Poetas Brasileiros

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Eu quero o pensar-sentir hoje e, não, tê-lo apenas tido ontem ou ir tê-lo amanhã. Tenho certa pressa em sentir tudo.

Clarice Lispector
Um sopro de vida. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

Há um tipo de choro bom e há outro ruim. O ruim é aquele em que as lágrimas correm sem parar e, no entanto, não dão alívio. Só esgotam e exaurem. (...)
Homem chorar comove. Ele, o lutador, reconheceu sua luta às vezes inútil. Respeito muito o homem que chora. Eu já vi homem chorar.

Clarice Lispector
A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trecho da crônica Quando chorar.

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Quem não tem pobreza de dinheiro tem pobreza de espírito ou saudade por lhe faltar coisa mais preciosa que ouro – existe a quem falte o delicado essencial.

Clarice Lispector
A hora da estrela. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

Sei que as coisas são complicadas. Mas são ao mesmo tempo simples. Elas se complicam à medida em que se tem medo da simplicidade – porque essa simplicidade seja o fato em si, a verdade.

Clarice Lispector
Minhas queridas. Rio de Janeiro: Rocco, 2007.

Nota: Trecho de carta para Tania Kaufmann, escrita em 13 de agosto de 1947.

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Deus, o que nos prometeis em troca de morrer? Pois o céu e o inferno nós já os conhecemos - cada um de nós em segredo quase de sonho já viveu um pouco do próprio apocalipse. E a própria morte.

Clarice Lispector
A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trecho da crônica Morte de uma baleia.

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Porque enquanto eu amar a um Deus só porque não me quero, serei um dado marcado, e o jogo de minha vida maior não se fará. Enquanto eu inventar Deus, Ele não existe.

Clarice Lispector
Todos os contos. Rio de Janeiro: Rocco, 2016.

Nota: Trecho do conto Perdoando Deus.

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Procuro alguém não para me encontrar e sim para me perder.

E então eu soube: pertencer é viver.

Clarice Lispector
A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trecho da crônica Pertencer.

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A esperança também não tem número. Perder uma coisa é inefável: nunca sei onde as coloquei. (...) Ser é de um provisório impalpável. (...) Juro que preciso de soluções. Não posso ficar assim completamente no ar.

Clarice Lispector
A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trechos da crônica Perdão, explicação e mansidão.

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Ora, não sou linda. Mas quando estou cheia de esperança, então de minha pessoa se irradia algo que talvez se possa chamar de beleza.

Clarice Lispector
A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trecho da crônica Adeus, vou-me embora!

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Viver é extremamente tolerável, viver ocupa e distrai, viver faz rir.

Clarice Lispector
A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.

Nota: Trecho da crônica Atualidade do ovo e da galinha (III, Final)

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Às vezes escrever uma só linha basta para salvar o próprio coração.

Clarice Lispector
Um sopro de vida. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

Nunca me acertei bem com os padres, os críticos e com os canudinhos de refresco.

O resultado disso tudo é que vou ter que criar um personagem – mais ou menos como fazem os novelistas, e através da criação dele para conhecer. Porque eu sozinho não consigo: a solidão, a mesma que existe em cada um, me faz inventar. E haverá outro modo de salvar-se? senão o de criar as próprias realidades? Tenho força para isso como todo o mundo – é ou não é verdade que nós terminamos por criar uma frágil e doida realidade que é a civilização? essa civilização apenas guiada pelo sonho. Cada invenção minha soa-me como uma prece leiga – tal é a intensidade de sentir, escrevo para aprender.

