O Poeta e a poesia
" EMBUSTE "
Eis que ela fez a aposta; deu em nada!...
Jogou todas as fichas sobre a mesa
contando, displicente, co’a certeza
de, enfim, ganhar o jogo de virada.
O amor tem regras próprias, sem defesa!
Não deixa o uso de carta marcada
nem que se quebre a banca, se a jogada
negar o uso de total clareza.
Bancou seu jogo de fera matreira
e não notou o avanço da rasteira
que a levaria a, ali, quebrar a cara…
Nas mãos, as suas cartas deste embuste
mostraram-se, do amor, fora de ajuste
por vícios, por luxúria, farsa e tara!
" CONFLITO "
Fico a pensar: pra quê? Qual o sentido?
Quem dita as regras desta sociedade
escravizante, inapta, na grade
de uma prisão sem fim? Caso perdido!
As normas dadas não têm de piedade
a pesa esse sistema, em si, falido
imposto num tormento desmedido
que rouba o senso, a paz, a liberdade.
Se faça assim, ou desse jeito assado,
do mesmo modo que foi no passado
e ai de quem não faça como dito…
Pra quê? Por quê? Que diferença faz
se, ao fim, de resultado nada traz
além de um coração sempre em conflito?!
" ENCERRA "
Eu sou de São João da Boa Vista,
estado de São Paulo. Enfim, Brasil!
Sou filho dessa terra-mãe gentil!
Um poeta, um sonhador, quase um artista…
Banhada pelo sol num céu de anil
São João se curva à Serra da Paulista,
aos pés da Mantiqueira que, ao turista,
retrata sua beleza em bom perfil.
É terra de paixão, mulher bonita,
estrada do minério e da bauxita
que vem de Minas bordeando a serra…
Aqui me fiz, cresci, ganhei a vida,
amei com toda a força me estendida
e hei de morrer o verso que me encerra!
" REVELE "
Ah, se soubesses ler o pensamento
ou desvendar o oculto ali guardado
terias, ante os olhos, revelado
deslizes tolos do meu sentimento.
Exposto, sem arranjos, desnudado,
quer mesmo no relance de um momento
o afeto, causa e cruz do meu tormento,
te mostraria o que tenho pensado.
Desejo? Só vontade? Sedução?
Lascívia que me brota ao coração
ou simplesmente amor à flor da pele?...
Não sabes ler o pensamento em mim,
porém, num dia desse, digo, enfim,
que pode ser que eu mesmo o te revele!
" EXISTE "
O quanto, num olhar, existe expresso?
Palavras diz num movimento mudo
e, sem nada dizer, nos conta tudo
passando sua mensagem com sucesso!
A forma como diz e aqui aludo
diverge em muitos pontos no processo,
mas todo o conteúdo ali professo
revela mais que o dito à voz, contudo.
O olhar agride, mente, diz, desnuda,
convence, engana, chora, pede ajuda
e conta o que não diz sem dizer nada…
O quanto expresso num olhar existe?
Quem tenta descobrir, logo desiste
pois tem segredos dele na parada!
" SER OU NÃO SER "
Pois é: ser ou não ser! Eis a questão…
Serei o que já sou sem o saber
ou não serei o que nem sei dizer
já visto que ando sempre à contramão?
É para ser ou não? Vou me abster…
Não tenho, para tanto, compreensão
e já nem sei se sou quem sou, então…
Melhor nem crer que sou do que descrer!
Me dizem para ser, mas não o são…
Contesto e já escuto um palavrão
que não condiz também com o ordenado…
Não ser, ou ser… Questão ainda aberta
que põe meus pés na via, a mim, deserta
sem dar resposta alguma ao questionado!
" ABRASAR "
Não sei: que esquenta mais? O sol no rosto
chegando de mansinho na piscina
ou esse teu olhar que, a mim, se inclina,
com teu desejo, em minha carne, posto?
Percebo que algo em mim, pois, te fascina
e te apetece o paladar, o gosto,
querendo, corpo a corpo, o toque, o encosto,
o rala-e-rola que, prazer, destina.
