Reflexões de Mário Quintana
O adolescente
A vida é tão bela que chega a dar medo,
Não o medo que paralisa e gela,
estátua súbita,
mas
esse medo fascinante e fremente de curiosidade
que faz
o jovem felino seguir para a frente farejando o vento
ao sair, a primeira vez, da gruta.
Medo que ofusca: luz!
Cumplicentemente,
as folhas contam-te um segredo
velho como o mundo:
Adolescente, olha! A vida é nova…
A vida é nova e anda nua
– vestida apenas com o teu desejo!
O amigo
Amigo é a criatura que escuta todas as nossas coisas sem aquela cara
que parece estar dizendo: – E eu com isso?
O mais espantoso nos velhos é a sua falta de pressa, como se eles dispusessem de todo o tempo que teriam os moços se não tivessem tanta pressa.
Só o poeta é que tem de lidar com a ingrata linguagem alheia...
A impura linguagem dos homens!
Ser poeta não é uma maneira de escrever. É uma maneira de ser.
Não pretendo que a poesia seja um antídoto para a tecnocracia atual. Mas sim um alívio. Como quem se livra de vez em quando de um sapato apertado e passeia descalço sobre a relva, ficando assim mais próximo da natureza, mais por dentro da vida. Porque as máquinas um dia viram sucata. A poesia, nunca.
O problema, seu poeta, é ocupar o espírito sem ao mesmo tempo estraçalhá-lo.
A tarde é uma tartaruga com o casco pardacento de poeira, a arrastar-se interminavelmente. Os ponteiros estão esperando por ela. Eu só queria saber quem foi que disse que a vida é curta...
Como é que pode escrever certo quem não sabe ao certo o que procura dizer?
Mas se a vida é tão curta como dizes
por que é que me estás lendo até agora?
As religiões cresceram entre os humildes porque aqueles que estavam por cima já se julgavam no paraíso.
O bicho,
quando quer fugir dos outros,
faz um buraco na terra.
O homem,
para fugir de si,
fez um buraco no céu.
Velhice é quando um dia as moças começam a nos tratar com respeito e os rapazes sem respeito nenhum.
Há dois sinais de envelhecimento. O primeiro é desprezar os jovens. O outro é quando a gente começa a adulá-los.
Deve ser o fio de vida que vai unindo, pedaço a pedaço, essa colcha de retalhos que é a história do mundo.