Poetas Brasileiros
É sempre nos meus pulos o limite
É sempre nos meus lábios a estampilha
É sempre no meu não aquele trauma.
A bênção, Bahia
Olorô, Bahia
Nós viemos pedir sua bênção, saravá!
Hepa hê, meu guia
Nós viemos dormir no colinho de lemanjá!
Nanã Borokô fazer um Bulandê
Efó, caruru e aluá
Pimenta bastante pra fazer sofrer
Bastante mulata para amar
Fazer juntó
Meu guia, hê
Seu guia, hê
Bahia!
Saravá, senhora
Nossa mãe foi-se embora pra sempre do Afojá
A rainha agora
É Oxum, é a mãe Menininha do Gantois
Pedir à mãe Olga do Alakêto, hê
Chamar Inhansã para dançar
Xangô, rei Xangô, Kabueci-elê
Meu pai! Oxalá, hepa babá!
A bênção, mãe
Senhora mãe
Menina mãe
Rainha!
Olorô, Bahia
Nós viemos pedir sua bênção, saravá!
Hepa hê, meu guia
Nós viemos dormir no colinho de lemanjá!
Coisas
Uma rãzinha verde no gris da manhã...
Um sorriso na face de um ceguinho...
Uma nota aguda como uma pergunta de criança...
Um cheiro agradecido de terra molhada...
Um olhar que nos enche subitamente de azul...
Desconfia da tristeza de certos poetas. É uma tristeza profissional e tão suspeita como a exuberante alegria das coristas.
Dos elefantes
O único defeito dos elefantes é não serem portáteis.
( in: Da Preguiça como Método de Trabalho, 1987.)
A ausente
Amiga, infinitamente amiga
Em algum lugar teu coração bate por mim
Em algum lugar teus olhos se fecham à idéia dos meus.
Em algum lugar tuas mãos se crispam, teus seios
Se enchem de leite, tu desfaleces e caminhas
Como que cega ao meu encontro...
Amiga, última doçura
A tranqüilidade suavizou a minha pele
E os meus cabelos. Só meu ventre
Te espera, cheio de raízes e de sombras.
Vem, amiga
Minha nudez é absoluta
Meus olhos são espelhos para o teu desejo
E meu peito é tábua de suplícios
Vem. Meus músculos estão doces para os teus dentes
E áspera é minha barba. Vem mergulhar em mim
Como no mar, vem nadar em mim como no mar
Vem te afogar em mim, amiga minha
Em mim como no mar...
“A mocidade é como a primavera, / A alma, cheia de flores, resplandece, / Crê no bem, ama a vida, sonha, espera, / E a desventura facilmente esquece”.
Dentro da Noite
Ficas a um canto da sala,
Olhas-me e finges que lês..
Ainda uma vez te ouço a fala,
Olho-te ainda uma vez;
Saio... Silêncio por tudo:
Nem uma folha se agita;
E o firmamento, amplo e mudo,
Cheio de estrelas palpita.
E eu vou sozinho, pensando
Em teu amor, a sonhar,
No ouvido e no olhar levando
Tua voz e teu olhar.
Mas não sei que luz me banha
Todo de um vivo clarão;
Não sei que música estranha
Me sobe do coração.
Como que, em cantos suaves,
Pelo caminho que sigo,
Eu levo todas as aves,
Todos os astros comigo.
E é tanta essa luz, é tanta
Essa música sem par,
Que nem sei se é a luz que canta,
Se é o som que vejo brilhar.
Caminho em êxtase, cheio
Da luz de todos os sóis,
Levando dentro do seio
Um ninho de rouxinóis.
E tanto brilho derramo,
E tanta música espalho,
Que acordo os ninhos e inflamo
As gotas frias do orvalho.
E vou sozinho, pensando
Em teu amor, a sonhar,
No ouvido e no olhar levando
Tua voz e teu olhar.
Caminho. A terra deserta
Anima-se. Aqui e ali,
Por toda parte desperta
Um coração que sorri.
Em tudo palpita um beijo,
Longo, ansioso, apaixonado,
E um delirante desejo
De amar e de ser amado.
E tudo, - o céu que se arqueia
Cheio de estrelas, o mar,
Os troncos negros, a areia,
- Pergunta, ao ver-me passar:
"O Amor, que a teu lado levas,
A que lugar te conduz,
Que entras coberto de trevas,
E sais coberto de luz?
De onde vens? que firmamento
Correste durante o dia,
Que voltas lançando ao vento
Esta inaudita harmonia?
Que país de maravilhas,
Que Eldorado singular
Tu visitaste, que brilhas
Mais do que a estrela polar?"
E eu continuo a viagem,
Fantasma deslumbrador,
Seguido por tua imagem,
Seguido por teu amor.
Sigo... Dissipo a tristeza
De tudo, por todo o espaço,
E ardo, e canto, e a Natureza
Arde e canta, quando eu passo,
- Só porque passo pensando
Em teu amor, a sonhar,
No ouvido e no olhar levando
Tua voz e teu olhar...
É preciso saber sentir, mas também como deixar de sentir.
Os anjos não compreendem os homens.
Quando um amigo morre, uma coisa não lhe perdoamos: como nos deixou assim sem mais nem menos, assim no ar, em meio de algo que lhe queríamos dizer ou – pior ainda – em meio do silêncio a dois no bar costumeiro? Que outros hábitos, que outras relações terá ele arranjado? Que novas aventuras ou desventuras de que não nos conta nada?