Poemas de Raul Seixas
Bipolo
Acordei sorrindo, vou dormir chorando... E assim vou tentando disfarçar o que sinto, vou tentando me enganar, achando que ainda pode dar certo, que meu tempo vai chegar. Vou falar! Não vou falar! Mas tenho que falar! Já falei! Será se devo repetir?! Acho que já entendeu, acho que também já entendi! Será se entendi? Posso ter entendido errado... Ou posso acreditar que não entendi, tentando me iludir que consigo esperar, será?! Mas esperar por algo que eu nem sei se vem?! "Você está se enganando, vai sofrer" é o que meu lado direito me diz, o da razão! "Espera, vai valer a pena, vai dar tudo certo" é o que me passa a parte esquerda, a da emoção, do coração! E agora?! Como agir?! O que fazer?! Me sinto perdido em meio a um labirinto sem saída, o dia está terminando, não mais consigo ver o sol, será se fui longe demais?! Será que consigo parar e voltar daqui?! Acho que as marcas na areia foram apagadas, algo me diz que devo seguir em frente! Se vim até aqui, por que desistir? "Segue em frente", volta a falar meu coração! E quem disse que o coração não tem um pouco de razão?! Quem disse que existem dois lados?! Na verdade tudo só faz parte de um sistema e eu nunca vou saber o que vai acontecer se não arriscar! Quer saber?! Posso me arranhar, posso me machucar, posso ajoelhar, e se cair, terei forças pra levantar, afinal, a vida é feita de desafios, e se quero chegar onde ninguém chegou, tenho que fazer o que ninguém fez. Cometi um erro anteriormente, pois hoje acordei sorrindo, mas na verdade não vou dormir chorando, vou dormir sorrindo, pois sei que que tenho forças pra lutar pelo que eu quero e não vou ficar aqui parado esperando simplesmente acontecer, não vou sofrer pelo que "pode" acontecer! Vou brigar por meu objetivo, se eu perder essa batalha, sei que morri lutando e não como um covarde que desistiu na primeira ameaça!
Ollha aqui, esse show, essa pequena amostra, uma amostra compacta de alguns rocks, no tempo de 50, nos primordios, mas eu vou incluir um meu aqui, que pediram, é o rock das aranhas. Bom, vocês sabem, que existe, um dicionário, que saiu agora, chamdo 'dicionario da censura', o dicionario da censura é o seguinte: todo compositor brasileiro tem aobrigação dereceber um dicionario dessa grossura, com todas as palavras proibidas. Inclusive, uma palvra proibida, eu não sei porque, éé, povo, gente, universidade... escola, não pode se falar disso em música, inclusive pintou apalvra aranha depois de mim... eu fui o percursor da aranha... depois de Deus.
Conserve seu medo mas sempre ficando sem medo de nada, por que dessa vida de qualquer maneira não se leva nada.
Convence as paredes do quarto e dorme tranquilo, sabendo no fundo do peito que não era nada daquilo.
Eu perco pra malandro, perco pra ladrão, perco pra espertinhos e espertões, perco na transação bancária, nos juros e na taxa diária. Ah, mas na sabedoria é que eu ganho de vocês, essa ninguém me tira.
Eu sou o corpo Raquítico que o teu olho desprezou sou a saliva das bocas que tua boca beijou sou o velho que pede esmola sou a criança que chora desprotegida de amor.
Já me borrei de tanto rir ouvindo o infinito sempre explicado. Se sendo é um verbo, prefiro ficar sendo calado.
Eu que já andei pelos quatro cantos do mundo procurando, foi justamente num sonho que ele me falou...
Pagam para ver um Deus, alguém que lhes aponte o caminho em cima do palco, mas eu não sou um líder. Eu sou o líder dos líderes.
Só há amor quando nenhuma autoridade existe. Essa coisa "autoridade" é uma das coisas mais perigosas da vida. Eu não quero ser "autoridade". Nós temos e podemos criar um mundo novo. Ó gente! Eu estou perguntando a vocês, cabe a vocês achar essa resposta. Se aceitar a verdade de outrem não será a sua resposta. Há um imenso trabalho para fazermos juntos, isso nos acrescenta uma enorme responsabilidade. Devemos ser revolucionários; dentro em nós deve se operar uma profunda revolução psicológica.