Transpira a pele e já lateja a carne
a suplicar que essa paixão se encarne
no fogo que projeta esse calor…
O sol ou teu olhar? Já tanto faz…
Meu corpo se incendeia, a todo gás,
querendo se abrasar no teu amor!
" COMIGO "
Eu sei que é bem difícil conviver
comigo, no trajeto desta estrada,
e que te sentes, pois, desamparada,
sem rumos pra poder me compreender!
Já fostes, muito mais, melhor amada
por outros companheiros do viver
e não mais queres nem sequer saber
se irás comigo nesta caminhada.
Só não descreias de que, nesse andor,
eu te acolhi no meu mais puro amor
querendo ser-te amigo e companheiro…
Difícil conviver com quem eu sou,
então, a tua paixão, enfim, cansou…
Jogado fui na val de algum boeiro!...
" IMAGINÁRIO "
Eu busco, no prazer do imaginário,
o encontro de nós dois, a qualquer dia,
e vivo, ali, tão doce fantasia
mantendo o amor presente por cenário!
Vivemos, do desejo, essa magia
irreverente, de um querer diário,
sem restrições quaisquer! Pelo contrário:
em liberdade plena, audaz, bravia!
Te entregas como entrego-me: sem medo!
Deixamos que o prazer nos dite o enredo
e cumpra o seu destino nos traçado…
No imaginário, eu busco-te à vontade
porquanto esse querer me toma, invade,
e, ali, gozamos todo o amor arfado!
" ASSIM "
Por certo foi amor expresso, escrito,
notório em teu sorriso, ali, discreto…
Te despertou, para outro alguém, o afeto
e um sentimento nobre, enfim, bonito!
Não haveria, eu, posto em secreto,
de abençoar-te o amor, raro, infinito,
que liberou, de outra paixão, o grito
e pôs-te o pé em tão feliz trajeto?
Contente fico aqui de ver-te bem
quer mesmo que nos braços de outro alguém…
Completa-se, portanto, a nossa história…
É sempre assim, o amor! Tem seu momento
e aquece-nos em puro sentimento
pra que nos permaneça na memória!
" RESERVADO "
Não fugirei do que me for dado em destino
e nem irei, pois, recusar lhe olhar de frente!
Querer barrar-me, bem eu sei, há quem intente
só por maldade, mão de ferro e olhar ferino!
Sou o que sou, sem medo algum, bom combatente,
fiel a mim, já como o fui desde menino,
e piso o chão com pés de amante e peregrino
seguindo em busca do melhor, como é evidente.
Se queres vir seguir comigo nessa estrada
esteja, então, disposta a tudo e apaixonada
das mesmas coisas, mesmos sonhos me ofertados…
Pois, do destino que estiver-me reservado
não fugirei, nem quem comigo pôr-se ao lado,
até cumprir-se o que, no amor, for frutos dados!
" ABATE "
Depois não quer ouvir nenhum gracejo,
cantadas, assobios, piadinha
de quem, por tal vontade, sai da linha
rendido, na visão, por tal desejo!
Se ofende dos olhares que ela aninha
depois de provocar querer sobejo
e segue erguendo as ancas no molejo
até mostrar as barras da calcinha.
Culpado, quem corteja e quem se expõe
no enredo em que, a atitude, se supõe
qual sendo, pois, de caça e caçador…
Quer venha o abate, ou não, no fim das contas,
depois das atitudes, das afrontas,
não se instaurou o vínculo do amor!
" CANSASTES "
Cansastes, simplesmente! Perceptível!
Não acho nem uma outra explicação
para esse adeus sem causa nem razão
ao que era história rara, bela, incrível!
Qual foi, portanto, a tua motivação,
parece-me, o cansaço, mais plausível!
Estavas numa fase bem sensível
que te feriu, por certo, o coração.
Andar ao lado meu foi cansativo,
sem tréguas, sem paixão, sem lenitivo,
e a decisão tomada foi por isso…
Enfim, cansastes! Sim! De toda a história
e deste um fim no amor, sem qualquer gloria,
restando-me o penar posto em feitiço!
" ESCOLTA "
Permites que viaje o pensamento
(vai se saber por onde), sem receio,
sem restrições quaisquer, assim, sem freio,
sem dar-lhe prazo ou leis para o momento!
