Poemas Famosos Tempo

Cerca de 34 poemas Famosos Tempo

ANIVERSÁRIO

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.
Na casa antiga, até eu fazer anos era uma tradição de há séculos,
E a alegria de todos, e a minha, estava certa com uma religião qualquer.

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu tinha a grande saúde de não perceber coisa nenhuma,
De ser inteligente para entre a família,
E de não ter as esperanças que os outros tinham por mim.
Quando vim a ter esperanças, já não sabia ter esperanças.
Quando vim a olhar para a vida, perdera o sentido da vida.

Vejo tudo outra vez com uma nitidez que me cega para o que há aqui...
A mesa posta com mais lugares, com melhores desenhos na loiça, com mais copos,
O aparador com muitas coisas — doces, frutas, o resto na sombra debaixo do alçado —,
As tias velhas, os primos diferentes, e tudo era por minha causa,
No tempo em que festejavam o dia dos meus anos...

Pára, meu coração!
Não penses! Deixa o pensar na cabeça!
Ó meu Deus, meu Deus, meu Deus!
Hoje já não faço anos.
Duro.
Somam-se-me dias.
Serei velho quando o for.
Mais nada.
Raiva de não ter trazido o passado roubado na algibeira!...

O tempo em que festejavam o dia dos meus anos!...

Fernando Pessoa
Poesias de Álvaro de Campos. 1944

Nota: Trecho do poema Aniversário, escrito por Fernando Pessoa usando o pseudônimo de Álvaro de Campos.

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O próprio viver é morrer, porque não temos um dia a mais na nossa vida que não tenhamos, nisso, um dia a menos nela.

Fernando Pessoa
Livro do Desassossego, por Bernardo Soares. São Paulo: Montecristo, 2012

O ANDAIME
O tempo que eu hei sonhado
Quantos anos foi de vida!
Ah, quanto do meu passado
Foi só a vida mentida
De um futuro imaginado!

Aqui à beira do rio
Sossego sem ter razão.
Este seu correr vazio
Figura, anônimo e frio,
A vida vivida em vão.

A 'sp'rança que pouco alcança!
Que desejo vale o ensejo?
E uma bola de criança
Sobre mais que minha 's'prança,
Rola mais que o meu desejo.

Ondas do rio, tão leves
Que não sois ondas sequer,
Horas, dias, anos, breves
Passam - verduras ou neves
Que o mesmo sol faz morrer.

Gastei tudo que não tinha.
Sou mais velho do que sou.
A ilusão, que me mantinha,
Só no palco era rainha:
Despiu-se, e o reino acabou.

Leve som das águas lentas,
Gulosas da margem ida,
Que lembranças sonolentas
De esperanças nevoentas!
Que sonhos o sonho e a vida!

Que fiz de mim? Encontrei-me
Quando estava já perdido.
Impaciente deixei-me
Como a um louco que teime
No que lhe foi desmentido.

Som morto das águas mansas
Que correm por ter que ser,
Leva não só lembranças -
Mortas, porque hão de morrer.

Sou já o morto futuro.
Só um sonho me liga a mim -
O sonho atrasado e obscuro
Do que eu devera ser - muro
Do meu deserto jardim.

Ondas passadas, levai-me
Para o alvido do mar!
Ao que não serei legai-me,
Que cerquei com um andaime
A casa por fabricar.


Fernando Pessoa

Um dia desses, eu separo um tempinho e ponho em dia todos os choros que não tenho tido tempo de chorar.

Carlos Drummond de Andrade

Nota: Autoria não confirmada.

Que Amor Fez sem Remédio, o Tempo, os Fados?

Depois de tantos dias mal gastados,
Depois de tantas noites mal dormidas,
Depois de tantas lágrimas vertidas,
Tantos suspiros vãos vãmente dados,

Como não sois vós já desenganados,
Desejos, que de cousas esquecidas
Quereis remediar mortais feridas,
Que amor fez sem remédio, o tempo, os Fados?

Se não tivéreis já longa exp'riência
Das sem-razões de Amor a quem servistes,
Fraqueza fora em vós a resistência.

Mas pois por vosso mal seus males vistes,
Que o tempo não curou, nem larga ausência,
Qual bem dele esperais, desejos tristes?

Dentro de mim, bem no fundo/ há reservas colossais de tempo,/ futuro, pós-futuro, pretérito.

