Poemas de Caio Fernando Abreu

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Se o outro for bom para você. Se te der vontade de viver. Se o cheiro do suor do outro também for bom. Se todos os cheiros do corpo do outro forem bons. O pé, no fim do dia. A boca, de manhã cedo. Bons, normais, comuns. Coisa de gente. Cheiros íntimos, secretos. Ninguém mais saberia deles se não enfiasse o nariz lá dentro, a língua lá dentro, bem dentro, no fundo das carnes, no meio dos cheiros. E se tudo isso que você acha nojento for exatamente o que chamam de amor?

O que importa é que você entra por um ouvido meu e sai pelo outro, sabia? Você não fica. Você não marca. Eu sei que fico em você, eu sei que marco você. Marco fundo. Eu sei que, daqui a um tempo, quando você estiver rodando na roda, vai lembrar que, uma noite, sentou ao lado de uma mina louca que te disse coisas, que te falou no sexo, na solidão, na morte.

Preciso dessa emoção que os antigos chamavam de amor, quando sexo não era morte e as pessoas não tinham medo disso que fazia a gente dissolver o próprio ego no ego do outro e misturar coxas e espíritos no fundo do outro-você, outro-espelho, outro-igual-sedento-de-não-solidão, bicho carente, tigre e lótus.

“Ando angustiada demais, meu amigo, palavrinha antiga essa, angústia, duas décadas de convívio cotidiano, mas ando, ando, tenho uma coisa apertada aqui no meu peito, um sufoco, uma sede, um peso, não me venha com essas história de atraiçoamos-todos-os-nossos-ideais, nunca tive porra de ideal nenhum, só queria era salvar a minha, ,veja só que coisa mais individualista elitista, capitalista, só queria ser feliz, cara.”

Então quero que você venha para deitar comigo no meu quarto novo, para ver minha paisagem além da janela, que agora é outra, quero inaugurar meu novo estar-dentro-de-mim ao teu lado, aqui, sob este teto curvo e quebrado, entre estas paredes cobertas de guirlandas de rosas desbotadas. Vem para que eu possa acender incenso do nepal, velas da suécia na beirada da janela, fechar charros de haxixe marroquino, abrir armários, mostrar fotografias, contar dos meus muitos ou poucos passados, futuros, possíveis ou presentes impossíveis. Dos meus muitos ou nenhuns eus. Vem para que eu possa recuperar sorrisos, pintar teu olho escuro com kol, salpicar tua cara com purpurina dourada, rezar, gritar, cantar, fazer qualquer coisa, desde que você venha, para que meu coração não permaneça esse poço frio sem lua refletida. Porque nada mais sou além de chamar você agora, porque não tenho medo e não estou sozinho, porque não, porque sim, vem e me leva outra vez para aquele país distante onde as coisas eram tão reais e um pouco assustadoras dentro da sua ameaça constante, mas onde existe um verde imaginado, encantado, perdido. Vem, então, e me leva de volta para o lado de lá do oceano de onde viemos os dois.

Continuamos carregando nossas pequenas maldições – mais orgasmos, insônia, pesadelos, excessos de álcool e cigarros, procura cega (...).

Heteros ou homos (?) a médio prazo iremos todos enlouquecer, se passarmos a ver no outro uma possibilidade de morte. Tem muita gente contaminada pela mais grave manifestação do vírus — a aids psicológica. Do corpo, você sabe, tomados certos cuidados, o vírus pode ser mantido a distância. E da mente? Porque uma vez instalado lá, o HTLV-3 não vai acabar com as suas defesas imunológicas, mas com suas emoções, seu gosto de viver, seu sorriso, sua capacidade de encantar-se. Sem isso, não tem graça viver, concorda? ...

O Estado de S. Paulo, 25/3/1987

Caio Fernando Abreu

Nota: Trecho de "A mais justa das saias".

