Poemas inteligentes
Baste a quem baste o que lhe basta
O bastante de lhe bastar!
A vida é breve, a alma é vasta;
Ter é tardar.
Eu sou a dureza desses morros
revestidos,
enflorados,
lascados a machado,
lanhados, lacerados.
Queimados pelo fogo
Pastados
Calcinados
e renascidos.
A Palavra
Já não quero dicionários
consultados em vão.
Quero só a palavra
que nunca estará neles
nem se pode inventar.
Que resumiria o mundo
e o substituiria.
Mais sol do que o sol,
dentro da qual vivêssemos
todos em comunhão,
mudos,
saboreando-a.
Gastei uma hora pensando um verso
que a pena não quer escrever.
No entanto ele está cá dentro
inquieto, vivo.
Ele está cá dentro
e não quer sair.
Mas a poesia deste momento
inunda minha vida inteira.
Assim que te amo,
e os que amanhã quiserem ouvir
o que não lhes direi, que o leiam aqui
e retrocedam hoje porque é cedo
para tais argumentos.
Amanhã dar-lhes-emos apenas
uma folha da árvore do nosso amor, uma folha
que há-de cair sobre a terra
como se a tivessem produzido os nosso lábios,
como um beijo caído
das nossas alturas invencíveis
para mostrar o fogo e a ternura
de um amor verdadeiro.
Nota: Trecho do poema "É assim que te quero, amor" de Pablo Neruda
My only love sprung from my only hate!
Too early seen unknown, and known too late!
Prodigious birth of love it is to me
That I must love a loathed enemy.
Quando a hora dobra em triste e tardo toque
E em noite horrenda vejo escoar-se o dia,
Quando vejo esvair-se a violeta, ou que
A prata a preta tempora assedia;
Quando vejo sem folha o tronco antigo
Que ao rebanho estendia a sobra franca
E em feixe atado agora o vejo trigo
Seguir o carro, a barba hirsuta e branca;
Sobre tua beleza então questiono
Que há de sofrer do Tempo a dura prova,
Pois as graças do mundo em abandono
Morrem ao ver nascer a graça nova.
Contra a foice do tempo é vão combate
Salvo a prole, que o enfrenta se te abate.
Saudades, só portugueses
Conseguem senti-las bem
Porque têm essa palavra
Para dizer que as têm.
A Laranja
A laranja cortada ao meio,
Úmida de amor, anseia pela outra...
É assim, é bem assim que eu te desejo!
Estou só e sonho saudade.
E como é branca de graça
A paisagem que não sei,
Vista de trás da vidraça
Do lar que nunca terei!
A Morte Absoluta
Morrer.
Morrer de corpo e de alma.
Completamente.
Morrer sem deixar o triste despojo da carne,
A exangue máscara de cera,
Cercada de flores,
Que apodrecerão - felizes! - num dia,
Banhada de lágrimas
Nascidas menos da saudade do que do espanto da morte.
Morrer sem deixar porventura uma alma errante...
A caminho do céu?
Mas que céu pode satisfazer teu sonho de céu?
Morrer sem deixar um sulco, um risco, uma sombra,
A lembrança de uma sombra
Em nenhum coração, em nenhum pensamento,
Em nenhuma epiderme.
Morrer tão completamente
Que um dia ao lerem o teu nome num papel
Perguntem: "Quem foi?..."
Morrer mais completamente ainda,
- Sem deixar sequer esse nome.
Boas Maneiras
Os anjos não dão os ombros, não; quando querem mostrar indiferença os anjos dão as asas.
No meio do caminho tinha uma pedra
tinha uma pedra no meio do caminho
tinha uma pedra
no meio do caminho tinha uma pedra ...
Nota: Trecho adaptado de "No Meio do Caminho", de Carlos Drummond de Andrade
...MaisFoi nessa idade que a poesia me veio buscar
Não sei de onde veio
Do inverno, de um rio
Não sei como nem quando
Não, não eram vozes
Não eram palavras
Nem silêncio
Mas da rua fui convocado
Dos galhos da noite
Abruptamente entre outros
Entre fogos violentos
Voltando sozinho
Lá estava eu sem rosto
E fui tocado.
