Poemas de Vladimir Maiakovski
BLUSA FÁTUA
Costurarei calças pretas
com o veludo da minha garganta
e uma blusa amarela com três metros de poente.
pela Niévski do mundo, como criança grande,
andarei, donjuan, com ar de dândi.
Que a terra gema em sua mole indolência:
"Não viole o verde das minhas primaveras!"
Mostrando os dentes, rirei ao sol com insolência:
"No asfalto liso hei de rolar as rimas veras!"
Não sei se é porque o céu é azul celeste
e a terra, amante, me estende as mãos ardentes
que eu faço versos alegres como marionetes
e afiados e precisos como palitar dentes!
Fêmeas, gamadas em minha carne, e esta
garota que me olha com amor de gêmea,
cubram-me de sorrisos, que eu, poeta,
com flores os bordarei na blusa cor de gema!
(Tradução: Augusto de Campos)
Onde eu morrer
eu vou morrer cantando.
Que eu caia aqui ou lá, não importa,
eu sei.
Sou digno de ser colocado
próximo aos que tombaram sob a bandeira vermelha.
Basta de verdades baratas.
Arrancai o ranço do coração!
As ruas são nossos pincéis
e paletas as nossas praças.
No livro do tempo
ainda não foram cantadas
as mil páginas da revolução.
Para a rua, futuristas,
tambores e poetas!
Um dia, quem sabe,
ela, que também gostava de bichos,
apareça
numa alameda do zôo,
sorridente,
tal como agora está
no retrato sobre a mesa.
Ela é tão bela,
que, por certo, hão de ressuscitá-la.
Vosso Trigésimo Século
ultrapassará o exame
de mil nadas,
que dilaceravam o coração.
Então,
de todo amor não terminado
seremos pagos
em inumeráveis noites de estrelas.
Ressuscita-me,
nem que seja só porque te esperava
como um poeta,
repelindo o absurdo quotidiano!
Ressuscita-me,
nem que seja só por isso!
Ressuscita-me!
Quero viver até o fim o que me cabe!
Para que o amor não seja mais escravo
de casamentos,
concupiscência,
salários.
Para que, maldizendo os leitos,
saltando dos coxins,
o amor se vá pelo universo inteiro.
Para que o dia,
que o sofrimento degrada,
não vos seja chorado, mendigado.
E que, ao primeiro apelo:
– Camaradas!
Atenta se volte a terra inteira.
Para viver
livre dos nichos das casas.
Para que doravante
a família seja
o pai,
pelo menos o Universo,
a mãe,
pelo menos a Terra.
E então, que quereis?...
Fiz ranger as folhas de jornal
abrindo-lhes as pálpebras piscantes.
E logo
de cada fronteira distante
subiu um cheiro de pólvora
perseguindo-me até em casa.
Nestes últimos vinte anos
nada de novo há
no rugir das tempestades.
Não estamos alegres,
é certo,
mas também por que razão
haveríamos de ficar tristes?
O mar da história
é agitado.
As ameaças
e as guerras
havemos de atravessá-las,
rompê-las ao meio,
cortando-as
como uma quilha corta
as ondas.
Impossível
Sozinho não posso
carregar um piano
e menos ainda um cofre-forte.
Como poderia então
retomar de ti meu coração
e carregá-lo de volta?
Os banqueiros dizem com razão:
“Quando nos faltam bolsos,
nós que somos muitíssimo ricos,
guardamos o dinheiro no banco”.
Em ti
depositei meu amor,
tesouro encerrado em caixa de ferro,
e ando por aí
como um Creso contente.
É natural, pois,
quando me dá vontade,
que eu retire um sorriso,
a metade de um sorriso
ou menos até
e indo com as donas
eu gaste depois da meia-noite
uns quantos rublos de lirismo à toa.
Meu amado barco
Espatifou-se nas pedras da rotina
Acertei as contas com a vida
E é inútil continuar contando
Dores sofridas em mãos alheias.
As desgraças
E os insultos.
Sorte aos que ficam.
Eu
Nas calçadas pisadas
de minha alma
passadas de loucos estalam
calcâneos de frases ásperas
Onde
forcas
esganam cidades
e em nós de nuvens coagulam
pescoços de torres
oblíquas
só
soluçando eu avanço por vias que se encruzilham
à vista
de crucifixos
polícias
1913
Que os meus ideais sejam tanto mais fortes quanto maiores forem os desafios, mesmo que precise transpor obstáculos aparentemente intransponíveis. Porque metade de mim é feita de sonhos e a outra metade é de lutas.
Poderiam ordenar-me: "Mata-te na guerra".
Teu nome será o último coágulo de sangue em meus lábios rasgados pelas balas.
Iluminar para sempre... Iluminar tudo... Até os últimos dias da eternidade... iluminar e só... Eis o meu lema e o do sol.
(A espantosa aventura)
Nos outros eu sei onde fica o coração. É no peito. Comigo a anatomia ficou louca. Eu sou todo coração!
Escutai, pois! Se as estrelas se acendem é porque alguém precisa delas. É porque, em verdade, é indispensável que sobre todos os tetos, cada noite, uma única estrela, pelo menos, se alumie.
Eu não forneço nenhuma regra para que uma pessoa se torne poeta e escreva versos. E, em geral, tais regras não existem. Chama-se poeta justamente o homem que cria estas regras poéticas
O barco do amor chocou contra a rotina diária. Agora eu e você terminámos. Por isso é inútil elaborar uma lista de mágoas, dores e feridas mútuas.
A plenos pulmões
(Trecho final)
Camarada vida,
vamos,
para diante,
galopemos
pelo quinquênio afora.
Os versos
para mim
não deram rublos,
nem mobílias
de madeiras caras.
Uma camisa
lavada e clara,
e basta, —
para mim é tudo.
Ao
Comitê Central
do futuro
ofuscante,
sobre a malta
dos vates
velhacos e falsários
apresento
em lugar
do registro partidário
todos
os cem tomos
dos meus livros militantes.