Poetas Brasileiros
Esta minha estatuazinha de gesso, quando nova
— O gesso muito branco, as linhas muito puras —
Mal sugeria imagem de vida
(Embora a figura chorasse).
Há muitos anos tenho-a comigo.
O tempo envelheceu-a, carcomeu-a, manchou-a de pátina amarelo-suja.
Os meus olhos, de tanto a olharem,
Impregnaram-na da minha humanidade irônica de tísico.
Um dia mão estúpida
Inadvertidamente a derrubou e partiu.
Então ajoelhei com raiva, recolhi aqueles tristes fragmentos, recompus a figurinha que chorava.
E o tempo sobre as feridas escureceu ainda mais o sujo mordente da pátina...
Hoje este gessozinho comercial
É tocante e vive, e me fez agora refletir
Que só é verdadeiramente vivo o que já sofreu.
Riso
Às vezes nem precisa de motivo
É a tal felicidade que não cabe no peito e transborda
De certo sentir que "de repente do pranto, fez-se o riso"
O descontrole físico que não passa despercebido, cada passo, gesto, berro, é belo aos olhos de quem pode enxergar
O contentamento de ser o que se é, sem nem perceber
A risibilidade volátil existente na linha tênue que é viver
Implacável e maçante para quem não consegue entender que nem todo dia é dia de prantear.
Tua sedução é menos
de mulher do que de casa:
pois vem de como é por dentro
ou por detrás da fachada.
Mesmo quando ela possui
tua plácida elegância,
esse teu reboco claro,
riso franco de varandas,
uma casa não é nunca
só para ser contemplada;
melhor: somente por dentro
é possível contemplá-la.
Seduz pelo que é dentro,
ou será, quando se abra;
pelo que pode ser dentro
de suas paredes fechadas;
pelo que dentro fizeram
com seus vazios, com o nada;
pelos espaços de dentro,
não pelo que dentro guarda;
pelos espaços de dentro:
seus recintos, suas áreas,
organizando-se dentro
em corredores e salas,
os quais sugerindo ao homem
estâncias aconchegadas,
paredes bem revestidas
ou recessos bons de cavas,
exercem sobre esse homem
efeito igual ao que causas:
a vontade de corrê-la
por dentro, de visitá-la.
"mil intrigas, mil enredos
prendem culpados e justos;
já ninguém dorme tranquilo
que a noite é um mundo de sustos"
"Mas eu vagueio sozinha,
pela sombra do quintal,
e penso em meu triste corpo,
que não posso levantar"
Pensei que era apenas demora,
E cantando pus-me a esperar-te.
Permita que agora emudeça:
Que me conforme em ser sozinha.
(...)
Quisera abandonar-te, negar-te, fugir-te,
mas curioso:
já não estás, e te sinto,
E tanto me falas, e te converso.
E tanto nos entendemos, no escuro,
no pó, no sono.
"E percebo os suspiros dos amores
quando por esses prados florescentes
se ergueram duros punhos agressores"
A rosa de hiroxima Pensem nas crianças
mudas e telepáticas Pensem nas meninas cegas inexatas Pensem nas mulheres rotas alteradas Pensem nas feridas como rosas cálidas Mais oh não se esqueçam da rosa da rosa da rosa de hiroxima Da rosa hereditária Da rosa radioativa Estupida e inválida A anti rosa atomica Sem cor sem perfume Sem rosa sem nada
Longe do estéril turbilhão da rua,
Beneditino escreve! No aconchego
Do claustro, na paciência e no sossego,
Trabalha e teima, e lima, e sofre, e sua!
Sei só até onde sou,
contemporânea de mim.
O aforismo constitui uma das maiores pretensões da inteligência, a de reger a vida.
Tudo é mais simples diante de um copo d’água.