Reflexões de Mário Quintana

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E agora pedem-me que fale sobre mim mesmo. nunca escrevi uma vírgula que não fosse uma confissão. Ah! mas o que querem são detalhes, cruezas, fofocas...Aí vai!

Um poema tanto mais belo é quanto mais parecido for com o cavalo. Por não ter nada de mais nem nada de menos é que o cavalo é o mais belo ser da Criação.

Mario Quintana
Caderno H, Editora Globo - Porto Alegre, 1973

Se um poeta falar num gato
Se o poeta falar num gato, numa flor,
Num vento que anda por descampados e desvios
E nunca chegou à cidade...
Se falar numa esquina mal e mal iluminada...
Numa antiga sacada... num jogo de dominó...
Se falar naqueles obedientes soldadinhos de chumbo
[ que morriam de verdade...
Se falar na mão decepada no meio de uma escada de caracol...
Se não falar em nada
E disser simplesmente tralalá... Que importa?
Todos os poema são de amor!

Nunca dês um nome ao rio. Sempre há outro rio a passar.

A gente não sabia

A gente ainda não sabia que a Terra era redonda.
E pensava-se que nalgum lugar, muito longe,
Deveria haver num velho poste uma tabuleta
[qualquer
- uma tabuleta meio torta
E onde se lia em letras rústicas: FIM DO MUNDO.
Ah! depois nos ensinaram que o mundo não tem
[fim
E não havia remédio senão iremos andando às
[tontas
Como formigas na casca de uma laranja.
Como era possível, como era possível, meu Deus,
Viver naquela confusão?
Foi por isso que estabelecemos uma porção de
fins de mundo...

A maioria das gentes vive de convicção e não de idéias.

As únicas coisas eternas são as nuvens.

A vida não é um jogo onde só quem testa seus limites é que leva o prêmio.

Hai-Kai da Palavra Andorinha

A palavra andorinha
Freme devagarinho
E some em silêncio...

Germinal

Planta
Com emoção
Este verso em teu coração

Frases felizes...Frases encantadas... Ó festa dos ouvidos! Sempre há tolices muito bem ornadas... Como há pacóvios bem vestidos.

Não penses compreender a vida nos autores. Nenhum disso é capaz. Mas à medida que vivendo fores, melhor os compreenderás.

Os guarda-chuvas perdidos… onde vão parar os guarda-chuvas perdidos ? E os botões que se desprenderam ? E as pastas de papéis, os estojos de pince-nez, as maletas esquecidas nas gares, as dentaduras postiças, os pacotes de compras, os lenços com pequenas economias, onde vão parar todos esses objetos heteróclitos e tristes ? Não sabes ? Vão parar nos anéis de Saturno, são eles que formam, eternamente girando, os estranhos anéis desse planeta misterioso e amigo.

Quando o silêncio a dois se torna cômodo.

Nunca me acertei bem com os padres, os críticos e com os canudinhos de refresco.

Se nunca nasceste de ti mesmo, dolorosamente, na concepção de um poema... estás enganado: para os poetas não existe parto sem dor.

Mario Quintana
Trecho de carta. In: A vaca e o hipogrifo. Rio de Janeiro: Objetiva, 2012.

Amanhecer
O sol derrama, na calçada,
a sua bela, matinal urinada

Um engano em bronze é um engano eterno.

Hai-Kai da Cozinheira

A cozinheira preta preta
Preta e gorda
Com seu frescor sorriso de lua...

INSCRIÇÃO PARA UMA LAREIRA
Em meio aos toros que desabam, cantemos a canção das chamas.