Poetas Brasileiros
Naquele carnaval, pois, pela primeira vez na vida eu teria o que sempre quisera: ia ser outra que não eu mesma.
Criar sim, mentir não. Criar não é imaginação, é correr o grande risco de se ter a realidade.
Eu não sou uma sonhadora. Só devaneio para alcançar a realidade.
Estou aqui de vez em quando muito delicada, me interessam principalmente flores e passarinhos.
Somente uma coisa me faria bem agora. Seria adormecer com a cabeça no seu colo, você me dizendo bobagenzinhas gostosas pra eu esquecer a ruindade do mundo.
Universo
O que vi do universo
até hoje foi pouco
mas, se penso em quanto meço,
posso dizer que foi muito.
Sei, de ler, que o universo
é de tais dimensões
que a própria luz só o atravessa
depois e bilhões e bilhões
de anos, e que nele há
multidões de galáxias e sóis
que talvez já morreram, antes
de chegar a sua luz até nós.
Deste modo, é correto dizer
que o céu que ora espio é passado
e que até pode ser que
o universo que veja já tenha se acabado.
Mas, de fato, não vejo
a não ser nas revistas
de astronomia: o lampejo
espantoso de infinitas
constelações a brilhar
num abismo espectral e difuso
de gases e poeira estelar
que me deixa confuso.
E assim, assustado e mudo,
bem menor que um ínfimo
grão de poeira, contudo,
sou capaz de apreender, no meu íntimo,
essas incontáveis galáxias,
esses espaços sem fim,
essa treva e explosões de lava.
Como tudo isso cabe em mim?
O fato é que qualquer vasta nuvem
prenhe de sóis já mortos ou futuros
não possui consciência, esse obscuro
fenômeno surgido aqui na Via Láctea,
ou melhor, na Terra, e talvez
somente nela, não se sabe por quê,
mas que permite ao cosmos perceber-se
a si mesmo, e ter olhos pra se ver.
Olhos que são nossos,
lentes minúsculas mas sensíveis
que captam a luz das nebulosas
vinda de espaço e tempo inconcebíveis.
É o que dizem, pois tudo
o que vejo é, à noite, apenas o brilhar
de distantes luzes no escuro.
São estrelas? planetas no sistema solar?
Somos algo recente e raro
no universo, como rara
é também a própria luz
dos sóis deste sol que nos aclara.
Todo universo é treva.
Inalcançável vastidão escura
dentro da qual os sóis, as explosões
de gás e luz são exceções.
O universo em sua vastidão vazia
é espaço e treva, é matéria fria
em que não há o mínimo sinal
de vida ou consciência; o que é mental
nele, ao que se sabe, está em nós,
no mínimo do mínimo do existente
e o que também ma treva luze é nossa VOZ
inaudível no espantoso vão silente,
Vi pouco do universo: afora a asa
de luz e pó da Via Láctea, o que conheço
são as manhãs que invadem minha casa.
ATÉ QUANDO TERÁS, MINHA ALMA, ESTA DOÇURA
Até quando terás, minha alma, esta doçura,
este dom de sofrer, este poder de amar,
a força de estar sempre _ insegura _ segura
como a flecha que segue a trajetória obscura,
fiel ao seu movimento, exata em seu lugar...?
[O sentido da minha vida] é inventado a cada momento, mas é claro que eu necessito da poesia, eu necessito da arte, eu necessito de estar discutindo essas coisas, de estar pensando nessas coisas que dão transcendência à vida. Eu não tenho dúvida alguma de que a arte é necessária porque a vida não é suficiente, porque senão qual era a necessidade de inventar a arte? A necessidade é essa: as pessoas necessitam dela, por mais que aconteça coisa no mundo, a arte sobrevive, como uma forma de acordo com o momento, com a época, ela é uma coisa necessária, como a ciência é necessária, como a filosofia é necessária, como a religião é necessária, como a política é necessária.
Herança
Eu vim de infinitos caminhos,
e os meus sonhos choveram lúcido pranto
pelo chão.
Quando é que frutifica, nos caminhos infinitos,
essa vida, que era tão viva, tão fecunda,
porque vinha de um coração?
E os que vierem depois, pelos caminhos infinitos,
do pranto que caiu dos meus olhos passados,
que experiência, ou consolo, ou prêmio alcançarão?
DA ANÁLISE
Eis um problema! E cada sábio nele aplica
As suas lentes abismais.
Mas quem com isso ganha é o problema, que fica
Sempre com um X a mais...
E fala e ri e gesticula e grita.
(teus olhos)
entrava-nos alma adentro
e via esta lama podre
e com pesar nos fitava
e com ira amaldiçoava
e com doçura perdoava.
