Pensamentos de Clarice Lispector
Por que quero fazer de mim um herói? Eu na verdade sou anti-heroica. O que me atormenta é que tudo é "por enquanto", nada é "sempre".
Tudo o que não sou não pode me interessar, há impossibilidade de ser além do que se é.
Eu só escrevo quando eu quero, eu sou uma amadora e faço questão de continuar a ser amadora. Profissional é aquele que tem uma obrigação consigo mesmo de escrever, ou então em relação ao outro. Agora, eu faço questão de não ser profissional, para manter minha liberdade.
Redondo sem início e sem fim, eu sou o ponto antes do zero e do ponto final.
E eis que de repente agora mesmo vi que não sou pura.
Mas de mim depende eu vir livremente a ser o que fatalmente sou. Sou dona de minha fatalidade e, se eu decidir não cumpri-la, ficarei fora de minha natureza especificamente viva. Mas se eu cumprir meu núcleo neutro e vivo, então, dentro de minha espécie, estarei sendo especificamente humana.
Eu bem que me controlo, mas sou tão sensível.
Não estou à altura de imaginar uma pessoa inteira porque não sou uma pessoa inteira.
Sou cheio de muito amor e é isso o que certamente me dá uma grandeza.
Tenho medo de revelar de quanto preciso e de como sou pobre.
Sou muito mais lunar que solar.
Que importa o sentido? O sentido sou eu.
Sou uma árvore que arde com duro prazer. Só uma doçura me possui: a conivência com o mundo.
É curioso como não sei dizer quem sou. Quer dizer, sei-o bem, mas não posso dizer.
É que só sei ser impossível, não sei mais nada. Que é que eu faço para conseguir ser possível?
De nada sei. Que se há de fazer com a verdade de que todo mundo é um pouco triste e um pouco só.