Disfarças, pelas ruas, teu anseio,
teu medo que se perca o sentimento
ou que ele se transforme num lamento
por um qualquer, insano teu, falseio.
O lapso de tempo que isso omite
só faz com que, o temor, teu peito habite
e tira-te a visão do mundo a volta…
Que o pensamento vague, então, permites,
e sem dar, à razão, reais limites
nem vês que o amor, contigo ali, te escolta!
" TRANSPARÊNCIA "
Me vens como te gosto: na evidência
de que darás do amor que te acompanha
e, sem pudor qualquer, chama, me assanha
me vindo na mais clara transparência!
Não há maldade alguma na barganha
pois que, desta paixão, temos vivência
e a mais completa e extensa experiência
de forma que a clareza, assim, nos ganha.
É transparente a alma, o olhar, a fome
que, de desejo intenso, nos consome,
a sede, a força intensa da atração…
Na transparência vens, sem véu, sem medo,
sem restrições em ser o meu brinquedo
pois que já tens nas mãos meu coração!
" DISCUSSÃO "
Nem sempre tem confronto, discussão,
conversa franca e aberta sobre a mesa,
e o amor se vai aos poucos, sem defesa,
sem ter quem, de argumentos, lance mão!
Uma união já não se faz coesa,
firmada em ser eterna, a relação,
mas deixa a porta aberta a uma ilusão
de que é bobagem lucidez, franqueza…
Conversa não foi feita pra mostrar
quem pode mais! Sequer pra revelar
quem tem razão, mas como está o amor…
A discussão, por vez, é necessária
contudo não constroi, quando diária,
nem leva a nada o grito a bem do autor!
" LUTE "
A vida é uma constante e longa espera
pra quem não tem ideia pra onde ir!
Não há momento aqui nem no porvir
que dê suporte a quem não se supera.
Quem fica, pois, sentado, a se iludir,
a própria sepultura cava e gera
pois existência alguma, assim, prospera
sem luta pela causa de existir.
Par’onde queres ir? Qual a razão
que faz pulsar, enfim, teu coração
e que alimentas com total fervor?...
Levanta! Sai da espera que te prende
e lute pelo que é que te surpreende
pois que te aguarda, ao certo, ao fim, o amor!
" PEREGRINA "
A tarde estava quieta, pensativa,
olhando a insensatez da humanidade
com que ela conviveu na tenra idade
e viu perder-se egoísta, vil, lasciva…
Se entristeceu sabendo a brevidade
do tempo que teria a chama viva
por sobre os homens que, o de mal, cultiva
sem perceberem ir-se a eternidade.
Deixou-se desmanchar trazendo a noite
a salpicar estrelas neste açoite
de um coração dorido e maltratado…
Insana humanidade! Triste sina
aos olhos de uma tarde peregrina
que a vê vagar, sem rumo, o amor lhe dado.
" ESCONDIDO "
Do amor, vaga nas sombras, escondido,
seguindo em seu disfarce improvisado
temendo pôr alguém, junto, ao seu lado,
talvez por ter, seu coração, ferido!...
Repulsa tem de, um dia, ver-se achado
nos braços de um desejo seu querido
e se encontrar, pela paixão, rendido
por novamente, louco, ter amado.
Prefere, então, manter-se em seu segredo
fugindo o tempo todo nesse medo
de que o amor, de novo, o reconheça…
Assim, vaga nas sombras, lá, sozinho,
fugindo de outro alguém no seu caminho
e crendo que não mais, amar, mereça!
" EXPLOSÃO "
Numa explosão de cor, morre o meu dia
crepusculando a tarde nessa estrada!...
A mente lhe acompanha a paz, cansada,
distante da paixão e sua euforia!
Mas perto faz-se a eternidade doada
e sinto que o caminho já se esfria
sem dar-me carta alguma de alforria
dos meus pecados na alma depravada.
Que fiz deste que sou? Cumpri o destino
ou simplesmente vim, num desatino,
apenas existindo e não vivendo?
Morre o meu dia em explosão de cores…
Morrer eu sinto a vida, os meus amores,
enquanto apenas vou sobrevivendo!...