Poemas de Caio Fernando Abreu

Cerca de 2421 poemas de Caio Fernando Abreu

Suponhamos que eu tivesse levado três, no máximo cinco minutos para apanhar a mochila, essa bagagem típica e mínima de quem não se importa de andar de lá pra cá o tempo todo sem paradeiro...

Quando desliguei o telefone pra lá das 04:00 horas da manhã, eu disse que sonharia com você, apenas pela certeza de que sua imagem linda, clara, fascinante, jamais sairia da minha cabeça… Ao me deitar eu estava pensando em ti, eu não sei se é sonho, eu não sei mesmo o que acontece, mas eu te sinto sempre, até enquanto durmo, sinto seu toque, sua voz, seu sorriso. Sinto e vejo tudo, meu misto de sonho e realidade, por que demorou tanto pra chegar? Eu guardei um sonho bom pra ti, essa noite toda, foi perfeita, eu estive com você, da forma mais incrível, toquei seu coração, te dei o meu, e recebi o seu.

Não me abandone, pediu para dentro, para o fundo, para longe, para cima, para fora, para todas as direções.

Somos inocentes em pensar que sentimentos são coisas passíveis de serem controladas.

Às vezes perdemos algo e não há solução. No fim você coloca um sorriso no rosto e finge que é sincero.

E uma compulsão horrível de quebrar imediatamente qualquer relação bonita que mal comece a acontecer. Destruir antes que cresça.

Você começa a precisar de outros lugares. E de outras pessoas. E de bebidas mais fortes.

Acho que é bom a gente saber que existe desse jeito em alguém, como você existe em mim.

Desculpe, mas foi só mais um engano? E quantos mais ainda restam na palma da minha mão?

Ao mesmo tempo alguma coisa em mim não consegue desistir, mesmo depois de todos os fracassos.

Todo mundo escancara portas e janelas para que o vento leve embora os maus-espíritos do inverno. É um vento mágico, dizem.

A calma, o equilíbrio, as palavras ditas lentamente, como se escolhesse. Raramente um gesto, um tom mais espontâneo. Tão bom ator que ninguém percebe minha péssima atuação.

Tenho pensado se não guardarei indisfarçáveis remendos das muitas quedas, dos muitos toques, embora sempre os tenha evitado, aprendi que minhas delicadezas nem sempre são suficientes para despertar a suavidade alheia. Mesmo assim, insisto...

Dignidade é quando a solidão de ter escolhido ser, tão exatamente quanto possível, aquilo que se é, dói muito menos do que ter escolhido a falsa não-solidão de ser o que não se é, apenas para não sofrer a rejeição tristíssima dos outros.

Só eu sei que cheguei a humildade máxima que um ser humano pode atingir: confessar a outro ser humano que precisa dele para existir. E no momento em que se confessa a precisão, perde-se tudo, eu sei.

Penso em você a cada instante. E só me esqueço de você, quando lembro de nós.

O que incomoda é esta fragilidade, essa aceitação, esse contentar-se com quase nada.

Às vezes a gente vai-se fechando dentro da própria cabeça, e tudo começa a parecer muito mais difícil do que realmente é.

Porque se você não vem é como se o tempo fosse passado em branco, como se as coisas não chegassem a se cumprir porque você não soube delas.

Fechei a porta, encostei a parte de cima da cabeça contra ela. Só nos filmes as pessoas fazem isso, nunca vi ninguém fazer de verdade. Comecei a fazer para ver se sentia o que as pessoas sentem nos filmes – pessoas sempre sentem coisas nos filmes, nos bares, nas esquinas, nas músicas, nas histórias. Nas vidas acho que também, só que não se dão conta. Depois percebi que aquela dor que sobe ali do olho esquerdo pela testa diminuía um pouco assim, então fui me virando até apertar o lado esquerdo da cabeça, justamente onde doía, contra a porta fechada. A dor doía menos assim, embora não fosse exatamente uma dor. Mais um peso, um calafrio. Uma memória, uma vergonha, uma culpa, um arrependimento em que não se pode dar jeito.