Pensamentos de Clarice Lispector
Aceitar-me plenamente? É uma violentação de minha vida. Cada mudança, cada projeto novo causa espanto: meu coração está espantado. É por isso que toda minha palavra tem um coração onde circula sangue.
Estou tão assustada que só poderei aceitar que me perdi se imaginar que alguém me está dando a mão
Eu escrevo sem esperança de que o que eu escrevo altere qualquer coisa. Não altera em nada... Porque no fundo a gente não está querendo alterar as coisas. A gente está querendo desabrochar de um modo ou de outro...
Amar não acaba. É como se o mundo estivesse à minha espera. E eu vou ao encontro do que me espera.
Dar a mão a alguém sempre foi o que esperei da alegria.
Eu vivo à espera de inspiração com uma avidez que não dá descanso. (...) Cheguei mesmo à conclusão de que escrever é a coisa que mais desejo no mundo, mesmo mais que amor.
Ali estava eu, a menina esperta demais, e eis que tudo o que em mim não prestava servia a Deus e aos homens. Tudo o que em mim não prestava era o meu tesouro.
Eu me permito mais liberdade e mais experiências.
E aceito o acaso.
Anseio pelo que ainda não experimentei.
Maior espaço psíquico.
Estou felizmente mais doida.
O bobo é sempre tão simpático que há espertos que se fazem passar por bobos.
Sem um pensamento: apenas corpo se movimentando calmo, rosto pleno de uma suave esperança que ninguém dá e ninguém tira.
Por pura sede de vida melhor estamos sempre à espera do extraordinário que talvez nos salve de uma vida contida.
Eu sou o meu próprio espelho. E vivo de achados e perdidos. É o que me salva. Estou metida numa guerra invisível entre perigos. Quem vence? Eu sempre perco.
Até que fui obrigada a chegar à conclusão de que sou daqueles que rolam pedras durante séculos, e não daqueles para os quais os seixos já vêm prontos, polidos e brancos.
Sou ajudada pela saudade mansa e dolorida de quem eu amei. E sou ajudada pela minha própria respiração.
[Um amigo é] uma pessoa que me veja como eu sou. Que não me mistifique. Que me trate de igual para igual. Que me permita ser humilde.
Sou Botafogo, o que já começa por ser um pequeno drama que não torno maior porque sempre procuro reter, como as rédeas de um cavalo, minha tendência ao excessivo.
Quando eu me comunico com criança é fácil porque sou muito maternal. Quando me comunico com adulto, na verdade estou me comunicando com o mais secreto de mim mesma, daí é difícil... O adulto é triste e solitário. A criança tem a fantasia solta.
Se tivesse a tolice de se perguntar “quem sou eu?” cairia estatelada e em cheio no chão. É que “quem sou eu?” provoca necessidade. E como satisfazer a necessidade? Quem se indaga é incompleto.
Acontece que sou tão ávida da vida, tanto quero dela e aproveito-a tanto e tudo é tanto – que me torno imoral. Isso mesmo: sou imoral.