Quem escreverá a história do que poderia ter sido o irreparável do meu passado;
Este é o cadáver.
Se a certa altura eu tivesse me voltado para a esquerda, ao invés que para direita;
Se em certo momento eu tivesse dito não, ao invés que sim;
Se em certas conversas eu tivesse dito as frases que só hoje elaboro; Seria outro hoje, e talvez o universo inteiro seria insensivelmente levado a ser outro também."
Ai, ai, que olhos pôs-me o amor no rosto,
Que não se ligam com a real visão!
Se ligam, onde foi o juízo posto
Que ao certo lança falsa acusação?
Se o que meu falso olhar ama é bonito
Que meios tem o mundo pra o negar?
E se o não for, pelo amor fica dito
Que o olhar do mundo vence o de se amar.
Como pode do Amor o olhar ser justo
Se entre vigília e pranto ele se verga?
E nem espanta o olhar errar de susto
Se sem céu claro nem o sol enxerga.
Esperto amor, com pranto a me cegar
Pra cobrir erros quando o amor olhar.
O fogo que na branda cera ardia
O fogo que na branda cera ardia,
Vendo o rosto gentil que na alma vejo.
Se acendeu de outro fogo do desejo,
Por alcançar a luz que vence o dia.
Como de dois ardores se incendia,
Da grande impaciência fez despejo,
E, remetendo com furor sobejo,
Vos foi beijar na parte onde se via.
Ditosa aquela flama, que se atreve
Apagar seus ardores e tormentos
Na vista do que o mundo tremer deve!
Namoram-se, Senhora, os Elementos
De vós, e queima o fogo aquela nave
Que queima corações e pensamentos.
Oração do Milho
Sou a planta humilde dos quintais pequenos e das lavouras pobres.
Meu grão, perdido por acaso, nasce e cresce na terra descuidada. Ponho folhas e haste e se me ajudares Senhor, mesmo planta de acaso, solitária, dou espigas e devolvo em muitos grãos, o grão perdido inicial, salvo por milagre, que a terra fecundou.
Sou a planta primária da lavoura.
Não me pertence a hierarquia tradicional do trigo. E de mim, não se faz o pão alvo, universal.
O Justo não me consagrou Pão da Vida, nem lugar me foi dado nos altares.
Sou apenas o alimento forte e substancial dos que trabalham a terra, onde não vinga o trigo nobre.
Sou de origem obscura e de ascendência pobre. Alimento de rústicos e animais do jugo.
Fui o angú pesado e constante do escravo na exaustão do eito.
Sou a broa grosseira e modesta do pequeno sitiante. Sou a farinha econômica do proletário.
Sou a polenta do imigrante e a miga dos que começam a vida em terra estranha.
Sou apenas a fartura generosa e despreocupada dos paiois.
Sou o cocho abastecido donde rumina o gado
Sou o canto festivo dos galos na glória do dia que amanhece.
Sou o carcarejo alegre das poedeiras à volta dos seus ninhos.
Sou a pobreza vegetal, agradecida a Vós, Senhor, que me fizeste necessária e humilde
Sou o milho.
O poema
Mas por que datar um poema? Os poetas que põem datas nos seus poemas me lembram essas galinhas que carimbam os ovos...
Me gustas cuando callas porque estás como ausente,
y me oyes desde lejos, y mi voz no te toca.
Parece que los ojos se te hubieran volado
y parece que un beso te cerrara la boca.
Como todas las cosas están llenas de mi alma
emerges de las cosas, llena del alma mía.
Mariposa de sueño, te pareces a mi alma,
y te pareces a la palabra melancolía;
Me gustas cuando callas y estás como distante.
Y estás como quejándote, mariposa en arrullo.
Y me oyes desde lejos, y mi voz no te alcanza:
déjame que me calle con el silencio tuyo.
Déjame que te hable también con tu silencio
claro como una lámpara, simple como un anillo.
Eres como la noche, callada y constelada.
Tu silencio es de estrella, tan lejano y sencillo.
Me gustas cuando callas porque estás como ausente.
Distante y dolorosa como si hubieras muerto.
Una palabra entonces, una sonrisa bastan.
Y estoy alegre, alegre de que no sea cierto.