o silêncio azulado do infinito estourou meus tímpanos, ensurdeceu minha alma. Nada nunca mais ouvi.
Uma vez, durante a primavera, cheirei o mar. Era fim de tarde, criança eu era, pouco mais de seis anos. Foi a primeira, foi a última vez.
O encontro da maresia de azul salgado com o aroma celeste de um céu azulado quase noite entranhou-se pelas minhas narinas, embrenhou-se em minha alma.
Nunca mais nada cheirei.
Uma vez, durante a primavera, degustei o mar. Era fim de tarde, era eu criança, pouco mais de seis anos. Foi a primeira, foi a última vez.
O encontro de minha doce inocência com o azul salgado segredo das águas engravidou meu peito, emprenhou minha alma. Nada nunca mais provei.
Hoje, toda tarde, sento em frente ao mar, e uma suave fluida mão anil acaricia minha pele instantes antes de meu corpo se diluir na brisa marinha e meus poros explodirem em azul ao serem penetrados pela alma do mundo.
Não existe o modo certo para amar, cada pessoa tem o seu. O amor também não precisa ter definições, para alguns pode ser um tesouro de esmeraldas, a outros apenas seixos de rio deslizando ao sabor das águas. Ambos tem o mesmo valor.
Arrancar do peito o indizível,
e deixá-lo exposto em minha cara,
pode ser um ato de extremo egoísmo,
mas é no fundo do abismo
que nascem as flores mais raras.
Não se limite
a dizer coisa com causa.
Não beba o eco ou o cio
que brota de versos alheios.
Não se banhe duas vezes
no mesmo vazio,
mesmo estando cheio.
Não caminhe por estradas conhecidas
nem queira novas perguntas
para suas velhas respostas.
Não se imite,
perca-se no caminho da volta.
O Egito é um país de muitos contrastes. Contrastes sociais, contrastes políticos, contrastes religiosos e esses contrastes você vê na rua, prédios milionários ao lado de miséria. Cairo parece uma grande favela, mas eu aprendi com isso que eles se importam mais com o interior. Por fora, sem tinta, sem embolso, sem cor, mas por dentro tapetes caros, lustres luxuosos, corrimãos de ouro. Contrates. Adultos brigões e nervosos, crianças sorridentes e amigáveis. Contrates... Contraste religioso, um pregando a paz através da tolerância, da aceitação dos diferentes o outro da aniquilação sumária do oposto. Contraste. Contraste político. Um governo populista que roubou em um ano o que o governo militar roubou em trinta. Extremos. No museu, só o esquife do Tutankamon tem mais de uma tonelada e meia de ouro maciço, na rua pobreza. Vai levar tempo pra eu digerir tudo o que eu vi, vai levar tempo pra eu compreender esse mundo. Mais uma coisa é certa, eu compreendi logo de cara que o que importa é o que está aqui dentro. Não importa o que as pessoas vêm, não importa. Só importa o que está dentro de nós. Aqui dentro... um coração de ouro... para amar... aqui dentro, uma mente iluminada, inteligente o suficiente pra saber que ela é limitada e que tem muito a aprender. Porque para uma mente expandir ela não pode se isolar em extremos, ela tem que fazer curvas como o Nilo. E acho que muito mais do que conhecer tudo isso, eu conheci a mim mesmo.
Não tenho visão, sou visionário
no dicionário dos pequenos.
Não tenho calma, trago na palma
a alma dos mais, a alma dos menos.
Não tenho fama, sou difamado
pelos mais amados, pelos mais amenos.
Não tenho abrigo, sou amigo das estradas,
das madrugadas, do sereno.
Não tenho dor, vivo doendo.
Não faço versos,
os versos, em mim, vão se fazendo.
Quanta coisa me trava:
o medo, a solidão, a palavra.
Quanta coisa me cala:
a dor, o desejo, a fala.
Quanta coisa me cria:
a palavra, a fala, a poesia.
Palavro termos ternos,
buscando no efêmero
o que tenho de eterno.
A solidão vocabulizo
e, em cada rima perdida,
em cada rumo que tomo na vida,
eu me poetizo.
ESPECTRO DEIFICADO
"Deificar o meu espectro me torna escape
Da instalação de estradas estratosféricas.
Senão, o mesmo rio que me engolfou
Secando em desencontros do visto da janela
Me tornaria capaz de ser ao mesmo tempo
Vida de dístico, fundo do estilo,
Eixo do sinistro e prumo da embocadura."
CAROLINE PINHEIRO DE MORAES GUTERRES