Poemas Góticos

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O deus-verme

Factor universal do transformismo.
Filho da teleológica matéria,
Na superabundância ou na miséria,
Verme — é o seu nome obscuro de batismo.

Jamais emprega o acérrimo exorcismo
Em sua diária ocupação funérea,
E vive em contubérnio com a bactéria,
Livre das roupas do antropomorfismo.

Almoça a podridão das drupas agras,
Janta hidrópicos, rói vísceras magras
E dos defuntos novos incha a mão...

Ah! Para ele é que a carne podre fica,
E no inventário da matéria rica
Cabe aos seus filhos a maior porção!

Desde então para cá fiquei sombrio
Um penetrante e corrosivo frio
Anestesiou-me a sensibilidade
E a grandes golpes arrancou raízes
Que prendiam meus dias infelizes
A um sonho antigo de felicidade!”

“Meu coração, como um cristal, se quebre,
O termômetro negue minha febre,
Torne-se gelo o sangue que me abrasa,
E eu me converta na cegonha triste
Que das ruínas duma casa assiste
Ao desmoronamento de outra casa!”

“Bati nas pedras dum tormento rude
E a minha mágoa de hoje é tão intensa
Que eu penso que a alegria é uma doença
E a tristeza é minha única saúde.”

"Dizes que sou feliz. Não mentes. Dizes
Tudo que sentes. A infelicidade
Parece às vezes com a felicidade
E os infelizes mostram ser felizes!"

"(...)
Ah! Se me ouvisses falando!
(E eu sei que às dores resiste)
Dir-te-ia coisas tão tristes
Que acabarias chorando.

Que mal o amor tem me feito!
Duvidas?! Pois, se duvidas,
Vem cá, olha estas feridas
Que o amor abriu em meu peito.

Passo longos dias, a esmo...
Não me queixo mais da sorte
Nem tenho medo da Morte
Que eu tenho a Morte em mim mesmo!
(...)"

"Homem, carne sem luz, criatura cega,
Realidade geográfica infeliz
O Universo calado te renega
E a tua própria boca te maldiz!

O nôumeno e o fenômeno, o alfa e o ômega
Amarguram-te. Hebdômadas hostis
Passam... Teu coração te desagrega,
Sangram-te os olhos, e, entretanto, ris!

Fruto injustificável dentre os frutos,
Montão de estercorária argila,
Excrescência de terra singular.

Deixa a tua alegria aos seres brutos,
Porque, na superfície do planeta,
Tu só tens um direito: - o de chorar!"
(Eu e Outras Poesias)

Inserida por Filigranas

AMOR E RELIGIÃO

Conheci-o: era um padre, um desses santos
Sacerdotes da Fé de crença pura,
Da sua fala na eternal doçura
Falava o coração. Quantos, oh! Quantos

Ouviram dele frases de candura
Que d'infelizes enxugavam prantos!
E como alegres não ficaram tantos
Corações sem prazer e sem ventura!

No entanto dizem que este padre amara.
Morrera um dia desvairado, estulto,
Su'alma livre para o céu se alara.

E Deus lhe disse: "És duas vezes santo,
Pois se da Religião fizeste culto,
Foste do amor o mártir sacrossanto".

Inserida por PensamentosRS

A Subconsciência

Há, sim, a inconsciência prodigiosa
Que guarda pequeninas ocorrências
De todas as vividas existências
Do Espírito que sofre, luta e goza.

Ela é a registradora misteriosa
Do subjetivismo das essências,
Consciência de todas as consciências,
Fora de toda a sensação nervosa.

Câmara da memória independente
Arquiva tudo rigorosamente
Sem massas cerebrais organizadas,

Que o neurônio oblitera por momentos,
Mas que é o conjunto dos conhecimentos
Das nossas vidas estratificadas.

Inserida por thinkfloyd61

Matéria Cósmica

Glória à matéria cósmica, a energia
Potencial que dá vida aos elementos,
Base de portentosos movimentos
Onde a forma se acaba e principia.

Sistematização dos argumentos
Que elucidam a Teleologia:
Dentro da força cósmica se cria
A fonte-máter dos conhecimentos.

É do mundo o Od ignoto, o éter divino,
Onde Deus grava a história do destino
Dos seus feitos de Amor no Amor imersos.

Livro onde o Criador Inimitável
Grava, com o pensamento almo e insondável,
Seus poemas de seres e universos.