É sempre mais fácil achar que a culpa é do outro
Evita o aperto de mão de um possível aliado
Convence as paredes do quarto, e dorme tranqüilo
Sabendo no fundo do peito que não era nada daquilo...
Coragem, coragem, se o que você quer é aquilo que pensa e faz
Coragem, coragem, eu sei que você pode mais.
Por favor...
Por favor...
Já que eu nasci, eu só preciso de alguem
Alguem como eu, preciso com jeito
de me dar amor.
Me sinto só... aaahhh...
Quero carinho
Por favor, eu tenho medo
Não to apelando pra ninguem
Só estou normal - te gritando
Por favor !!!
Estou só !!!
"Ninguem pode me dar o que eu
sei que ninguem tem",
Mas...
Por favor !!! ô ô ô
olhe a vida !!!
Feitos pra sentir uma coisa que
não existe.
Eu só sei gritar...
não sei cantar
AAAHHH !
Não vou cantar
Se posso gritar
AHHH !!!
Eu vou cantar até que o dia amanheça.
Cantar tudo o que vier na cabeça
Eu vou cantar até que o dia amanheça
Eu vou cantar.
Cada vez que eu passo por um dia aqui, ali, catando, olhando, pensando, eu vou adquirindo um novo conceito das coisas que me cercam. Acho que parei num lugar; parece que meus conceitos próprios chegaram. Dúvidas de mim já não tenho. Sei dos caminhos e de como eles são. O dia a dia fez de mim um homem mais calmo, mais sereno, menos desvairado. Nós (você, eu, Sérgio, Walter) somos velhos e estamos caminhando para nascer, e enquanto não nascemos "levamos nosso cão raivoso" para passear. Amizades mais calmas, mais escolhidas (achei boa companhia), bom papo, cervejas em botecos longe da fumaça e da poluição, pois esta cidade não pára!! Eu preciso dar um descanso à máquina. Já não há escapatória para a nossa civilização. Somos prisioneiros da vida e temos que suportá-la até que o último viaduto nos invada pela boca adentro e viaje eternamente em nossos corpos.
Há dias calmos aqui também. Manhãs que passam manhosas entre os móveis e automóveis e a gente vai percebendo, aos poucos, que o capim do parque ainda é verde. A gente enche os pulmões, pega um tema e sai assoviando.
Só ando de ônibus. Cheguei à conclusão que eu me aborreço 99% menos. Ônibus não é tão mau quanto eu pintava.
Em cada carta eu lhe falo um pouco sobre esse movimento "Cavernismo", que é um movimento de tendências universalistas.
(Carta inacabada ao irmão Plínio Seixas)
1970
Decálogo
Ao pé do monte Sinai
A voz do anjo gritou
O solene momento do início
Da soberania do Estado-Senhor
A trombeta fatídica da lei
Que o mundo inteiro escutou:
Não te reunirás
Não te imprimirás
Não lerás
Respeito aos que te representam
Fiel vais pagar o orçamento
Vais amar o teu governo
Que é teu Deus e Senhor.
[1984]
Metido a escrever (1984)
(Por que se eu não escrevesse por certo morreria)
Eu, louco do absurdo
Cansado de cansaços
Desmorono-me em breves reticências
Meus dentes caem
Meus lábios doem de tanto arder
Ardor de falar
Palavras inúteis
Poeta do caos
Imbecil como uma criança
Imprudente como uma mulher
Estômago ácido-espelho-da língua?
Sem Titulo (1984)
Eu minha lanterna e o peixe Felipe. Cheio de coisas para botar pra fora e não tenho quem ouça.
- Quem tem um ouvido aí?
O que eu despejo no papel do caderno? Caderno tem ouvido? Será que ele entende minha angústia? Será que as linhas frias do caderno me bastam? Ahhh! que besteira enorme é escrever, e no entanto se não o fizesse eu por certo morreria... Mas... Morreria de fato... mesmo.
Escrever... escrever... escrever...
Tudo já foi escrito; mas não importa.