Aconteça o que acontecer, o tempo e as horas sempre chegam ao fim, mesmo do dia mais duro dentre todos os dias.

Passagem do ano

Passagem
O último dia do ano
não é o último dia do tempo.
Outros dias virão
e novas coxas e ventres te comunicarão o calor da vida.
Beijarás bocas, rasgarás papéis,
farás viagens e tantas celebrações
de aniversário, formatura, promoção, glória, doce morte com sinfonia e coral,
que o tempo ficará repleto e não ouvirás o clamor,
os irreparáveis uivos
do lobo, na solidão.

O último dia do tempo
não é o último dia de tudo.
Fica sempre uma franja de vida
onde se sentam dois homens.
Um homem e seu contrário,
uma mulher e seu pé,
um corpo e sua memória,
um olho e seu brilho,
uma voz e seu eco,
e quem sabe até se Deus…

Recebe com simplicidade este presente do acaso.
Mereceste viver mais um ano.
Desejarias viver sempre e esgotar a borra dos séculos.
Teu pai morreu, teu avô também.
Em ti mesmo muita coisa já expirou, outras espreitam a morte,
mas estás vivo. Ainda uma vez estás vivo,
e de copo na mão
esperas amanhecer.

O recurso de se embriagar.
O recurso da dança e do grito,
o recurso da bola colorida,
o recurso de Kant e da poesia,
todos eles… e nenhum resolve.

Surge a manhã de um novo ano.
As coisas estão limpas, ordenadas.
O corpo gasto renova-se em espuma.
Todos os sentidos alerta funcionam.
A boca está comendo vida.
A boca está entupida de vida.
A vida escorre da boca,
lambuza as mãos, a calçada.
A vida é gorda, oleosa, mortal, sub-reptícia.

Carlos Drummond de Andrade
Poesia completa. Rio de Janeiro: Nova Aguilar, 2002.

⁠Crescer é Perder-se

Se soubesse, criança, como passa o tempo,
Voltavas a brincar com pedrinhas no rio,
Continuavas a sorrir para as borboletas,
Aproveitavas o viver como passarinho.

A vida adulta é pura lamúria,
Tem gosto de saudade e cheiro de chuva.
Queria ter ainda a confiança do abandono,
Quando me esquecia nos braços de Deus,
E era feliz nos desvãos do quintal.

Hoje, crescido, com o controle nas mãos,
Não vivo, apenas existo,
Prisioneiro dos meus próprios medos,
Carregando o peso das responsabilidades.

Se pudesse voltar ao ontem,
Onde o futuro era apenas uma ideia distante,
E cada dia uma nova aventura,
Entregar-me-ia à pureza da infância.

Na simplicidade dos dias antigos,
Encontrava a verdadeira alegria,
E na inocência do meu olhar de menino,
Revelava-se o segredo da vida.

Hoje, vejo-me perdido em meio ao concreto,
Nas rotinas sem cor e sem brilho,
E anseio pelo riso fácil,
Pelo despreocupado viver.

Se soubesse, criança, que crescer é perder-se,
Voltavas a brincar com as formigas,
Continuavas a sorrir para o vento,
Aproveitavas o viver em plenitude.

Hoje que cresci e assumi o controle, não vivo.
Tudo é se der,
Tudo é quem sabe,
E o coração ainda sonha ser menino.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Viver por vezes parece ser apenas adiantar o trabalho do dia seguinte. No domingo, já estamos pensando na segunda-feira, na terça-feira, já estamos de olho na quarta-feira, e assim por diante, sempre um passo à frente do dia presente. Com tanta antecipação, acabaremos vivendo um mês a menos.

Nossa mente, assim como a vida, é uma tecelã desatenta que não distingue entre fios de ouro e fios de sombra. Ela não seleciona memórias como boas ou más; simplesmente as deixa dançar ao sabor do vento da lembrança. Daí o perigo de se viver de amanhã.

O tempo, esse trapaceiro imprevisível, teima em desafiar nossas noções de permanência, sempre nos lembrando de sua natureza efêmera. No entanto, no meio desse emaranhado de efemeridades, o amor emerge como um oásis de eternidade. É nele que residem todas as histórias que o tempo já arrastou consigo, como conchas preciosas depositadas na praia do coração.

