Poemas de Caio Fernando Abreu

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Sou eu sozinha quem carrega todo esse peso nas costas, isso ninguém percebe, ninguém valoriza.

Você me provoca, você me perturba. Joga água e sai correndo. Atira a pedra e me acerta de raspão. Me espia no escuro e mostra a língua. Me xinga. Me atiça. Invade o meu sossego. Meu refúgio. Pisa no meu ninho com os sapatos sujos. Na minha toca. Sem saber o meu tamanho, até onde vai meu bote, você me provoca achando que não há perigo.

Será que as pessoas mudam de comportamento porque se sentem seguras do afeto que o outro sente?

É como um anjo que veio me dar harmonia nesses dias meio remotos, o sorriso é tão aberto, me transmite tanta paz, é como um vento forte e gostoso no rosto da gente.

Dias escuros sem sorrisos, sem risadas de verdade. Dias tristes, vontade de fazer nada, só dormir.

Olhando você sem dizer nada, só olhando e pensando – Meu Deus, mas como você me dói de vez em quando.

Foi aí que a solidão deixou de ser involuntária para se transformar em escolha. E foi bom, está sendo bom.

Gosto de olhar as pedras e os desenhos do vento na superfície da água, gosto de sentir as modificações da luz quando o sol está desaparecendo do outro lado do rio, gosto de sentir o dia se transformando em noite e em dia outra vez, gosto de olhar as crianças brincando no corredor de entrada e das palmeiras que existem no meio da minha rua — gosto de pensar que vou sempre ter olhos para gostar dessas coisas, e por mais sozinho ou triste que eu esteja vou ter sempre esse olhar sobre as coisas.

Sofre horrores mas continua do bem, sempre inventando histórias com final feliz.

Anota aí para seu futuro: desapegar das pessoas, se importar menos, não se abalar por nada nem ninguém, correr atrás daquilo que faça seu coração vibrar, ficar perto de quem te quer bem, correr atrás dos seus sonhos, se amar mais, esquecer tudo aquilo que te faça mal. Anota aí: cair na real.

...que lindo encontrar contigo todas as manhãs de todos estes dias de todos estes anos...

O destino nada me perguntou em tirar você na minha vida, mas caso você encontre com ele, agradeça-o em meu nome…

Este vazio de amor todos os dias: a cabeça pesada ao meio-dia, a boca amarga, um cheiro de sono e solidão nos cabelos...

Fico quieto. Primeiro que paixão deve ser coisa discreta, calada, centrada. Se você começa a espalhar aos sete ventos, crau, dá errado. Isso porque ao contar a gente tem a tendência a, digamos, "embonitar" a coisa, e portanto distanciar-se dela, apaixonando-se mais pelo supor-se apaixonado do que pelo objeto da paixão propriamente dito.

Que eu saiba puxar lá do fundo do baú o jeito de sorrir pros “não” da vida.

Mas de tudo isso, me ficaram coisas tão boas... Uma lembrança boa de você, uma vontade de cuidar melhor de mim, de ser melhor para mim e para os outros.

Deitada no ombro dele, ela via seu rosto muito próximo. Esse era o sonho, nada mais.

Viro outra vez aquilo que sou todo dia: fechada, sozinha, perdida no meu quarto, longe da roda e de tudo: uma criança assustada.

Caio Fernando Abreu
Caio Fernando Abreu: O essencial da década de 1980

Nota: Trecho do conto "Dama da Noite" de Caio Fernando Abreu

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Às vezes o que parece um descaminho na verdade é um caminho inaparente que conduz a outro caminho melhor.

Bebi, chorei, ouvi Maria Bethânia, fumei demais, tive insônia e excesso de sono, falta de apetite e apetite em excesso, vaguei pelas madrugadas, escrevi poemas (juro). Agora está passando: um band-aid no coração, um sorriso nos lábios – e tudo bem. Ou: que se há de fazer.