Inserida por thinkfloyd61

ALUCINAÇÃO À BEIRA-MAR

Um medo de morrer meus pés esfriava.
Noite alta. Ante o telúrico recorte,
Na diuturna discórdia, a equórea coorte
Atordoadoramente ribombava!

Eu, ególatra céptico, cismava
Em meu destino!... O vento estava forte
E aquela matemática da Morte
Com os seus números negros, me assombrava!

Mas a alga usufrutuária dos oceanos
E os malacopterígios subraquianos
Que um castigo de espécie emudeceu,

No eterno horror das convulsões marítimas,
Pareciam também corpos de vítimas
Condenadas à Morte, assim como eu!

Vandalismo


Meu coração tem catedrais imensas,
Templos de priscas e longínquas datas,
Onde um nume de amor, em serenatas,
Canta a aleluia virginal das crenças.


Na ogiva fúlgida e nas colunatas
Vertem lustrais irradiações intensas
Cintilações de lâmpadas suspensas
E as ametistas e os florões e as pratas.


Como os velhos Templários medievais
Entrei um dia nessas catedrais
E nesses templos claros e risonhos ...


E erguendo os gládios e brandindo as hastas,
No desespero dos iconoclastas
Quebrei a imagem dos meus próprios sonhos!

Inserida por NiravaGulaboBeth

Numerar sepulturas e carneiros,
Reduzir carnes podres a algarismos,
Tal é, sem complicados silogismos,
A aritmética hedionda dos coveiros!

Inserida por NiravaGulaboBeth

A árvore da serra
— As árvores, meu filho, não têm alma!
E esta árvore me serve de empecilho...
É preciso cortá-la, pois, meu filho,
Para que eu tenha uma velhice calma!

— Meu pai, por que sua ira não se acalma?!
Não vê que em tudo existe o mesmo brilho?!
Deus pôs almas nos cedros, no junquilho.
Esta árvore, meu pai, possui minh'alma!

— Disse — e ajoelhou-se, numa rogativa:
Não mate a árvore, pai, para que eu viva!

E quando a árvore, olhando a pátria serra,
Caiu aos golpes do machado bronco,
O moço triste se abraçou com o tronco
E nunca mais se levantou da terra!

Inserida por jalves

Saudade

Hoje que a mágoa me apunhala o seio,
E o coração me rasga atroz, imensa,
Eu a bendigo da descrença em meio,
Porque eu hoje só vivo da descrença.

À noite quando em funda soledade
Minh'alma se recolhe tristemente,
Pra iluminar-me a alma descontente,
Se acende o círio triste da Saudade.

E assim afeito às mágoas e ao tormento,
E à dor e ao sofrimento eterno afeito,
Para dar vida à dor e ao sofrimento,

Da saudade na campa enegrecida
Guardo a lembrança que me sangra o peito,
Mas que no entanto me alimenta a vida.

Inserida por iasmindutra2707

Noite. Da Mágoa o espírito noctâmbulo
Passou de certo por aqui chorando!
Assim, em mágoa, eu também vou passando
Sonâmbulo... sonâmbulo... sonâmbulo...

Augusto dos Anjos
ANJOS, A. Eu e Outras Poesias. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998.

Nota: Trecho de "Insônia"

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Inserida por pensador

Budismo Moderno

Tome, Dr., esta tesoura, e... corte
Minha singularíssima pessoa.
Que importa a mim que a bicharia roa
Todo o meu coração, depois da morte?!

Ah! Um urubu pousou na minha sorte!
Também, das diatomáceas da lagoa
A criptógama cápsula se esbroa
Ao contato de bronca destra forte!

Dissolva-se, portanto, minha vida
Igualmente a uma célula caída
Na aberração de um óvulo infecundo;

Mas o agregado abstrato das saudades
Fique batendo nas perpétuas grades
Do último verso que eu fizer no mundo!

Augusto dos Anjos
ANJOS, A. Eu e Outras Poesias. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1998.
Inserida por AnaGabriela21

Ao Luar

Quando, à noite, o Infinito se levanta
A luz do luar, pelos caminhos quedos
Minha táctil intensidade é tanta
Que eu sinto a alma do Cosmos nos meus dedos!

Quebro a custódia dos sentidos tredos
E a minha mão, dona, por fim, de quanta
Grandeza o Orbe estrangula em seus segredos,
Todas as coisas íntimas suplanta!