Inserida por FernandaTR

As vezes olho pro céu e me pergunto quando o sinal de que tudo vai dar certo vai chegar? Não sei! Só sei que quando deitar em minha cama, não quero pensar em arrependimentos, em tristezas, não quero ver meus sonhos quebrados pelo chão pois eu sei que só eu vou me machucar ao pisar neles, então vou acreditar! Acreditar que um dia vou chegar la, que um dia vou olhar pra traz e ver que tudo isso foi um aprendizado e que cada acontecimento, seja ele triste ou feliz, me ajudou a ser quem eu sou, me fez levantar e não me importar com o quanto já me fizeram chorar mas sim com a minha vontade de escancarar um sorriso! A final, como diria Caio Fernando Abreu:
E tem o seguinte, meus senhores: não vamos enlouquecer, nem nos matar, nem desistir. Pelo contrário: vamos ficar ótimos e incomodar bastante ainda.

Nem todo ponto final indica fim da história,
pode ser só o começo de um parágrafo.

Se permita, dê ouvidos ao seu coração, caso contrário você nunca vai saber o que é ser feliz.

Entre quatro paredes toda mulher faz loucura. Aprenda e vire homem. O que se faz a dois, não se comenta a três.

"Se a sua vida estiver muito amarga, dê uma rebolada bem de leve. Às vezes o açúcar deve estar lá no fundo."

Quem gosta, protege e se importa. O resto, é resto, e de resto meu bem, ninguém vive!

As coisas vão ficar cada vez mais duras. O seu corpo vai-se decompor lentamente e você vai criar barriga e acreditar cada vez menos em todas as coisas, em você mesmo. O campo, a terra, o mar, a natureza — vão ficar cada vez mais distantes. E um dia tudo não vai ter passado de um sonho. Um dia você vai lembrar de tudo e pensar com tristeza: “loucuras da juventude”. E todo esse tempo de agora não será mais que um longo tempo perdido, inútil, jogado fora. Quanto mais você ficar aqui, mais poluído você fica, mais envolvido com a cidade. Cada vez é mais difícil você se libertar. Porque é que você não vai de uma vez? O que é que você está esperando? O que é que você está fazendo para realizar o seu sonho?

Já que insiste, vou te dizer. Eu tenho ciúmes de quem pode passar o dia todo com você.

"...dançar de rosto colado, pegar na mão à meia-luz, desenhar com a ponta dos dedos cada um dos teus traços, ficar de olho molhado só de te ver, de repente e, se for preciso, também virar a mesa, dar tapa na cara, escândalo na esquina, encher a cara de gim, te expulsar de casa e te pedir pra voltar."

"Queria e quero — ainda. Voar junto com alguém, não sozinho. Mas todos me parecem tão fracos, tão assustados e incapazes de ir muito longe. Talvez eu me engane, e minhas asas sejam bem mais frágeis que meu ímpeto. Mas se forem como imagino, talvez esteja fadado à solidão."

“Primeiro chorei, senti medo e pena. Deu vontade de deitar, dormir três meses.”

Eu abandono tudo, história, passado, cicatrizes. Mudo o visual, deixo o cabelo crescer, começo a comer direito, vou todo dia pra academia. Mas você tem que prometer que vai remar também, com vontade! Eu começo a ler sobre política, futebol, ficção científica. Aprendo a pescar, se precisar. Mas você tem que remar também. Eu desisto fácil, você sabe. E talvez essa viagem não dure mais do que alguns minutos, mas eu entro nesse barco, é só me pedir. Perco o medo de dirigir só pra atravessar o mundo pra te ver todo dia. Mas você tem que me prometer que vai remar junto comigo. Mesmo se esse barco estiver furado eu vou, basta me pedir. Mas a gente tem que afundar junto e descobrir que é possível nadar junto. Eu te ensino a nadar, juro! Mas você tem que me prometer que vai tentar, que vai se esforçar, que vai remar enquanto for preciso, enquanto tiver forças! Você tem que me prometer que essa viagem não vai ser a toa, que vale a pena. Que por você vale a pena. Que por nós vale a pena. Remar. Re-amar. Amar.

Vai menina, fecha os olhos. Solta os cabelos. Joga a vida. Como quem brinca somente. Vai, esquece do mundo. Molha os pés na poça. Mergulha no que te dá vontade. Que a vida não espera por você. Abraça o que te faz sorrir. Não espere. Promessas, vão e vem. Planos, se desfazem. Regras, você as dita. Palavras, o vento leva. Distância, só existe pra quem quer. Os olhos se fecham um dia, pra sempre. E o que importa você sabe, menina. É o quão isso te faz sorrir. E só.