Sempre que puder desperdice simpatia, pois é o amor que empregamos no cotidiano dos nossos dias que nos fará celebrar não apenas o tempo que já vivemos, mas também o tempo que ainda teremos para tecer novas memórias e se encantar com suas infinitas possibilidades.

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Ciclo

Cada momento que vai
Eu me sinto renascer
Mas cada tempo passado
Aí me sinto morrer.
A vida é muito escassa
De repente tudo passa
Se não correr pra viver!

Santo Antônio do Salto da Onça/RN
23/11/2023

Inserida por gelsonpessoa

Por que Deus permite
que as mães vão-se embora?
Mãe não tem limite,
é tempo sem hora,
luz que não apaga
quando sopra o vento
e chuva desaba,
veludo escondido
na pele enrugada,
água pura, ar puro,
puro pensamento.

Carlos Drummond de Andrade
ANDRADE, D. Lição de Coisas: poesia. São Paulo: J. Olympio, 1965

Nota: Trecho do poema Para Sempre Link.

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A grandeza e o dilema de ser pai

Ser pai é destino, missão que se trama,
Nos fios do tempo, oculto, a se entrelaçar,
Não é só a vida que se deve perpetuar,
Mas a alma que, em silêncio, se inflama.

Os filhos, seres que nos atravessam,
Não nascem apenas do corpo, mas do sentir,
Cruzam nosso caminho, e ao nos invadir,
Transformam o vazio que em nós cessa.

É nesse encontro que o belo se revela,
Quando o inesperado faz-se em ser,
Almas que, de não ser, passam a viver,
Forjadas no calor que o tempo sela.

Paternidade, processo singular,
Feito de alegrias e de dor calada,
Reconhecida, mas quase sempre velada,
Nos gestos simples, nas palavras a silenciar.

Em cada ação, o pai, com jeito finito,
Revela o divino que em nós habita,
Semelhante a Ele, na tangente da vida,
Invisível, mas presente, o mundo infinito.

Talvez o pecado maior seja a ausência,
Escolha silenciosa que a distância impõe,
De herói a vilão, o pai assim se põe,
No desejo de moldar, com severa paciência.

Mas é nesse dilema que a grandeza reside,
Caminhar entre a presença e o deixar ir,
Dar o melhor de si, sem nunca mentir,
Que o amor, mesmo imperfeito, é o que nos divide.

E assim, no vasto papel que o pai assume,
Descobre-se que ser grande não é só estar,
Mas que, mesmo ausente, pode perdurar,
Sua essência, no coração que o resuma.

Inserida por Epifaniasurbanas

Sem importar a estrada que tome,
um dia todos irão encontrar o mesmo destino.

A um só ponto leva a vida.
Depois do ponto, pode haver qualquer coisa ou pode haver coisa nenhuma, mas isso não importa.
Porque existe uma história antes do ponto, que merece ser lida.

Sonho com um dia
sem pressa.
Eu, meu filho, uma praça...
deitados olhando figuras de nuvens
sorrimos.

Inspirados por ipês amarelos
florescemos. E como eles
sem ligar para a pressão das estações
vamos criando nossas próprias primaveras.

Sonho com um dia
sem pressa.
Eu e meu filho
Sorrindo...
e o tempo não tendo poder sobre nós.

Inserida por Epifaniasurbanas

Bem que já sabia o bem que me que.rias, nesse disfarce colorindo nossos dias; o tempo do futuro que trazes ao agora; nos conforta... Quem ré e clama; com saber verbal terá tenda e bons encontros; é! Medicinal.

Inserida por ClaudethCamoes

No tempo em que festejavam o dia dos meus anos,
Eu era feliz e ninguém estava morto.

"Que a coragem de sonhar não nos deixe com os anos.
Que os sonhos continuem a acontecer, apesar de nós."

Inserida por Epifaniasurbanas

⁠Aprendi com o passar do tempo e a maturidade trazida pelos dias, que meu Pai em todos os momentos da vida demonstrou seu amor por nós em atitudes silenciosas; chorou por dentro nossas dores, torceu sem fazer alardes. Enquanto tecíamos nossa história, ele produzia a linha, enquanto levantávamos as paredes de nossos sonhos, ele era nosso alicerce, enquanto chovia lá fora, ele era nosso abrigo.

Quarenta ou oitenta em anos, ainda é pouco tempo, pra dimensão de vossa existência, sejas pleno com certezas.

Inserida por ClaudethCamoes