Reflexões de Mário Quintana
Como é teu nome, meninazinha de olhos verdes?
E ela lhes dirá.
Ela lhes dirá bem devagarinho, para que não esqueçam:
— O meu nome é Es-pe-ran-ça...
Quando eu morrer e no frescor de lua
Da casa nova me quedar a sós,
Deixa-me em paz na minha quieta rua...
Nada mais quero com nenhum de vós!
Quero é ficar com algumas poemas tortos
Que andei tentando endireitar em vão...
Que lindo a Eternidade, amigos mortos,
Para as torturas lentas da Expressão!...
Eu levarei comigo as madrugadas,
Pôr de sóis, algum luar, asas em bando,
Mais o rir das primeiras namoradas...
E um dia a morte há de fitar com espanto
Os fios de vida que eu urdi, cantando,
Na orla negra do seu negro manto...
Ah! quanta vez a vida nos revela que "a saudade da amada criatura" é bem melhor do que a presença dela.
DA ANÁLISE
Eis um problema! E cada sábio nele aplica
As suas lentes abismais.
Mas quem com isso ganha é o problema, que fica
Sempre com um X a mais...
E agora pedem-me que fale sobre mim mesmo. Bem! eu sempre achei que toda confissão não transfigurada pela arte é indecente. Minha vida está nos meus poemas, meus poemas são eu mesmo, nunca escrevi uma vírgula que não fosse uma confissão. Mas o que querem são detalhes, cruezas, fofocas.
DO ESPÍRITO E DO CORPO
O espírito é variável como o vento,
Mais coerente é o corpo, e mais discreto...
Mudaste muita vez de pensamento,
Mas nunca de teu vinho predileto...
Não, a pior tragédia não é a que tomba inesperada, rápida, definitiva e única como um raio e que pode ser atribuída a castigo divino...Mas a que se arrasta quotidianamente, surdamente, monótona como chuva miudinha.
Em cima do meu telhado,
Pirulin lulin lulin,
Um anjo, todo molhado,
Soluça no seu flautim.
O relógio vai bater;
As molas rangem sem fim.
O retrato na parede
Fica olhando para mim.
E chove sem saber por quê...
E tudo foi sempre assim!
Parece que vou sofrer:
Pirulin lulin lulin...
O que têm de bom as nossas mais caras recordações é que elas geralmente são falsas.