Poesias de Augusto dos Anjos
A árvore da serra
— As árvores, meu filho, não têm alma!
E esta árvore me serve de empecilho...
É preciso cortá-la, pois, meu filho,
Para que eu tenha uma velhice calma!
— Meu pai, por que sua ira não se acalma?!
Não vê que em tudo existe o mesmo brilho?!
Deus pôs almas nos cedros, no junquilho.
Esta árvore, meu pai, possui minh'alma!
— Disse — e ajoelhou-se, numa rogativa:
Não mate a árvore, pai, para que eu viva!
E quando a árvore, olhando a pátria serra,
Caiu aos golpes do machado bronco,
O moço triste se abraçou com o tronco
E nunca mais se levantou da terra!
AMOR E RELIGIÃO
Conheci-o: era um padre, um desses santos
Sacerdotes da Fé de crença pura,
Da sua fala na eternal doçura
Falava o coração. Quantos, oh! Quantos
Ouviram dele frases de candura
Que d'infelizes enxugavam prantos!
E como alegres não ficaram tantos
Corações sem prazer e sem ventura!
No entanto dizem que este padre amara.
Morrera um dia desvairado, estulto,
Su'alma livre para o céu se alara.
E Deus lhe disse: "És duas vezes santo,
Pois se da Religião fizeste culto,
Foste do amor o mártir sacrossanto".
Prostituição ou outro qualquer nome,
Por tua causa, embora o homem te aceite,
É que as mulheres ruins ficam sem leite
E os meninos sem pai morrem de fome!
Por que há de haver aqui tantos enterros?
Lá no "Engenho" também, a morte é ingrata...
Há o malvado carbúnculo que mata
A sociedade infante dos bezerros!
Quantas moças que o túmulo reclama!
E após a podridão de tantas moças,
Os porcos esponjando-se nas poças
Da virgindade reduzida à lama!
Morte, ponto final da última cena,
Forma difusa da matéria imbele,
Minha filosofia te repele,
Meu raciocínio enorme te condena!
Diante de ti, nas catedrais mais ricas,
Rolam sem eficácia os amuletos,
Oh! Senhora dos nossos esqueletos
E das caveiras diárias que fabricas!
Nota: Trecho de "As Cismas do Destino": Link
Soneto aos meus pares
Pobre Augusto dos Anjos
Mesmo com o passar dos anos
Ainda confundem-te
Com teu eu-poético.
Pobre Augusto dos Anjos
Conheço os teus desenganos
Fostes tão jovem levado
Mas deixastes teu legado.
Pois, na podridão dos teus versos,
Esconde-se uma verde esperança
Da transformação humana, em cristãos belos.
A resposta nunca achada,
Só poderia ser dada
Quando na morte encontrastes, a substância primária.
"Tua história se eterniza
A cada 20 de abril
Que a poesia se abriu
Para nos agraciar
Com o filho mais amado
O poeta secular
Em cada canto de Sapé
Augusto tua alma à de ficar."