Poemas de Caio Fernando Abreu

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Passou pela minha cabeça voltar, mas o vento balançou os meus cabelos e mostrou que o caminho é para frente, reto e sem curvas.

Gosto de pessoas doces, gosto de situações claras; e por tudo isso, ando cada vez mais só...

Chegar ao centro, sem partir-se em mil fragmentos pelo caminho. Completo, total. Sem deixar pedaço algum para trás.

Podia esperar de qualquer um essa fuga, esse fechamento. mas não de você, se sempre foram de ternura nossos encontros e mesmo nossos desencontros não pesavam, e se lúcidos nos reconhecíamos precários, carentes, incompletos. Meras tentativas, nós. Mas doces. Por que então assim tão de repente e duro, por quê?

Hoje eu queria alguém que me dissesse que eu não precisava me preocupar, um ombro, uma mão. Desculpe tanta sede, tanta insatisfação. Amanhã, amanhã recomeço.

Só preciso de alguns abraços queridos, a companhia suave, bate-papos que me façam sorrir, algum nível de embriaguez e a sincronicidade: eu e você não acontecemos por uma relação causal, mas por uma relação de significado, que ainda estamos trabalhando.

Mas sei lá, não sei se toda essa coisa patética é mesmo necessária. Estou resolvendo umas coisas aqui viu, esses negócios de sentimentos demonstrados demais meio que estraga. Estou aqui aprendendo que nem todos dão valor ao que você pode oferecer, e acabar demonstrando afeto demais começa a encher o saco, e eu digo tudo isso da minha parte. Chega de ligações, preocupações, sentimentos demonstrados aos extremos. Vou ficar mais relax mesmo, não quer me ligar, não liga, mas também não ligarei. Não quer me ver, não me veja, mas também não sairei que nem doida atrás de você pra saber se a gente vai se ver, que horas é o nosso encontro, não mais. É apenas um aviso que eu deixo bem simples: se quiser, me procura você. E outro aviso que eu deixo também: isso tudo é só conversa mesmo, teoricamente falando, está tudo certo. É quando chega na hora da prática que ferra com tudo.

Somos inocentes em pensar que sentimentos são coisas passíveis de serem controladas. Eles simplesmente vêm e vão, não batem na porta, não pedem licença. Invadem, machucam, alegram.

Eu estou tranquilo e sinto que tudo vai sair bem, porque é exatamente a minha hora.

Escrever é enfiar um dedo na garganta. Depois, claro, você peneira essa gosma, amolda-a, transforma. Pode sair até uma flor. Pode sair até uma flor. Mas o momento decisivo é o dedo na garganta.

Não sei o que faço, onde fico: tenho muito medo, mas confio em Deus. E apesar do meu medo há em mim uma paz enorme que eu chamo de felicidade.

Penso sempre que um dia a gente vai se encontrar de novo, e que então tudo vai ser mais claro, que não vai mais haver medo nem coisas falsas.

Dói. Se me perguntarem o que acontece, só saberei responder isso: dói. Se me perguntarem onde é a dor, ainda assim só responderei: dói. Tudo tem a ver com aquele grito reprimido, aquele sonho escondido, aquele choro nem sempre contido: dói. Aquela vontade de cortar a garganta para não poder gritar. Aquela vontade de arrancar os olhos só pra não poder ver. Aquela vontade de esmagar o coração só para não poder sentir. Mesmo com todas essas coisas incapacitadas ainda assim doeria. Porque não está na garganta, nos olhos, no coração. Está em toda parte.

Como se fosses tu, assim entras no teatro e te chamam dentro do sonho e te chamam para fazer o papel do sonho de alguém que não veio, e dizes que nunca viste a peça e nunca leste o texto e nada sabes de marcações intenções interiorizações e te dizem que não importa porque é só um sonho e um sonho não precisa ensaio.

Eu sempre tive essa preocupação idiota de dizer apenas coisas que não ferissem.

Não adianta. Eu não vou chorar, não vou sofrer, não vou te ligar! Eu te amo, mas também me canso.

Para atravessar agosto ter um amor seria importante, mas se você não conseguiu, se a vida não deu, ou ele partiu – sem o menor pudor, invente um.

Caio Fernando Abreu
Pequenas epifanias. Rio de Janeiro: Agir, 2006.

Nota: Trecho da crônica Sugestões para atravessar agosto, publicada originalmente no jornal "O Estado de S. Paulo", em 6 de agosto de 1999.

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Dói muito, mas eu não vou parar. A minha não-desistência é o que de melhor posso oferecer a você e a mim neste momento.

Caio Fernando Abreu
ABREU, C. F. Pequenas Epifanias. Rio de Janeiro: Agir. 2006.

O tempo é que mostra o que realmente valeu a pena, o tempo nos ensina a esperar, o tempo apaga o efêmero e acaba com a dúvida.

De alguma forma, todos os dias alguém bate à nossa porta e nos convida a desistir.