Outros
Há certos passatempos e prazeres ilícitos, que censuramos nos outros, mais por inveja do que por virtude.
Estamos habituados a julgar os outros por nós próprios, e se os absolvemos complacentemente dos nossos defeitos, condenamo-los com severidade por não terem as nossas qualidades.
Se fôssemos sinceros em dizer o que sentimos e pensamos uns dos outros, em declarar os motivos e fins das nossas ações, seríamos reciprocamente odiosos e não poderíamos viver em sociedade.
É tão fácil enganar-se a si mesmo sem o perceber, como é difícil enganar os outros sem que o percebam.
Como podemos nós pretender que os outros guardem os nossos segredos se nós próprios os não conseguirmos guardar?
A vida ensinou-me que ninguém é consolado, sem que tenha primeiro consolado outros; que nada recebemos, sem que primeiro tenhamos dado.
Os escritores raramente escrevem o que pensam. Limitam-se a escrever o que pensam que os outros pensam que eles pensam.
O amor por um só é uma barbaridade: porque se exerce à custa de todos os outros. O mesmo quanto ao amor por Deus.