Poemas de Caio Fernando Abreu
Mania de fechar os olhos antes de dormir e te desejar boa noite em pensamento, dorme bem, sonha comigo, te quero muito e bem.
Alguma coisa aconteceu comigo. Alguma coisa tão estranha que ainda não aprendi o jeito de falar claramente sobre ela. Quando souber finalmente o que foi, essa coisa estranha, saberei também esse jeito. Então serei claro, prometo. Para você, para mim mesmo. Como sempre tentei ser. Mas por enquanto, e por favor, tente entender o que tento dizer.
Quando você perde alguém que você ama, e esse amor — essa pessoa — continua vivo (a), há então uma morte anormal.
É assim o nosso ciclo. Eu te preciso. perto, longe, tanto faz. Preciso saber que tu está bem, se respira, se comeu ou tomou banho - com o calor que está fazendo neste verão, tome pelo menos uns três ao dia, e pense em mim, estou com calor também.
Recomeçar é doloroso. Faz-se necessário investigar novas verdades, adequar novos valores e conceitos.
Meu coração é um entardecer de verão, numa cidadezinha à beira-mar. A brisa sopra, saiu a primeira estrela. Há moças na janela, rapazes pela praça, tules violetas sobre os montes onde o sol se pôs. A lua cheia brotou do mar. Os apaixonados suspiram. E se apaixonam ainda mais.
Não olhava para trás, porque olhar para trás era uma maneira de ficar num pedaço qualquer para partir incompleto.
Não fique aí remando contra a maré, dando murro em ponta de faca. Veja – se não fora pra ser, não vai ser.
Te escrevi duas vezes: a primeira saiu uma coisa sincera, mas lamentativa demais, um saco. A segunda saiu “madura e controlada”, mas extremamente falsa.
E recomeçar é doloroso. Faz-se necessário investigar novas verdades, adequar novos valores e conceitos. Não cabe reconstruir duas vezes a mesma vida numa só existência. É por isso que me esquivo e deslizo por entre as chamas do pequeno fogo, porque elas queimam - e queimar também destrói.
Parece difícil de enxergar que insistir nisso é perda de tempo, é perda de vida em uma causa perdida.
Depois das nossas brigas, compreendi uma porção de coisas. Compreendi, por exemplo, que eu estava mitificando e mistificando você; que estava também me anulando perto de você; que estava aceitando tudo o que vinha de você somente por achar você bacana.
Estou me transformando aos poucos num ser humano meio viciado em solidão. E que só sabe escrever. Não sei mais falar, abraçar, dar beijos, dizer coisas aparentemente simples como “eu gosto de você”. Gosto de mim. Acho que é o destino dos escritores. E tenho pensado que, mais do que qualquer outra coisa, sou um escritor. Uma pessoa que escreve sobre a vida – como quem olha de uma janela – mas não consegue vivê-la.
Só quero ir indo junto com as coisas, ir sendo junto com elas, ao mesmo tempo, até um lugar que não sei onde fica.
Bom ir, bom voltar, bom saber que aquelas pessoas boas continuam lá, outras também, outras não mais.
Ter que atravessar os gelos de julho para chegar despedaçado em agosto e, a partir de setembro, tentar reunir os cacos outra vez.