Poesias de Rubem Alves
"O amor é a coragem de abraçar a falta que somos, de plantar jardins em terrenos vazios, sabendo que nunca serão só nossos, mas que florescerão para o mundo."
Tempestade
Sua beleza sem perfume, seu sorriso me envolvia, seu beijo quente a alma fria.
Mas no meu peito eu te queria...
Na incerteza de meus passos, sobre a ponte da ilusão, seu olhar me penetrava bem castanho a escuridão.
Ninguém sabia da verdade, muito menos da mentira.
Você sorria algo queria se me chamasse, eu logo iria.
Cortando a vinha da cidade cinza, onde se esmaga a solidão.
Dançando com a sorte, mais rápido que a morte.
Fez da loucura o seu galope, depois sumiu na multidão.
Foi quando a carne virou pedra, e sobre a brasa se aqueceu.
A boca seca molha o bico no conhaque, no gosto forte, assim esquece esse desastre...
Felipe Almaz
E o que resta da vida se um homem não pode escutar o choro solitário de um pássaro ou coaxar dos sapos à volta de uma lagoa à noite?
A chegada faz parte da vida. A despedida faz pate da vida [...] Sem a Morte, a Vida também não existiria, pois a vida é, precisamente, uma permanente despedida.
Quem tem muitas esperanças é um monte de cacos de vidro. Quem tem uma única esperança, é um vitral colorido de uma catedral.
As flores dos flamboyants, dentro de poucos dias, terão caído. Assim é a vida. É preciso viver enquanto a chama do amor está queimando...
"Penso que borboletas, seres alados, diáfanos e coloridos, devem ser emissários dos deuses, anjos que anunciam coisas do amor. Imaginei então que aquela borboleta era um anjo disfarçado que os deuses me enviavam com uma promessa de felicidade."
"Os que têm medo sonham. Porque tenho medo da cidade grande onde me perco eu sonho com cidade grande que posso amar. É uma utopia. Não existe. Mas não tem importância. Valéry perguntou: “Que seria de nós sem o socorro das coisas que não existem?” O que não existe socorre. Oscar Wilde, que sabia do socorro das coisas que não existem, escreveu: “Um mapa do mundo que não inclua o país da Utopia não merece nem mesmo um olhar, pois ignora o único país ao qual a Humanidade constantemente chega. E quando a Humanidade lá atraca, fica alerta, e levanta novamente as âncoras ao vislumbrar terra melhor…”."
Meus sonhos? Sonho em ter tempo para curtir as montanhas e cachoeiras das Minas Gerais. Sonho em ter tempo para vagabundear. Sonho em ter tempo para brincar com minhas netas. Sonho em escrever uns livros que estão na minha cabeça e que não consigo escrever por falta de tempo.
"No paraíso não havia templos. Deus andava pelo jardim, extasiado, dizendo: 'Como é belo! Como é belo!'. A beleza é a face visível de Deus". (Em Se eu pudesse viver minha vida de novo)
São os que sofrem que produzem a beleza, para parar de sofrer. Esses são os artistas. Beethoven – como é possível que um homem completamente surdo, no fim da vida, tenha produzido uma obra que canta a alegria? Van Gogh, Cecília Meireles, Fernando Pessoa…
Não, não é verdade que o sofrimento torna melhores as pessoas. O sofrimento frequentemente embrutece, tira a sensibilidade, tira a esperança, torna cruéis as pessoas. Um Deus – ou força cósmica – que usasse o sofrimento para evolução seria muito curto de inteligência – não saberia aquilo que os homens aprenderam: que a única força capaz de fazer as pessoas ficarem melhores é o amor.
Somos donos dos nossos atos, mas não somos donos dos nossos sentimentos. Somos culpados pelo que fazemos, mas não somos culpados pelo que sentimos. Podemos prometer atos. Não podemos prometer sentimentos. “Eu sei que vou te amar, por toda a minha vida vou te amor...” Lindo e mentiroso. Não se podem prometer sentimentos. Eles não dependem da nossa vontade. Sua existência é efêmera. Como o voo dos pássaros...
aprendo que o amor nada tem a ver com apego, segurança ou dependência, embora tantas vezes eu me confunda. Não adianta querer que seja diferente: o amor é alado.
Gosto de ler orações. Orações e poemas são a mesma coisa: palavras que se pronunciam a partir do silêncio, pedindo que o silêncio nos fale. A se acreditar em Ricardo Reis, é no silêncio que existe no intervalo das palavras que se ouve a voz de “um Ser qualquer, alheio a nós“, que nos fala. O nome do Ser? Não importa. Todos os nomes são metáforas para o Grande Mistério inominável que nos envolve. Gosto de ler orações porque elas dizem as palavras que eu gostaria de ter dito mas não consegui. As orações põem música no meu silêncio.
O ato de ouvir exige humildade de quem ouve. E a humildade está nisso: saber, não com a cabeça mas com o coração, que é possível que o outro veja mundos que nós não vemos. Mas isso, admitir que o outro vê coisas que nós não vemos, implica reconhecer que somos meio cegos… Vemos pouco, vemos torto, vemos errado.
Amamos não a pessoa que fala bonito, mas a pessoa que escuta bonito... A arte de amar e a arte de ouvir estão intimamente ligadas. Não é possível amar uma pessoa que não sabe ouvir.
"Mas o que me assombra mais não são as coisas que os seres humanos fazem. São os pensamentos que eles pensam."
Nos quarenta anos em que peregrinou pelo deserto, o povo de Israel, segundo conta a estória, foi alimentado por um alimento que caía dos céus durante a noite. As pessoas tinham permissão para colher desse alimento, o maná, na medida de suas necessidades. Só para o dia. Alguns, com medo de que o maná não caísse no dia seguinte, colheram em dobro, por via das dúvidas... Mas, quando foram comer o maná poupado, viram que ele estava apodrecido, cheio de bichos. Talvez isso queira dizer que a vida há de ser colhida diariamente. Quem deseja economizar o hoje para o amanhã fica com a vida apodrecida nas mãos.
Quanto maior a beleza, maior também a tristeza. A beleza em solidão é sempre triste. Beleza solitária dá vontade de chorar. Para ser boa, a beleza exige, pelo menos, dois pares de olhos tranquilos se olhando, dois pares de mãos amigas brincando, e bocas de voz mansa sussurrando.