Penetro, agarro, ausculto, apreendo, invado,
Nos paroxismos da hiperestesia,
O Infinitésimo e o Indeterminado…

Transponho ousadamente o átomo rude
E, transmudado em rutilância fria,
Encho o Espaço com a minha plenitude!

Inserida por coulduloveme

Melancolia, não sei o que significa mas é o que estou sentindo no momento.
Sinto tbm q o mundo caiu na minha cabeça.
E é oq eu quero q aconteça no momento,
Problemas familiares, problemas financeiros, problemas no amor, problemas nos problemas,
PROBLEMAS, PROBLEMAS, PROBLEMAS.
Queria fugir pra lugar nenhum, onde ninguém pode me ouvir, onde ninguém pode chegar até mim, onde a única companhia seja minha, um lugar onde eu possoa gritar tudo o que sinto, gritar palavrões, desabar em choro.
E por fim pensar,
Pensar onde Deus estava quando eu mais precisava dele, pq que tudo aquilo q dizem que ele é, eu nunca consegui ver e nem sentir,
Pensar aonde que eu errei? pq não fui menos tímido? pq não falei o que queria falar? pq todos me olhavam de forma estranha? Pq de haver tantas perguntas sem respostas?
A vida nunca foi fácil, invejo aqueles que conseguem ser feliz, aqueles que conseguem transmitir a felicidade para os próximos.
Penso em me matar.
Como seria a vida pós morte?
Ou será mesmo q quem se suicida não vai ter vida após morte? Se isso for verdade, Deus não ela o cara mais justo, dizem q o diabo tenta as pessoas a fazerem isso, mas pelo menos ele trabalha, Se Deus trabalhasse o tanto que o Diabo trabalha o mundo não estaria da forma q se encontra hj
Sinto saudade das coisas que não alcancei, dos amigos que não fiz, das lutas que deichei de lutar, da vida que não tive, das pessoas que deichei fugir dos meus braços.
Eu realmente me odeio, queria tanto ser aquele cara bacana, que as pessoas gostam de ter ao lado, de ser aquele q faz a diferença na vida dos outros.
Se hj eu desaparecesse, qual a marca que deixaria no mundo? Quem sentiria minha falta?
Quem são as pessoas que eu não dei a importância que deveria dar? Muitos pelo qual eu dei importância, e que eram especiais para mim tbm não perceberam ou percebem isso.
Será que alguém consegue ver a dor que eu sinto? E se consegue, pq não me ajuda?

Melancolia!
Resquício de um passado
No qual
Conjugávamos o futuro
Na primeira pessoa do plural

Hoje
Resta conjugar
Solidão
Na primeira do singular

(IIº versão)

Nesses momentos de melancolia,
esqueço dos passos que já dei
e de tudo que já sei
Quero apenas viver algo
que tenha a ver com liberdade
sem saudade
sem distância
sem talvez

Era uma vez uma choupana que ardia na estrada; a dona – um triste molambo de mulher, – chorava o seu desastre, a poucos passos, sentada no chão. Senão quando, indo a passar um homem ébrio, viu o incêndio, viu a mulher, perguntou-lhe se a casa era dela.
– É minha, sim, meu senhor; é tudo o que eu possuía, neste mundo.
– Dá-me então licença que acenda ali o meu charuto?

Machado de Assis
Quincas Borba (1891).

Culpo minha pobre e velha mãe e meu magro e triste pai, por me jogarem na vida e ousadamente me colocarem o nome de Raul. Eis-me!
Culpo ao meu próprio escárnio de repetir três vezes o mesmo erro, se é que qualquer um desses três tenham a mesma lucidez dilacerante do que é a dor do absurdo do ser.
Nada é mais que um nada mergulhado no oceano de uma dor de chibata chamada Deus! Que este tenha o meu perdão.
Só peço que um raio de amor venha do espaço, e blind as três para que a escuridão da santa divina ignorância lhes vedem a visão do apocalipse, amém!

Chove. Que fiz eu da vida?
Fiz o que ela fez de mim...
De pensada, mal vivida...
Triste de quem é assim!

Numa angústia sem remédio
Tenho febre na alma, e, ao ser,
Tenho saudade, entre o tédio,
Só do que nunca quis ter...

Quem eu pudera ter sido,
Que é dele? Entre ódios pequenos
De mim, 'stou de mim partido.
Se ao menos chovesse menos!

Fernando Pessoa

Nota: 23-10-1931

Não quero ser triste
Como o poeta que envelhece,
Lendo Maiakovski de conveniência.