Mundo Engraçado
O mundo está cheio de coisas engraçadas; quem se quiser distrair não precisa ir à Pasárgada do Bandeira, nem à minha Ilha do Nanja; não precisa sair de sua cidade, talvez nem da sua rua, nem da sua pessoa! (Somos engraçadíssimos, também, com tantas dúvidas, audácias, temores, ignorância, convicções...)
Abre-se um jornal – e tudo é engraçado, mesmo o que parece triste. Cada fato, cada raciocínio, cada opinião nos faria sorrir por muitas horas, se ainda tivéssemos horas disponíveis.
Há os mentirosos, por exemplo. E pode haver coisa mais engraçada que o mentiroso? Ele diz isto e aquilo, com a maior seriedade; fala-nos de seus planos; de seus amigos (poderosos, influentes, ricos); queixa-se de algumas perseguições (que aliás, profundamente despreza); às vezes conta-nos que foi roubado em algum quadro célebre ou numa pedra preciosa, oferecida à sua bisavó pelo Primeiro Ministro da Cochinchina. O mentiroso conhece as maiores personalidades do Mundo – trata-as até por tu! Seus amores são a coisa mais poética do século. Suas futuras viagens prometem ser as mais sensacionais, depois dessas banalidades de UIisses e Simbad... Certamente escreverá o seu diário, mas não o publicará jamais, porque é preciso um papel que não existe, um editor que ainda não nasceu e um leitor que terá de sofrer várias encarnações para ser digno de o entender.
Em geral os mentirosos são muito agradáveis, desde que não se tome como verdade nada do que dizem. E esse é o inconveniente: às vezes, leva-se algum tempo para se fazer a identificação. Uma vez feita, porém, que maravilha! – é só deixá-los falar. É como um sonho, uma história de aventuras, um filme colorido.
Há também os posudos. Os posudos ainda são mais engraçados que os mentirosos e geralmente acumulam as funções. O que os torna mais engraçados é serem tão solenes. Os posudos funcionários são deslumbrantes! Como se sentam à sua mesa! Como consertam os óculos! Que coisas dizem! As coisas que dizem são poemas épicos com a fita posta ao contrário. Não se entende nada – mas que diapasão! Que delicadas barafundas! Que sons! Que ritmos! Seus discursos e as palmas que os acompanham conseguem realizar o prodígio de serem a coisa mais cômica da terra pronunciada no tom mais sério, mais grave, mais trágico – de modo que o ouvinte, que rebenta de rir por dentro, sofre uma atrapalhação emocional e consegue manter-se estático, paralisado, equivocado.
Os posudos, porém, são menos agradáveis que os simples mentirosos. Os mentirosos têm um jeito frívolo, como se andassem acompanhados de um criado que anunciasse: "Não creiam em nada do que o meu amo diz!" Mas os posudos levam um séqüito de criados, todos posudos também, que recolhem nas sacolas, grandes e pequenas gorjetas, porque uma das qualidades do posudo é andar sempre com muito dinheiro – que não é seu!
Como aceitara ir
no meu destino de mar,
preferi essa estrada,
para lá chegar,
que dizem da ribeira
e à costa vai dar,
que deste mar de cinza
vai a um mar de mar;
preferi essa estrada
de muito dobrar,
estrada bem segura
que não tem errar
pois é a que toda a gente
costuma tomar
(na gente que regressa
sente-se cheiro de mar).
...E ela virá me abrir a porta como se fosse uma velha amante. Sem saber que é a minha mais nova namorada...
Soneto Inglês nº2
Aceitar o castigo imerecido
não por fraqueza, mas por altivez.
no tormento mais fundo o teu gemido
trocar num grito de ódio a que o fez.
As delícias da carne e pensamento
com que o instinto da espécie nos engana,
sobpor ao generoso sentimento
de uma afeição mais simplesmente humana.
Não tremer de esperança e nem de espanto.
Nada pedir nem desejar senão a coragem
De ser um novo santo. sem fé num mundo além do mundo.
E então morrer sem uma lágrima que a vida
Não vale a pena e a dor de ser vivida.
"Ser feliz sem motivo é a mais autêntica forma de felicidade".
Se O Mestre Diz, Eu Não "dizdigo",
Mas... Que Ele Me Desculpe, Pois Tenho Você,
Hoje, Como O Meu....HHHHUUUMMM !!!! Melhor Motivo !!!!!
Beijos....!!! Abraços....!!!! Muito Cheiro...HHHUUUMMM...
Nota: Trecho do livro "O Avesso das Coisas" de Carlos Drummond de Andrade. Link
E agora pedem-me que fale sobre mim mesmo. Bem! eu sempre achei que toda confissão não transfigurada pela arte é indecente. Minha vida está nos meus poemas, meus poemas são eu mesmo, nunca escrevi uma vírgula que não fosse uma confissão. Mas o que querem são detalhes, cruezas, fofocas.