Clarice Lispector
Um sopro de vida. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

Este ao que suponho será um livro feito aparentemente por destroços de livro. Mas na verdade trata-se de retratar rápidos vislumbres meus e rápidos vislumbres de meu personagem Ângela. Eu poderia pegar cada vislumbre e dissertar durante páginas sobre ele. Mas acontece que no vislumbre é às vezes que está a essência da coisa. Cada anotação tanto no meu diário como no diário que eu fiz Ângela escrever, levo um pequeno susto. Cada anotação é escrita no presente. O instante já é feito de fragmentos. Não quero dar um falso futuro a cada vislumbre de um instante. Tudo se passa exatamente na hora em que está sendo escrito ou lido. Este trecho aqui foi na verdade escrito em relação à sua forma básica depois de ter relido o livro porque no decorrer dele eu não tinha bem clara a noção do caminho a tomar. No entanto, sem dar maiores razões lógicas, eu me aferrava exatamente em manter o aspecto fragmentário tanto em Ângela quanto em mim.
Minha vida é feita de fragmentos e assim acontece com Ângela. A minha própria vida tem enredo verdadeiro. Seria a história da casca de uma árvore e não da árvore. Um amontoado de fatos em que só a sensação é que explicaria. Vejo que, sem querer, o que escrevo e Ângela escreve são trechos por assim dizer soltos, embora dentro de um contexto de...
É assim que desta vez me ocorre o livro. E, como eu respeito o que vem de mim para mim, assim mesmo é que eu escrevo.

Clarice Lispector
Um sopro de vida. Rio de Janeiro: Rocco, 2015.

Estou dentro dos grandes sonhos da noite: pois o agora-já é de noite. E canto a passagem do tempo: sou ainda a rainha dos medas e dos persas e sou também a minha lenta evolução que se lança como uma ponte levadiça em um futuro cujas névoas leitosas já respiro hoje. Minha aura é mistério de vida. Eu me ultrapasso abdicando de mim e então sou o mundo: sigo a voz do mundo, eu mesma de súbito com voz única.

Clarice Lispector
Água viva. Rio de Janeiro: Editora Rocco, 1998.

Sede assim qualquer coisa serena, isenta, fiel. Não como o resto dos homens.

Cecília Meireles
MEIRELES, C. Antologia Poética. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 2001.

Nota: Trecho do poema "Sugestão": Link

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E nós sabemos Deus. E o que precisamos Dele, extraímos. (Não sei o que chamo de Deus, mas assim pode ser chamado.) Se só sabemos muito pouco de Deus, é porque precisamos pouco: só temos Dele o que fatalmente nos basta, só temos de Deus o que cabe em nós. (A nostalgia não é do Deus que nos falta, é a nostalgia de nós mesmos que não somos bastante; sentimos falta de nossa grandeza impossível – minha atualidade inalcançável é o meu paraíso perdido.)

Clarice Lispector
A paixão segundo G. H. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

Eu fora obrigada a entrar no deserto para saber com horror que o deserto é vivo, para saber que uma barata é a vida. Havia recuado até saber que em mim a vida mais profunda é antes do humano – e para isso eu tivera a coragem diabólica de largar os sentimentos. Eu tivera que não dar valor humano à vida para poder entender a largueza, muito mais que humana, do Deus. Havia eu pedido a coisa mais perigosa e proibida? arriscando a minha alma, teria eu ousadamente exigido ver Deus?

E agora eu estava como diante Dele e não entendia – estava inutilmente de pé diante Dele, e era de novo diante do nada. A mim, como a todo o mundo, me fora dado tudo, mas eu quisera mais: quisera saber desse tudo. E vendera a minha alma para saber. Mas agora eu entendia que não a vendera ao demônio, mas muito mais perigosamente: a Deus. Que me deixara ver. Pois Ele sabia que eu não saberia ver o que visse: a explicação de um enigma é a repetição do enigma. O que És? e a resposta é: És. O que existes? e a resposta é: o que existes. Eu tinha a capacidade da pergunta, mas não a de ouvir a resposta.

Clarice Lispector
A paixão segundo G. H. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

A barata e eu somos infernalmente livres porque a nossa matéria viva é maior que nós, somos infernalmente livres porque minha própria vida é tão pouco cabível dentro de meu corpo que não consigo usá-la. Minha vida é mais usada pela terra do que por mim, sou tão maior do que aquilo que eu chamava de “eu” que, somente tendo a vida do mundo, eu me teria.

Clarice Lispector
A paixão segundo G. H. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.